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Camões e Caboto

(Por Sergio da Costa Ramos, DIÁRIO CATARINENSE, 15/07/2015)

Viver e navegar são verbos necessários e, mais do que nunca, é preciso conjugá-los. Os pintores mais expressivos de Santa Catarina amavam o mar e expressavam esse afeto em suas telas.

Ao contrário dos que hoje negam à Ilha de Santa Catarina o mesmo direito ao mar que transformou os portugueses em audazes navegadores, os pintores catarinenses gostam do mar.

São preciosas as marinhas de Eduardo Dias – e até as paisagens marcadas pelo azul, de mestre Martinho de Haro, barcos ancorados, ou do muralista Hassis, as pedras “sagradas” de Itaguaçu.

Faz pouco mais de um século que as telas de Eduardo Dias retratavam o “viveiro de barcos” ancorados placidamente no espelho das duas baías, na passagem do século 19 para o 20. Centenas de barquinhos pareciam refletir na grande tela a vocação dos ilhéus para a bela “estrada” de líquidos cristais. Hoje, para um casco descer ao mar, só falta a exigência de “estudo de impacto ambiental”… Como se navegar fosse… poluir.

No tempo do grande paisagista do mar – nosso Eduardo Dias –, as telas refletiam outra realidade das nossas baías: nelas, sempre havia um convés de navio, o sol, o sal, o mar. Caravelas, navios a vapor, escunas, baleeiras – ou simples bateiras coloridas e açorianas –, embarcações de bom calado, ou simples casquinhas flutuantes, qualquer assoalho que boiasse lançava sua âncora na Baía Sul, desde os tempos imemoriais de Sebastiano Caboto, o “prático” que batizou a navegação de “cabotagem”.

Mas nem sempre seria assim. Algumas profecias do “porvir” já alertavam para essa estranha idiossincrasia dos que, numa ilha, não gostam do mar. As casas ilhoas, de costas para o oceano, refletiam o bizarro sentimento de alguns nativos em relação ao mar: este não era reverenciado como o “padrinho”, o pai ou o provedor.

Para o mar – líquido “guarda-comida”, empório de víveres, ente da natureza que requer respeito e gratidão –, os ilhéus devotavam os seus rejeitos. Suas latrinas davam para o mar, as marolas servindo de “encanamento”.

Até prova em contrário, a Ilha de Santa Catarina continua sendo um pedaço de terra cercado de água por todos os lados. Mas, às vezes, não parece. Na Ilha com o menor número de marinas do mundo, o caminho das praias mais parece um frenético monumento às montadoras de veículos.

 

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