Mesmo durante a pandemia, a ganância de empreendedores e a falta de fiscalização continuam rendendo, e até ampliando, problemas ambientais e urbanísticos no Norte da Ilha de Santa Catarina. Prova disso são as 20 ações ajuizadas, entre ações cautelares e civis públicas, pela 32ª Promotoria de Justiça da Comarca da Capital por construções clandestinas e loteamentos irregulares na região nos últimos quatro meses.
O desrespeito às normas urbanísticas, ambientais, registrais e sociais traz uma série de danos à sociedade, na maioria das vezes irreversíveis, como a densidade populacional acima do suportado pela região, a abertura de ruas ilegais e sem condições de tráfego, a construção sobre mangues e área de risco, a ausência de infraestrutura básica e ligações clandestinas de água e luz.
De modo geral, as ações da área cível buscam o embargo imediato das obras e a demolição diante das irregularidades ambientais e urbanísticas, frente à ilegalidade dos imóveis construídos que não são passíveis de regularização, mediante a ação efetiva dos órgãos de fiscalização, e a reconstituição ambiental da área degradada ou a compensação ambiental equivalente.
O Promotor de Justiça Paulo Antonio Locatelli ressalta, no entanto, que o Ministério Público está atento à questão social amplificada pela pandemia. “O momento exige um olhar diferenciado para construções clandestinas ou irregulares da população considerada de baixa renda, focando as ações nas edificações e parcelamento do solo ilegal de interesse específico”, explica o titular da 32ª Promotoria de Justiça.
Os casos vão desde a construção sem obediência aos limites estabelecidos pelo Plano Diretor e pelo Código Florestal até a abertura de loteamentos clandestinos em área de preservação. As ações têm como alvo tanto obras em fase inicial quanto já concluídas. Em todas são requeridas liminares para a suspensão das obras, cortes de água e luz em construções clandestinas ou mesmo a proibição de negociação dos imóveis ilegais. Em alguns casos, o MPSC requereu que o município se manifeste sobre a possibilidade de regularização.
Os bairros Ingleses e Rio Vermelho concentram a maior parte dos casos que envolvem construções clandestinas, sem qualquer licença ou alvará dos órgãos competentes, e degradação ambiental. Em comum, em quase a totalidade das ações ajuizadas – 18 das 20 – está a inclusão, além dos construtores, do Município de Florianópolis como réu, devido à omissão no seu exercício constitucional do poder de polícia.
Conforme o Promotor de Justiça, apesar de, em muitos ocasiões, o município identificar a irregularidade ainda no início, não tem sido capaz de estancá-la, muitas vezes pelo desrespeito do próprio autuado, o que resulta em degradação de grandes áreas de preservação e construções ilegais, pois até prédios são concluídos em APP ou contrários ao zoneamento.
“Em razão desta inatividade e ineficiência, nossa cidade, principalmente no Norte da Ilha de Santa Catarina, vai crescendo de forma irregular, de forma afrontosa a todo o ordenamento urbanístico traçado pela legislação. São inúmeros prédios, loteamentos etc. construídos ao arrepio da legislação federal e municipal, oriundo da avareza do empreendedor acreditando na carência ou inexistência de fiscalização”, constata Locatelli.
Segundo o Promotor de Justiça, se o município utilizasse sua estrutura para cumprir com as suas obrigações e conseguisse exaurir os atos administrativos com eficiência, sanando toda e qualquer irregularidade, tanto o Ministério Público como o Judiciário poderiam concentrar esforços em outras frentes.
Para Locatelli, com o vácuo deixado por quem de direito efetivamente deveria garantir o cumprimento de atos administrativos derivados do poder de polícia, a Promotoria de Justiça se vê no dever de ajuizar uma ação visando muitas vezes à regularidade ambiental, mas sempre à regularidade urbanística, nem que para isso o pedido seja a demolição.
“A grande responsável e a mais atingida pela desordem e gambiarra urbana é a própria sociedade que as promove, contando com a omissão ou dificuldade fiscalizatória dos órgãos públicos”, finaliza o Promotor de Justiça.
(MPSC, 07/08/2020)
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