Uma iniciativa pioneira tem aproximado o curso de Direito da Universidade Federal de Santa Catarina às questões ambientais de Florianópolis. Por meio do Núcleo de Prática Jurídica, um escritório modelo onde os estudantes prestam serviços gratuitos para a comunidade, os alunos de graduação praticam uma outra vertente da profissão: o direito ambiental.
Além de serviços para pessoas físicas, agora eles se dispõem a dar assistência às associações civis da Capital, as conhecidas Organizações Não Governamentais. Os resultados são positivos e repercutem em âmbito nacional ─ é o caso da Ação Direta de Inconstitucionalidade do Novo Código Ambiental de Santa Catarina, processo aberto pelos integrantes do projeto e que já está no Supremo Tribunal Federal para julgamento.
A atividade de extensão com financiamento do Probolsa (Programa de Bolsas de Extensão) começou em março deste ano. Porém, o trabalho neste campo acontece desde 1997, quando as questões ambientais ainda não eram tão discutidas pelos vários setores da sociedade. São daquela época algumas das ações que estão em curso atualmente, defendidas pelo grupo formado por alunos e professores.
O coordenador do projeto, José Rubens Morato Leite, explica que a iniciativa complementa as atividades do Grupo de Pesquisa Direito Ambiental na Sociedade de Risco. Esse núcleo conta com alunos de graduação, mestrandos e doutorandos que se reúnem quinzenalmente para discutir uma série de bibliografias na área do direito ambiental. Por meio do projeto de extensão, o conteúdo sai da teoria, para ser colocado em prática durante a assistência jurídica às associações civis.
A intenção do projeto é possibilitar o assessoramento e a orientação às ONG´s da Capital quando o assunto é defender o meio ambiente. “O perfil do assessoramento não é atingir quantidade de ações, mas atender o caráter pedagógico e acadêmico. Nossa meta é entrar com ações com qualidade e que possam colaborar para evitar danos ambientais futuros e com a consciência ambiental”, ressalta o coordenador do projeto.
Mas para as ONGs esse acompanhamento era a ajuda que faltava para uma papel mais ativo. Estas organizações costumam estar alertas às questões ambientais da região, mas dificilmente têm condições financeiras para contratar serviços jurídicos.
E, se por um lado as ONG´s são ajudadas, por outro, os alunos só têm a ganhar. São capacitados pelos mestrandos e doutorandos do grupo de pesquisa, estudam a legislação ambiental do Brasil e adquirem experiências profissionais na graduação. “O interessante é que os participantes atuam como promotores nos casos”, conta José Rubens Morato Leite, que considera o estudo da legislação ambiental pouco profundo nos cursos de Direito.
A cada quinze dias, quando não a cada semana, os alunos se reúnem para estudar as irregularidades ambientais que acontecem em Florianópolis. “Para saber quais são esses problemas, é só abrir o jornal”, brinca o coordenador do projeto. Escolhido o caso, a equipe representa uma associação civil da cidade para levar a questão até o Poder Judiciário. Na maioria das vezes, é a própria Organização Não Governamental que procura os integrantes do projeto para participar dos casos de maior repercussão.
Caso Santa Mônica
Foi assim com a região do bairro Santa Mônica, próximo ao Shopping Iguatemi. As características do lugar já eram preocupantes: área de mangue, ambientalmente sensível e que nos últimos anos sofria com a urbanização e intensificação do comércio.
A situação se agravou com a alteração do Plano Diretor e da Lei 250/2006, que trata do zoneamento das áreas municipais. A região, antes residencial, passou a ser considerada “Área Comunitária Institucional” e poderia receber construções relacionadas à saúde, assistência social e culto religioso. Os empresários não tardaram a elaborar projeto para construir no local seis andares do futuro Hospital Vita.
O esforço do grupo foi para suspender os licenciamentos e alvarás que autorizariam o empreendimento. Os participantes assessoraram a Aliança Nativa, uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público e sem fins lucrativos. Para dar início ao caso, pediram uma requisição de Ação Civil Pública Ambiental, justificando a falta de avaliação e gestão do risco ambiental da obra.
Nessa etapa, houve o papel fundamental de outros profissionais do projeto de extensão, entre eles arquitetos e biólogos. “Não basta entrar com uma ação, temos que ter peritos que visitem o local e analisem a situação de conflito”, alerta o professor.
A parceria deu certo: a prefeitura de Florianópolis foi proibida de expedir a licença para a construção do Hospital Vita, sob risco de multa diária de 500 mil reais em caso de descumprimento da decisão.
Perspectivas
Atualmente, os integrantes do projeto têm quatro processos ambientais em andamento. O coordenador conta que esse número só não é maior porque o grupo consegue resolver muitas irregularidades sem que ocorra o litígio, e ressalta sempre que a importância do projeto está no aprendizado acadêmico e nos resultados de consciência ambiental.
Dentre os processos em curso, um chama a atenção por sair do Estado e ser julgado em Brasília: o caso do Novo Código Ambiental. O grupo representa a Federação de Entidades Ecologistas Catarinenses (FEEC) e questiona a constitucionalidade do código. O documento ficou conhecido, entre outros fatores, por diminuir para cinco metros a área de mata ciliar – o Código Florestal brasileiro considera que essa Área de Preservação Permanente deve ter 30 metros.
Para os próximos meses, o grupo pretende elaborar uma cartilha que esclareça como discutir as demandas ambientais com base no Direito. “O objetivo é explicar como outras universidades podem exercer a cidadania ambiental”, conta o professor, que comemora outras ações pelo país.
A Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) realiza um projeto parecido na região da Amazônia e outras universidades começam a formar redes para discutir a temática ambiental no Direito. Para José Rubens Morato Leite, o cenário brasileiro das leis ambientais acompanha esse interesse das instituições acadêmicas. “É o início de um bom ‘esverdeamento’ da legislação”, comemora.
Mais informações no site www.gpda.ufsc.br / e-mail: jrmorato@ccj.ufsc.br / Fone: (48) 3721-6745
(Por Claudia Mebs Nunes, Agecom / UFSC, 02/09/2010)
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