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Discussão sobre aumento de gabaritos em Florianópolis preocupa muito, diz professor da UFSC

Da Coluna de Fabio Gadotti (ND, 28/01/2022)

Professor do programa de pós-graduação em engenharia de transporte e gestão territorial e integrante do Observatório de Mobilidade da UFSC, o professor Arnoldo Debatin Neto fala à coluna sobre os temas mais polêmicos que envolvem o processo de revisão do Plano Diretor de Florianópolis.

O planejamento urbano de Florianópolis, na sua opinião, deve considerar qual conceito de cidade e prioridades?
A primeira coisa é pensar na vocação da cidade. A gente sabe, óbvio, que Florianópolis tem uma vocação turística, isso é inquestionável. Partindo desse pressuposto, todo cuidado com o meio ambiente é importante. Nosso patrimônio natural é a praia. Por outro lado, temos um patrimônio visual, vamos dizer assim, que são os morros. Essas peculiaridades da cidade é que tornam Florianópolis única.

Entendo que para manter essa vocação turística a primeira prioridade deve ser a preservação. Numa cidade turística, onde as praias são o maior atrativo, a primeira coisa que a gente deveria de exemplo para o mundo seria ter um excelente sistema de tratamento de esgoto para mantê-las 100% limpas.

Outra vocação de Florianópolis, muito importante, diz respeito à sociedade da informação. É uma indústria que não polui e Florianópolis tem condições de desenvolver isso. Temos universidades e atratividade para as pessoas que trabalham nessa área tecnológica e que são a favor do meio ambiente, além de buscarem uma vida tranquila e segura.

Você considera que as sugestões da prefeitura para revisão do Plano Diretor melhoram o texto atual?
Fiz uma leitura muito breve e foquei na questão do gabarito x mobilidade urbana, minha área de pesquisa. A revisão deve estar focada na vocação da cidade, suas limitações territoriais e ambientais e sua capacidade de evolução do sistema de mobilidade. Isso precede a própria discussão do Plano Diretor, no meu entendimento.

Temos que ter uma visão de cidade para o futuro, compreender suas limitações e potencialidades. E depois discutir o que a gente pode pensar para que a cidade se desenvolva naquela direção. O plano vai disciplinar todo o ordenamento do território, os sistemas que podem ser implementados.

Como está vendo a discussão em torno de possível aumento de gabaritos e da ideia de adensamento de algumas regiões?
A densidade, por si, não é um problema. Inclusive, pensando em infraestrutura, é muito melhor um gabarito de 6 andares do que uma residência unifamiliar. A questão é que, às vezes, não se tem a compensação.

Vamos pensar num bairro como a Trindade, inicialmente unifamiliar. De repente, o gabarito sobe para quatro pavimentos e hoje está em 16 andares. Por outro lado, não houve uma determinação de área de uso público – um parque, uma praça -, implementação de um sistema troncal de transporte etc.

A permanência das pessoas nos seus núcleos é o que se chama de polinucleação e Florianópolis já tem isso como gênese. A cidade já cresceu assim. Outro aspecto a ser discutido é o desenvolvimento orientado ao transporte sustentável, que trabalha com o aumento da densidade, uso misto do solo, sistemas de  – para permitir que a pessoa seja capaz de, numa determina distância, resolver a maioria de suas necessidades diárias com uma caminhada de 15 a 20 minutos.

Aí entra o planejamento da cidade para as pessoas caminharem. Embora a prefeitura da Capital tenha investido em calçadas, a caminhada ainda é muito ruim. As calçadas não têm uma largura adequada, falta vegetação etc. Estamos longe de ter uma estrutura de caminhabilidade mais positiva para as pessoas.

A discussão sobre o aumento dos gabaritos é a mais sensível durante esse processo de revisão do Plano Diretor?
Sim, me preocupa muito. A cidade, na condição que está, já é complicada no quesito locomoção. E essa dificuldade de locomoção não é só uma questão de estresse de trânsito. Tem muitas outras repercussões, todas negativas.

Está na cara que não considerar isso e aumentar o gabarito significa agravar o panorama. Um aspecto que considero grave e preocupante é o impacto disso nas infraestruturas de deslocamento urbano. Florianópolis é uma cidade bastante singular e, por isso, precisa de respostas diferenciadas de mobilidade urbana e, sobretudo, de transporte público.

Como vê a discussão sobre as audiências públicas distritais, que acabou judicializada pelo MPSC?
Não concordo que as audiências sejam todas no mesmo dia. Nesse momento não devemos ter pressa para encaminhar um assunto dessa envergadura. A proposta vai ter muito impacto nas regiões de Coqueiros, Santa Mônica, Jurerê In e Campeche, por exemplo. Acho temerário urbanizar uma área dessas para depois ter impactos ambientais irreversíveis.

O Plano Diretor atual é ruim, prejudicial à cidade?
Não posso dizer que é ruim, foi trabalhado por técnicos e discutido, mas penso que as mudanças precisam de uma abordagem mais contemporânea. A primeira delas é trabalhar a vocação da cidade, com criação dos critérios e da regulamentação.

O Plano Diretor deve refletir o que se quer da cidade. É difícil, sim, tem  muitos atores envolvidos, mas tenho a convicção que a gente precisa se apoiar em critérios técnicos. Temos, por exemplo, uma série de critérios técnicos a serem observados antes de subir para 16 pavimentos.

Parece um número mágico. Algo como “vamos ver o que acontece depois”. Mas hoje em dia não dá mais para fazer isso, a cidade cresceu muito, tem mais de 500 mil habitantes. A densidade tem que estudada, logicamente, mas com critérios e cuidado.

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