Santa Catarina, a sétima maior economia do Brasil, está devendo muito quando o assunto é saneamento básico. Das 293 cidades, apenas 16% têm tratamento adequado de esgoto. No cenário nacional, o Estado é 11º pior no setor. Os dados foram divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Das sete maiores economias do Brasil, Santa Catarina só ficou à frente do Rio Grande do Sul em uma avaliação que mostrou números preocupantes: 34,8 milhões de pessoas não contavam com serviço de rede coletora de esgoto em 2008, época da pesquisa.
Segundo Luiz Sérgio Thilitti, professor de Engenharia Sanitária e Ambiental da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), a falta de saneamento básico representa riscos em diversas áreas, principalmente na saúde e no meio ambiente. O turismo também pode ser afetado.
– O índice é muito baixo, principalmente se levarmos em consideração a economia de Santa Catarina. A gestão ficou concentrada na Casan e o assunto não teve prioridade – avaliou Thilitti.
Para Sebastião dos Reis Salvador, presidente da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental de Santa Catarina (Abes-SC), a solução vai passar pelos planos municipais de saneamento básico.
– Até 2013, todas cidades precisam ter um plano municipal. Quem não tiver não conseguirá recursos. A sociedade precisa se envolver, cobrar e ajudar – disse.
O estudo revelou outros pontos de alerta. Quanto à drenagem de águas da chuva, o Estado tem problemas em 173 cidades. Em relação ao lixo, todas as cidades têm coleta, mas apenas 55 separam o material.
No quesito abastecimento de água, Paial é destaque negativo como uma das 33 cidades brasileiras sem rede formal instalada. A cidade, a 30 km de Chapecó, tem 1.823 habitantes e o sistema é precário. Apenas um poço artesiano, instalado por uma empresa privada, abastece toda a população.
Das 163 famílias do perímetro urbano, 142 são consumidoras da água que vem das mangueiras. É preciso que todas as casas tenham uma caixa para armazenar, caso ocorra problema de falta de água.
– Estoura um cano, fica a cidade toda sem água – conta Acy Bender, moradora há 58 anos em Paial.
Elio Angelo Mortari diz que prefere usar a água do poço:
– Já fiz análise e ela tem boa qualidade.
A arrecadação da prefeitura é de aproximadamente R$ 420 mil por mês. Segundo o secretário de administração, Antônio Soster, o motivo pelo qual a cidade ainda não tem uma rede de abastecimento não é apenas por falta de recursos.
– Falta vontade política. É preciso priorizar algumas ações. Este ano nós priorizaremos a água – argumenta Soster.
Serão investidos R$ 80 mil ainda este ano para iniciar a construção da rede e outros R$ 30 mil no próximo ano para finalizar o sistema. O dinheiro é somente da prefeitura e vai ser usado para a compra de materiais. Na mão de obra, além da prefeitura, espera-se também a colaboração da comunidade.
A solução que as famílias encontraram para ter água em casa é economizar.
– Quando falta água, como na semana passada, não lavo roupa e só uso o necessário para não acabar a reserva da caixa – diz Ivete Braatz.
Não é possível medir quanto cada família gasta, pois a cidade não tem hidrômetro. A taxa que cada morador paga é de R$ 19 para a prefeitura. O faturamento é de R$ 2,6 mil com a água distribuída. A promessa é que até fevereiro de 2011 Paial seja beneficiada com a rede de abastecimento de água.
– Estamos tentando melhorar o índice de Desenvolvimento Humano de Paial para atrair novos moradores – diz Soster.
Durante quatro anos somente 10 novas casas foram construídas na cidade. No ano passado, a prefeitura liberou 22 alvarás para construção.
* Colaborou Sirli Freitas
(Por MAURÍCIO FRIGHETTO E FELIPE PEREIRA, DC, 21/08/2010)
No lixo, falta controle
Em relação ao lixo, Santa Catarina foi um dos destaques da pesquisa. Todas as cidades têm coleta e 87,2% dos resíduos vão para aterros sanitários. Mas o estudo mostra que o Estado tem espaço para melhorar.
Os principais setores são controle do lixo depois de recolhido e a separação dos dejetos orgânicos do material que pode ser reciclado.
A coleta seletiva é realizada em 55 cidades catarinenses, o que representa 18,77% do total. O índice é semelhante ao restante do Brasil – 17,86%.
