O Órgão Especial do Tribunal de Justiça de Santa Catarina julgou constitucional a Lei Municipal 10.020/2016, que regulamenta o surfe em Florianópolis durante a safra da tainha – período de 1º de maio a 10 de julho, no qual é realizada a pesca da espécie nas praias da Ilha de Santa Catarina.
O exame da possível inconstitucionalidade da lei municipal foi submetido ao Órgão Especial pela 2ª Câmara de Direito Público do TJ, nos autos da apelação em mandado de segurança coletivo impetrado pela Associação Brasileira de Surf Profissional, Federação dos Esportes Radicais, Associação de Surf da Praia Brava e Federação Catarinense de Bodyboard em face de ato supostamente ilegal atribuído ao prefeito municipal de Florianópolis, secretários municipais da Casa Civil, Segurança e Gestão de Trânsito e diretor da Guarda Municipal de Florianópolis.
A lei determina que, no período da safra da tainha, o surfe fica permitido na praia da Joaquina, praia Mole, até 500 metros do canto esquerdo da praia da Lagoinha do Leste, até 500 metros do canto esquerdo da praia do Matadeiro, até 500 metros do canto esquerdo da praia da Armação e até 500 metros para a direita da entrada da praia do Moçambique.
Nas demais praias, fica determinada a utilização do sistema de bandeiras, a serem instaladas diariamente pelos responsáveis pelos ranchos de pescas, nas cores verde e vermelha para indicar, respectivamente, a permissão ou a proibição da prática de surfe durante o período de pesca da tainha.
As entidades que representam o interesse dos praticantes de surfe argumentaram que a lei padece de inconstitucionalidade formal, por pretensa invasão de competência privativa da União ao legislar sobre o assunto. O vício seria reforçado pela alegada violação ao Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (Lei n. 7.661/88), ao Decreto n. 5.300/2004 e, também, ao Plano Estadual de Gerenciamento Costeiro (Lei Estadual n. 13.533/2005), os quais dispõem que as praias são bens de uso comum do povo, assegurado o livre e franco acesso a elas e ao mar.
As impetrantes também colocaram que não há óbices à coexistência pacífica e harmoniosa entre o surfe e a pesca, e que a restrição imposta pela norma impugnada viola o princípio da igualdade. Alegaram ainda, em linhas gerais, a ocorrência de desvio do Poder Legislativo e a existência de meios menos gravosos e mais eficazes para garantir os interesses da lei.
Em seu voto, o desembargador Saul Steil, relator da matéria, adianta que não há inconstitucionalidade formal manifesta na lei, pois o município tem competência para regular a ocupação de suas praias quando presente o interesse local e a defesa do patrimônio cultural. O magistrado também argumenta que não há violação ao princípio de igualdade, nem a criação de “classes privilegiadas” para acessar o mar, e que, ao instituir um sistema de bandeiras, a solução adotada pelo legislador foi adequada, razoável e proporcional.
“A medida, é certo, prioriza os pescadores, pois o seu interesse será determinante na afixação das bandeiras. Mas essa prioridade é justificada, dada a temporalidade da pesca da tainha, o interesse econômico e de subsistência dos pescadores artesanais e das comunidades pesqueiras, o interesse econômico do município em seu potencial turístico e gastronômico, a proteção do patrimônio cultural da cidade e o fato de que, excetuadas as praias sinalizadas no período de maio a julho, o surfe poderá ser praticado sem óbices em todas as praias”, destaca o relatório.
Desse modo, a decisão do Órgão Especial também determina que a ausência de instalação de bandeira vermelha nas praias não citadas nominalmente pela lei equivale à afixação de bandeira verde no local para a prática do surfe. A decisão foi unânime (Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade n. 5054267-56.2021.8.24.0000).
(TJSC, 08/03/2023)
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