Uma noite fria de lua cheia. Este foi o cenário da Audiência Pública realizada na Praia do Matadeiro nesta quinta-feira, 19 de maio, para discutir os possíveis impactos ambientais na Praia caso seja permitido pelo Poder Público a implementação de uma fazenda de maricultura no local.
O projeto para instalação de cultivo de ostras na região é do antigo Ministério da Pesca, hoje Ministério da Agricultura, que apesar de ter sido convidado não se fez presente. O representante da Epagri, órgão que executa o projeto a nível estadual, Felipe Suplicy, esclareceu que a empresa não é responsável pela concessão das áreas do mar e afirmou que a maricultura não causa impactos ambientais ou compromete a paisagem.
“O responsável pela área de fato é o Ministério da Agricultura. Os moluscos agem como filtradores. Quanto ao visual, há formas de minimizar os impactos. Os maricultores são mais um usuário do mar e é possível a convivência harmônica”.
Em relação ao encaminhamento da audiência pública realizada na Assembleia Legislativa em que a comunidade solicitou a mudança de local para a implantação da maricultura, o representante da Epagri disse que esta não foi uma manifestação da empresa e que, portanto, não realizou estudos neste sentido. “Nestas áreas não tem muito para onde ir em toda a linha leste da Ilha. Não tem outro local”, reiterou Felipe Suplicy.
Desde 2004 o Ministério da Agricultura estuda novos locais para a prática de maricultura. Para a Praia do Matadeiro foi realizada licitação e os concessionários tem o prazo de um ano, já em andamento, para ocupar a área. No entanto, a comunidade garante que durante todo o processo não foi ouvida e que documentos e questionamentos realizados à Epagri e ao Ministério da Agricultura não foram encaminhados e respondidos.
A mobilização dos moradores tornou-se mais intensa desde janeiro deste ano quando as boias para a implantação da fazenda começaram a ser colocadas na água. O presidente da Associação de Moradores e Amigos da Praia do Matadeiro (Amapram), Ezinar Rodrigues, destacou que há mais de 30 anos a comunidade luta para preservar o Matadeiro, considerada a praia habitada mais conservada do Brasil. “Nós não vivemos em uma ditadura. Vivemos em uma democracia onde todos devem ser ouvidos”.
A população questiona ainda a falta de estudos de impactos ambientais que a maricultura geraria na região. “Se fizeram esses estudos não levaram em consideração que ali é a passagem das baleias e dos botos que nos visitam”, lembrou o presidente da Associação. O advogado da Amapram complementou: “Até agora não tive acesso a estudos de impactos ambientais, nem sei se foi feito. É mais do que violação ao meio ambiente, é uma violação ao nosso direito de informação”, protestou André Xavier Alves.
Sem ter acesso a pesquisas sobre os possíveis impactos realizados pelos órgãos competentes, a Associação de Moradores contratou profissionais para fazer um laudo técnico sobre as alterações na área devido à prática da maricultura. De acordo com o engenheiro agrônomo Augusto Neves, responsável pelo parecer, há sim impactos. O laudo foi entregue aos vereadores para ser encaminhado à Fatma.
Outros moradores manifestaram-se contrários à instalação do cultivo de ostras no local. “O que vão botar aqui é vieira, é um teste, é molusco que eles vão começar a criar. É um molusco que nós não temos histórico. Nós não vamos deixar entrar aqui”, assegurou o morador Marcelo Sobierajski.
O morador Vicente Possobon sugeriu a realização de uma votação para mostrar os cidadãos favoráveis e contrários ao projeto. A maioria dos presentes na audiência manifestou-se contra a instalação. A favor apenas o representante da Epagri e o concessionário Bruno Rocha que buscou harmonizar a questão. “Não tem necessidade de cabo de guerra. Existe uma solução que é a construção de um mole na Praia do Matadeiro”, sugeriu Bruno que esclareceu que não vai fazer vieira como mencionado anteriormente.
Os vereadores também se manifestaram contrários ao projeto:
Vereador Lela (PDT) – “Nós não precisamos inventar algo novo na nossa cidade. Há outros lugares para se implantar, mas não aqui no Matadeiro onde a comunidade já se manifestou contrária”.
Vereador Celso Sandrini (PMDB) – “Há 28 anos comecei a atividade da maricultura no Ribeirão da Ilha, sendo o primeiro maricultor. O grande problema é quando essa atividade entra em conflito com a comunidade local. O erro do técnico da Epagri ao mapear a área foi não ter conversado com a comunidade”.
Vereador Afrânio Boppré (PSOL) – “A minha opinião é contrária à instalação da maricultura na Praia do Matadeiro. Se têm lugares em Florianópolis paradisíacos como esse, o nosso dever é defender”.
O vereador do PSOL solicitou ao representante da Epagri que os estudos de impactos ambientais sejam encaminhados à Câmara. No entanto, Felipe Suplicy continuou afirmando que o estudo é do Ministério da Agricultura.
Ao fim do encontro, o vereador Pedro de Assis Silvestre (PP) indicou os encaminhamentos:
– a Câmara Municipal de Florianópolis, caso seja necessário, vai entrar com ação no intuito de barrar qualquer projeto de maricultura na Praia do Matadeiro;
– a Câmara solicitará estudos técnicos ao Ministério da Agricultura e Epagri;
– solicitação à Amapram para encaminhar a relação de documentos solicitados aos órgãos competentes;
– realização de reunião com o Ministério da Agricultura com a presença de representantes da Câmara e da comunidade;
– envio à Fatma do laudo técnico contratado pela Amapram;
– análise do zoneamento da região estabelecido pelo Plano Diretor.
(Camara Municipal, 20/05;2016)
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