– A reciclagem tem a vantagem de aumentar a vida útil dos aterros sanitários, gerar emprego e renda, reunir os catadores em cooperativas e diminuir a quantidade de matéria-prima retirada da natureza – explica o Ivo Milani, consultor do Compromisso Empresarial para Reciclagem, uma das principais entidades do setor no país.
Quanto ao controle do lixo, 166 cidades (56,65%) fazem este trabalho. A maior parte está concentrada nos resíduos hospitalares. Nos outros tipos de lixo, o cuidado é bem menor. Num estado repleto de cidades com economia baseada na agricultura somente 37 delas exercem controle sobre embalagens de agrotóxicos.
A Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (Casan) atua em 201 dos 293 municípios do Estado. O superintendente de Meio Ambiente e Recursos Hídricos da empresa, Cláudio Floriani Junior, reconhece o problema e diz que há R$ 845 milhões para serem investidos principalmente nas cidades litorâneas, onde a população é maior.
Diário Catarinense – O levantamento do IBGE mostra que em SC apenas 16% dos municípios têm tratamento de esgoto. Por que o índice é tão baixo?
Cláudio Floriani Junior – É importante destacar que o setor de saneamento ficou com os recursos contingenciados no período do Collor e do Fernando Henrique Cardoso. Os municípios e os estados não conseguiam dinheiro e o saneamento ficou parado no país. O objetivo, a gente sabe, era mostrar a ineficiência do serviço e, assim, estaria justificada a privatização. A partir da mudança no governo federal, em 2003, voltou a se investir em saneamento.
DC – Apesar de o problema ser nacional, SC é o 11º pior colocado.
Floriani – O dado do IBGE pra nós, Casan, é muito bom. Diziam que SC estava à frente apenas do Piauí. Claro que o Estado precisa melhorar e vai melhorar nos próximos anos. Quando o governo federal passou a viabilizar os financiamentos, fizemos um saneamento financeiro porque a Casan e o Estado não passavam nas análises de risco para conseguir os investimentos. Hoje, temos garantido R$ 500 milhões do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e R$ 345 milhões de um banco japonês.
DC – Quais serão as prioridades com este dinheiro?
Cláudio – Atender aos municípios da faixa litorânea. Foi identificado pelo IBGE que em torno de 70% da população catarinense vive na faixa de 100 quilômetros no litoral. A prioridade tem que ser os municípios maiores para atender a mais pessoas.
DC – Existe alguma meta?
Cláudio – Não, porque a legislação nacional de saneamento básico não solicitou.
(DC, 21/08/2010)
Drenagem é deficitária
Todo ano, os jornais repetem histórias de catarinenses que têm as casas invadidas pela água e perdem móveis, eletrodomésticos e vidas. As causas são atribuídas a enxurradas, longos períodos de chuva e ocupação inadequada do solo. O último item é o único que pode ser controlado pelo homem, mas esta possibilidade não está sendo aproveitada conforme apontou a pesquisa divulgada ontem.
Os estudo informou que 173 (59,04%) cidades catarinenses apresentam problemas no escoamento das chuvas. A substituição de espaços verdes por asfalto e a construção de casas cria uma ampla superfície onde a chuva não é absorvida pelo solo, explica o professor universitário Leonardo Rorig, doutor em Ecologia e Recursos Naturais.
– Outra consequência é que a água corre mais rápido e acumula nas regiões de baixada, aumentando a possibilidade de alagamentos.
O professor diz que este cenário é resultado do crescimento desordenado das cidades. Ele afirma que a situação é facilmente percebida em Itajaí, Blumenau e Florianópolis, municípios que enfrentam problemas frequentes de alagamento. Leonardo declara que a situação pode ser compensada com um planejamento adequado. O método mais correto é uma rede de tubos com diâmetro considerável ligada a bocas de lobo. Diz ainda que os canais para drenagem da água devem ser abertos. Ele constata que em SC ocorre o contrário e os canais são aterrados para permitir o aproveitamento do espaço para construções. Além de prejuízos econômicos e de vidas, o professor lembra que os alagamentos se transforma em perigo à saúde pública.
– Quando os tubos subterrâneos transbordam trazem à superfície uma série de microorganismos e poluentes acumulados nas ruas.
Se depender do histórico, a situação deve piorar, conforme prevê o professor. Ele justifica que existe um descompasso muito grande entre o conhecimento produzido em universidades e a aplicação das soluções pelos administradores públicos.
(DC, 21/08/2010)
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