Da Coluna de Fabio Gadotti (fabiogadotti.net, 19/01/2025)
O ex-vereador e ex-deputado estadual Bruno Souza, que acaba de assumir a Secretaria de Assistência Social de Florianópolis, defende uma mudança nas políticas públicas voltadas aos moradores em situação de rua. Ele acredita que o assunto deve ser tratado principalmente como um problema de saúde pública, para tratamento de dependentes químicos, e ações que incentivem a reinserção no mercado de trabalho. Bruno acredita que o modelo atual, com diversos programas direcionados a esse público, podem estar “subsidiando a vida deles na rua, ao invés de incentivá-los a saírem”. O novo secretário também questiona a doação de esmolas nas ruas: “Quem dá esmola no semáforo faz duas coisas: bota crack na mão de um dependente e financia um traficante”.
A Secretaria da Assistência Social de Florianópolis lida com as políticas públicas voltadas aos moradores em situação de rua, uma das pautas mais complicadas da prefeitura. Muda algo em relação ao que vem sendo feito?
Primeiro, temos que fazer uma defesa daquilo que já foi feito. Por quê? Porque Florianópolis, sem dúvida, é a cidade no Estado que mais ofereceu programas para esse público. Nenhuma ofereceu tanto. Na comparação, tem mais programas entre as 10 maiores do Estado Então, não é por falta de programa, de oferta, de oportunidade que temos pessoas nas ruas da capital.
O que temos de refletir é se isso ajudou e vai ajudar, a longo prazo, a diminuir o problema ou se pode ser um polo atrator de mais migração de população em situação de rua. Defendo a tese de que isso pode acabar atraindo cada vez mais moradores de rua para Florianópolis. Então, vejo como um problema, porque além disso de atrair cada vez essa população e fazer o pagador de impostos de Florianópolis arcar com esse custo que não devia ser dele, podemos, eventualmente, não estar ajudando essa população a sair da rua. Podemos estar só subsidiando a vida deles na rua, ao invés de incentivá-las a saírem.
Deveríamos estimular as pessoas a saírem das ruas, oferecer um bom caminho para quem quer se tratar e oferecer vagas para quem quer trabalhar. Isso já está posto, já existe; quem quiser trabalhar em Florianópolis tem um bom encaminhamento para isso, e o dependente químico que quiser se tratar também. Agora, particularmente, sou cético em relação a financiarmos quem se recusa a trabalhar e se tratar. A pessoa que está usufruindo dos benefícios da prefeitura e não quer nem trabalhar nem se tratar está sendo, no fundo, financiada para se manter na rua.
O questionamento é ficar servindo refeições e dar uma assistência oficial indefinidamente a pessoas que estão na rua, é isso?
Exato. É isso mesmo. O que defendo é muito complicado porque implica cortarmos isso. Só seria para quem quer trabalhar ou quem quer se tratar. Acredito nisso, mas entendo que é muito complicado porque teríamos uma piora momentânea. Quem está lá na passarela, por exemplo, dormindo lá só para usar dos serviços públicos, sem intenção de sair dessa vida, vai começar a dormir por um tempo na rua. Quem hoje se alimenta, faz quatro refeições por dia na passarela, passaria a perambular pelo centro por um bom tempo. Mas entendo que essa decisão, junto com outras ações de ordem pública, acabariam por incentivar as pessoas a buscarem um trabalho ou um tratamento.
Quais serão as ações iniciais da secretaria?
Estamos tendo algumas reuniões e quero poder defender o que eu acredito, senão não faz sentido a minha presença. Não vivo de política, tenho uma vida muito consolidada fora da política, então só faz sentido estar abrindo mão do meu tempo, das coisas que quero fazer fora, se puder defender o que acredito. Se não, outra pessoa pode assumir o meu lugar. E é legítimo que o que defendo não seja aplicado se a prefeitura entender que não deve ser o caminho, porque temos um gestor que foi eleito em primeiro turno e a população validou a gestão dele, então ele escolhe. Mas a minha permanência, claro, depende muito de defender o que eu acredito, senão não faz sentido.
Nesses planos, como fica o projeto do Restaurante Popular?
Ele deve ser reaberto, depois de um tempo, reformulado. Para moradores de rua, temos a passarela. Por quê? Porque lá podemos abordar o morador de rua, tentar convencê-lo a deixar a dependência química. O Restaurante Popular (que funciona na avenida Mauro Ramos) nasceu com um propósito que não foi atendido. Será reformulado para atender um outro tipo de situação, as pessoas que são carentes e que eventualmente têm uma carência alimentar, trabalhadores, pessoas que não têm renda ou muito pouca renda, comunidades carentes e tudo mais. Não é para a população de rua, que deve ter um tratamento específico. Não temos problema de miséria e de fome, temos dependência química.
Faço questão de ressaltar isso porque a população precisa entender a realidade do problema para poder agir de forma correta e nos ajudar a resolver a situação. O que adianta tentar tirar a pessoa da rua se esse sujeito vai para a sinaleira e tira R$ 20 a R$ 250 por dia com as esmolas. As pessoas acham que estão fazendo um bem dando R$ 5 para um morador em situação de rua. Quem dá esmola no semáforo faz duas coisas: bota crack na mão de um dependente e financia um traficante.
Em relação à lei da internação voluntária, como é que a secretaria vai trabalhar com esse assunto? A percepção é que não deu certo.
Temos que encontrar uma maneira de fazer isso e apelar e sensibilizar para a participação do Estado. Porque nas ruas, repito, não temos um problema de miséria mas hoje quem lida é majoritariamente de assistência social. Temos um problema de saúde pública. Então, precisamos que a área da saúde do Estado também se envolva para que a gente consiga promover a internação involuntária, para termos leitos adequados, um local de desintoxicação. Precisamos desse envolvimento das duas esferas. O projeto exige uma internação de alta complexidade. Por isso é necessário que o Estado se envolva também. É necessário isso.
Sabe quem causou essa visão errada sobre o problema? A esquerda, que ficou muito tempo falando e repetindo que o problema da população de rua era a miséria e a falta de moradia. Isso afastou a saúde pública desse tema e colocou apenas a assistência social e a segurança discutindo o tema. É culpa deles, dessa organizações ligadas à esquerda. Se hoje temos uma epidemia de crack e de dependentes químicos, grande parte da responsabilidade é desses promotores da miséria, que espalharam mentira. E nós, como sociedade civil, perdemos o debate por W.O.
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