Foram necessários mais de sete anos para que a equipe da Secretaria de Patrimônio da União (SPU) concluísse as pesquisas para determinar onde passariam os cerca de 200 quilômetros de território na circunferência da Linha do Preamar Médio (LPM), que delimita as áreas da União, ou terrenos de marinha, na Ilha de Santa Catarina. No entanto, diversas iniciativas, de moradores e políticos, pretendem diminuir ou até acabar com a cobrança de taxas, que podem chegar a 5% do valor imóvel. Para ambientalistas, a demarcação é um avanço na regularização de áreas de preservação.
Atualmente, pouco mais de 9 mil residências estão sob domínio reconhecido da União na parte insular de Florianópolis, através de uma demarcação presumida, que é de 33 metros a partir do mar ou de mangues e rios e lagos que sofrem influência de maré – estes dois últimos são os chamados acrescidos de marinha. O arquivo digital foi disponibilizado em maio e pode ser acessado pelos interessados na sede da SPU, em frente à Praça XV, no Centro de Florianópolis. O documento tem tamanho de 3 gigabytes.
PROPRIETÁRIOS TERÃO PRAZO PARA DEFESA
Apesar da LPM ter sido concluída em meados de 2014, o trabalho teve que passar pela aprovação da coordenação geral da SPU em Brasília, o que ocorreu ainda no final do ano passado. Mais cinco meses foram necessários para digitalizar os mapas para a população ter acesso ao conteúdo da demarcação.
– O processo detalha mais de 200 quilômetros lineares que percorrem a maior parte da costa da Ilha, além de regiões onde passam rios sob influência de maré e mangues – explica Juliano Pinzetta, coordenador de identificação e fiscalização da SPU.
O órgão federal aguarda informações da prefeitura sobre os proprietários das residências que estão em áreas da União. Em seguida será a fase de notificação dos moradores:
– Após notificados, os moradores terão 10 dias para defesa. Esse é o prazo legal. Para facilitar o acesso à informação, disponibilizamos tudo antecipadamente – disse Tereza Cristina, superintendente da SPU em Florianópolis, em audiência pública realizada no começo do mês, que teve a presença de mais de 600 moradores de áreas sob suspeita de pertencerem à União.
Procuradora do Ministério Público Federal (MPF), Analúcia Hartmann ressalta a que a LPM é ótima para o morador que quer regularizar a situação do seu imóvel, pois isso dá lhe dará segurança.
(DC, 20/05/2015)
Há duas maneiras para poder utilizar um terreno da União, por ocupação ou aforamento. No primeiro caso, o morador deve pagar uma taxa anual que pode chegar a 5% do valor do terreno. Para aforamento, quando há um contrato de utilização do domínio útil da área, a taxa corresponde a 0,6% do valor do terreno. Apenas em 2014, a SPU recolheu mais de R$ 44 milhões de 40 mil moradores em toda o Estado. Com a demarcação da Ilha de Santa Catarina e de outras cidades, como Balneário Arroio do Silva, Itapema, Imbituba, Passo de Torres e Joinville, essa arrecadação deve aumentar bastante. Com receio de pagar essas taxas, moradores da Capital se organizaram para protestar contra a cobrança e já contam com o apoio de muitos políticos e empresários locais.
– Fizemos um levantamento próprio no bairro Carianos e pelo menos 1.330 residências devem ser atingidas por essa tarifa. A comunidade está com medo, pois nem todos terão condições de pagar um valor tão alto – reclama Maikon Costa, presidente da Associação de Moradores e Amigos do Carianos (Amocar).
De acordo com a SPU, além do Carianos, os bairros Daniela e Saco Grande são os que devem ter apresentado maiores mudanças em relação à linha presumida.
(DC, 20/05/2015)
A cobrança das taxas para ocupação em terras de marinha começou ainda no século 19, quando o país era uma colônia portuguesa. A intenção da Corte era defender a costa brasileira, por isso a delimitação de 33 metros do mar em direção à terra – espaço necessário para um batalhão poder marchar. A marcação representa a Linha do Preamar Médio presumida de 1831, usada para a cobrança das taxas. Esta é uma das principais polêmicas envolvendo o trabalho da SPU, que foi inclusive questionado pelo engenheiro Obéde Pereira Lima, em tese de doutorado.
– Se levarmos em consideração a linha preamar de 1831, com a alteração do nível do mar, as terras de marinha hoje estariam na água em vários pontos – argumentou o engenheiro, durante a audiência realizada na Alesc.
Para Juliano Pinzetta, da SPU, há uma divergência sobre a metodologia de aplicação, mas isso não interfere na legitimidade do órgão para fazer a demarcação:
– A SPU faz uma pesquisa levando em consideração um determinado número de marés baixas e altas, o Obéde outras. Além disso, analisamos outros dados geográficos. Qualquer pessoa pode apresentar uma nova forma de demarcação, mas a responsabilidade legal de fazer isso é da SPU.
(DC, 20/05/2015)
Propostas de Emenda à Constituição (PECs), processos na Justiça e reclamações de prefeituras não faltam contra a SPU por causa da aplicação da taxa de ocupação em terras de marinha. Uma delas, a PEC nº 39 de 2011 (veja as outras no box abaixo), seria votada ontem, mas um pedido de vista adiou a apreciação. O texto prevê a redução das taxas e ainda o repasse de parte do valor para os municípios. Alesc e Prefeitura de Florianópolis também tentam frear a cobrança da União na Capital.
O texto da PEC 39/2011, que tem como relator o deputado federal Alceu Moreira (PMDB-RS) prevê a diminuição de até 60% nas taxas cobradas e o repasse de 20% do que for arrecadado no laudêmio para os municípios.
– A medida deve beneficiar 15 milhões de moradores costeiros no país – informa o parlamentar.
(DC, 20/05/2015)
Até 2005, todas as ilhas costeiras do país pertenciam à União. Mas isso mudou com a aprovação da Emenda Constitucional 46, do mesmo ano, que formalizava a doação para os Estados das ilhas onde estão instaladas sedes de municípios, como Florianópolis, São Luís (MA) e Vitória (ES). Essa alteração é motivo de brigas judiciais por parte dos municípios atualmente. Uma delas é o processo movido pelo Estado do Espírito Santo, de 2011, no Supremo Tribunal Federal (STF) que defende a não aplicabilidade das regras de terras de marinha por causa dessa doação. Este ano a Prefeitura de Florianópolis entrou com um pedido na ação de apoio à tese dos capixabas.
Advogado especialista em discussões fundiárias e autor de livros sobre terras de marinha, Rodrigo Rodrigues discorda da argumentação utilizada nessa ação e acredita que dificilmente o STF dará ganho de causa para os autores:
– A emenda retirou de posse da União ilhas costeiras que tenham sede de município. Penso que o documento não toca em terras de marinha. Portanto, ele trata apenas de imóveis no interior das ilhas.
“Fizemos um levantamento no bairro Carianos e pelo menos 1.330 residências devem ser atingidas por essa tarifa. A comunidade está com medo, pois nem todos terão condições de pagar um valor tão alto”. Maikon Costa, Presidente da Associação de Moradores e Amigos do Carianos (Amocar).
(DC, 20/05/2015)
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