Ainda com muitas informações desencontradas, cerca de 200 moradores da Lagoa da Conceição, em Florianópolis, se reuniram na noite de segunda-feira (21) na SAL (Sociedade Amigos da Lagoa) para definir como agirão diante da decisão que pode colocar 923 imóveis no chão. A ação, transitada e julgada desde 2010, cobra da Prefeitura de Florianópolis a regularidade de todos os imóveis a 30 metros da margem da Lagoa, além do acesso livre de público conforme as legislações vigentes.
No entanto, enquanto os moradores debatiam no SAL de maneira mais informal, no sentido de tirar dúvidas e buscarem um plano de ação, outra reunião era realizada na Acif Regional Lagoa (Associação Comercial e Industrial de Florianópolis), com empresários, representantes de associações locais e o procurador-geral do município, Alessandro Abreu. Os dois encontros tinham o mesmo objetivo e terminaram praticamente com as mesmas deliberações: buscar formas de defesa coletiva dos atingidos e buscar novos diálogos com a Justiça.
No encontro dos moradores, na SAL, uma das propostas foi de montar uma bancada de advogados, com a possibilidade de provocar a OAB/SC, para que a defesa aconteça de forma institucional. “Mais do que nos unirmos, temos que transformar essa briga numa briga política, se nos dividirmos perderemos força”, disse Carlos Mussi, 69 anos, morador há 18 anos na Lagoa.
Uma nova reunião foi marcada para a próxima segunda-feira, também no SAL, onde associações de todas as comunidades que circundam a Lagoa devem formalizar a criação de um grupo de trabalhos. No dia 7 de agosto, os moradores também devem participar de uma audiência pública com a Prefeitura de Florianópolis.
Prefeitura tenta reverter decisão judicial
A Prefeitura de Florianópolis tenta reverter a decisão da Justiça Federal que pede a preservação de todo o entorno da Lagoa da Conceição em até 30 metros, acarretando na demolição de quase mil construções. Como a ação transitou em julgado no mandato de Dario Berger (2005 a 2012), não há mais possibilidade de recorrer da decisão. Por isso, a Procuradoria Geral do município protocolou na tarde de segunda-feira (21), na 6ª Vara Federal da Capital, ação denominada “exceção de pré-executividade”.
A Procuradoria sustenta três pontos: incompetência da Justiça Federal para julgar o pedido feito pelo MPF (Ministério Público Federal); inexatidão do objeto da decisão, por conta de seu caráter genérico, sem apontar quais imóveis/construções devem ser demolidos; e aplicação da teoria do fato consumado, que diz que áreas ocupadas há décadas por bens urbanística e socialmente consolidados não podem ser objeto de demolição. O prefeito Cesar Souza Júnior classifica como radical a decisão de demolir 923 construções, incluindo creches, escolas, postos de saúde, igrejas, residências e comércios. “Não serei instrumento para promover a injustiça e provocar desumanidade das pessoas que moram ali há anos”, disse.
Na audiência com Justiça Federal e MPF (Ministério Público Federal), marcada para 13 de agosto, a prefeitura apresentará um novo cronograma de avaliação da situação da Lagoa – já que o primeiro foi recusado no início do ano pelo MPF. A tentativa da prefeitura será para sensibilizar o Judiciário a não discutir a demolição de construções que tenham sido erguidas na Lagoa da Conceição até 2008, ano em que foi instituída uma medida provisória pelo governo federal estabelecendo que até aquele ano situações consolidadas em APP (Área de Preservação Permanente) possam ser regularizadas. “Não dá para aplicar uma regra relativamente recente a uma situação que vem de décadas”, avaliou.
Segundo o prefeito, o novo cronograma que será apresentado deverá ser mais claro e proporá medidas que preservem as chamadas situações consolidadas. A prefeitura também apresentará ao Judiciário o que já foi feito para preservar a Lagoa da Conceição, como ocupações demolidas recentemente e fiscalização do esgoto. Antes, a prefeitura fará uma audiência pública no dia 7, a partir das 19h, na SAL (Sociedade Amigos da Lagoa), no Centrinho da Lagoa.
Cada demolição pode custar R$ 130 mil
A Prefeitura avalia ainda criar um grupo de trabalho para lidar com a questão e contratar equipes técnicas externas para executar o serviço, já que não teria estrutura para fazer tantas demolições. Cada demolição custaria R$ 130 mil para a prefeitura.
Caso o prefeito não cumpra a decisão da Justiça, ele poderá responder por improbidade administrativa e ação criminal, com possibilidade até mesmo de prisão. Como a juíza que conduz a ação, Marjôrie Cristina Freiberger Ribeiro da Silva, está de férias, o juiz Marcelo Krás Borges, que comandará a audiência de 13 de agosto, não se manifestará sobre o caso.
Determinações da Justiça ao município
Obediência da área de preservação permanente de 30 metros no entorno da Lagoa da Conceição, conforme legislação federal (lei 4.771/65 e resolução do Conama 303/2002)
Levantamento das ocupações em área de marinha no entorno da Lagoa da Conceição
Identificação dos responsáveis por essas ocupações, bem como quais construções obtiveram alvarás e em que data foram expedidos
Abertura de acessos às margens da Lagoa da Conceição, de acordo com as normas legais, ou seja, caminhos de pelo menos três metros de largura a cada 125 metros, bem como a garantia da faixa de 15 metros na margem para a circulação de pedestres (artigos 91 e 92 da lei municipal 2.193/1985)
“Melhorar acessos e recuperar o entorno”
O procurador-geral do município, Alessandro Abreu, afirmou que a prefeitura buscará “melhorar os acessos e recuperar o entorno”, como pede a ação, numa tentativa de reverter os processos de demolição. “Temos as situações consolidadas e cada caso pode ser um caso. Sempre com a premissa de cuidar do meio ambiente e que não sejam uma ou duas pessoas que decidam o futuro da Lagoa”, declarou.
O deputado estadual Edison Andrino (PMDB), que também participou do encontro na Acif, disse que a comunidade está preparando os encaminhamentos que serão feitos à prefeitura para que se busquem alternativas “que não sejam a demolição”. “É uma situação muito complicada no sentido de que pode se causar injustiças”, completou.
Segundo Abreu, o número de 923 imóveis foi levantado por meio do sistema de georreferenciamento da prefeitura, mas que o número pode ainda não estar exato. “O número de moradias atingidas pela decisão pode chegar a 3.000”, disse.
(Notícias do Dia, 21/07/2014)
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