A Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) tem dado efetivo apoio às recentes Indicações Geográficas obtidas por produtos agropecuários catarinenses. Seja por envolvimento direto de seus laboratórios, como no caso do mel de melato de bracatinga, ou por estudos e pesquisas que servem de subsídio aos processos.
A recente Indicação Geográfica da maçã Fuji da região de São Joaquim foi obtida dentro de uma estratégia de desenvolvimento territorial que utiliza princípios da metodologia da cesta de bens e serviços territoriais, introduzida no Brasil, pesquisada e divulgada pelo Laboratório de Estudos da Multifuncionalidade Agrícola e do Território (Lemate), vinculado ao Centro de Ciências Agrárias (CCA).
O analista técnico do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) de Santa Catarina Alan David Claumann, que também é doutorando do Programa de Pós-graduação em Agroecossistemas da UFSC, afirma que a Universidade tem atuado em várias frentes em apoio aos processos das IGs. “Uma delas histórica e de incentivo e pesquisas, qualificação das cadeias produtivas ao longo do tempo, em ações não vinculadas às IGs”, afirma ele, citando os vinhos de altitude, o mel de melato de bracatinga e a maçã.
Outra frente de atuação da Universidade é um envolvimento direto na construção dos dossiês das Indicações Geográficas, em que pesquisadores da UFSC atuaram junto às cadeias produtivas “definindo os critérios para cada produto, buscando informações que subsidiassem o pedido e apoiando técnica e cientificamente a documentação”.
Além disso, as pesquisas e estudos desenvolvidos na UFSC subsidiaram a iniciativa de busca das IGs. “A construção conjunta dessas três IGs – mel, vinho e maçã – no território da Serra Catarinense se deu dentro de uma estratégia maior de desenvolvimento territorial que foi inspirada e motivada pela metodologia da cesta de bens e serviços territoriais trazida ao Brasil pelo Lemate”, afirma o especialista do Sebrae.
Cesta de bens
A cesta de bens e serviços territoriais é um enfoque teórico-metodológico francês que foi introduzido no debate acadêmico brasileiro por intermédio do Lemate, diz o professor Ademir Antonio Cazella, titular do Departamento de Zootecnia e Desenvolvimento Rural e do Programa de Pós-Graduação em Agroecossistemas.
Há cerca de quinze anos o Lemate estuda o enfoque. Em 2006 o professor Cazella traduziu e publicou na revista do programa de pós-graduação um artigo científico do professor Bernard Pecqueur, da Université Grenoble Alpes da França, que foi um dos principais formuladores dessa noção. “Mas a pesquisa propriamente dita sobre a metodologia começamos em 2016, quando articulamos um grupo de pesquisadores interessados no tema”, diz o professor.
O grupo é coordenado pelo professor Cazella e reúne pesquisadores da UFSC, da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri), do Sebrae, de Institutos Federais, da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc) e do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). Além da pesquisa sistemática sobre o tema, o grupo faz divulgação desse enfoque em palestras e seminários. “Traduzimos um guia sobre identificação de recursos territoriais que tem sido distribuído para instituições que trabalham com o desenvolvimento rural e começamos a fazer estudos de caso em três territórios de Santa Catarina, um dos quais é a Serra Catarinense”, afirma o professor.
Articulação
A abordagem da cesta de bens e serviços territoriais apresenta a ideia de que, em um determinado território – um conjunto de municípios com características socioeconômicas e culturais semelhantes -, atores territoriais se organizem para fazer uma oferta heterogênea e articulada entre eles de produtos e serviços de qualidade territorial, explica o professor. “Essas iniciativas podem não ter nenhuma articulação entre si. A proposta da cesta é que se estabeleçam articulações, que um turista que venha para a região tenha acesso a esses produtos de qualidade. Que canais de comercialização em circuitos curtos ofertem esses produtos e mesmo outros produtos de qualidade que não necessariamente tenham uma indicação geográfica”.
Um dos componentes importantes dessa metodologia é a chamada governança territorial. “É necessário criar algum mecanismo para fazer esses distintos atores atuarem de forma conjunta. Quem sabe esse seja o principal gargalo dessa metodologia: conseguir essa interação entre esses atores de cadeias produtivas, de áreas diferentes de atuação em um mesmo território”. Outro ponto importante da metodologia é o que os pesquisadores definem como cenário, que leva em conta a história local, a paisagem, a qualidade do meio ambiente e a existência de equipamentos culturais, como museus, trilhas, festas típicas.
As Indicações Geográficas são uma das formas de compor essas cestas, mas é possível utilizar outros procedimentos de diferenciar os produtos, como as marcas coletivas. “E mesmo as ações que não utilizem o que chamamos de selos de qualidade, mas que valorizem os produtos em circuitos curtos de comercialização com essa ideia de integrar serviços e produtos de qualidade”, afirma o pesquisador da UFSC.
Maçã Fuji
A maçã Fuji da região de São Joaquim é a quarta Indicação Geográfica de produtos da Serra Catarinense, e vem somar-se ao queijo serrano, aos vinhos de altitude e ao mel de melato de bracatinga.
De acordo com informações divulgadas pelo Sebrae-SC, o certificado concedido pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi) reconhece a Maçã Fuji produzida em área delimitada da Região de São Joaquim, que engloba também os municípios Bom Jardim da Serra, Urupema, Urubici e Painel. O território da Indicação Geográfica possui uma área total de 4.928 km², onde são produzidas cerca de 176, 8 mil toneladas. São 6.719 hectares dedicados aos pomares de macieiras, em 2.104 unidades produtoras, 90% das quais são pequenas propriedades. A comercialização é feita por duas associações, seis cooperativas e 12 empresas.
A variedade Fuji da maçã foi trazida do Japão na década de 1970 e cultivada inicialmente nas colônias japonesas implantadas na região. Foi introduzida a partir de uma política pública de estímulo à produção de frutas de clima temperado. Graças a um intenso trabalho da Epagri, a maçã Fuji adquiriu com o tempo uma grande importância econômica para a economia local.
A qualidade da maçã Fuji produzida na região de São Joaquim alcançou reconhecimento nacional e garantiu ao município o título de Capital Brasileira da Maçã. Atualmente, a região possui o maior número de produtores e responde por dois terços da produção nacional desta cultivar, apresentando também a maior produtividade do Brasil.
A altitude acima de 1.100 metros e o clima também garantem uma qualidade diferenciada para a maçã Fuji produzida na região de São Joaquim. Os processos de brotação e florescimento são induzidos pela ocorrência de pelo menos 700 horas de temperaturas abaixo de 7,2°C no inverno.
Os frutos cultivados na região apresentam maior tamanho e peso, graças a um ciclo vegetativo mais longo – floração antecipada e colheita tardia. A coloração vermelha mais intensa da casca está associada à ocorrência de noites frias nas semanas que antecedem a colheita, amplitude térmica suficiente para a síntese da antocianina. As maçãs Fuji da região também são consideradas mais crocantes e suculentas que as produzidas em outras localidades.
(UFSC, 10/08/2021)
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