Mesmo que tenham motivações diferentes, uma comunhão inédita e inesperada de interesses ocorreu nesta semana quando a construção civil e defensores do meio ambiente comemoraram a suspensão da tramitação do Plano Diretor de Florianópolis. Cada setor esperava aproveitar o tempo extra para conseguir alterações favoráveis ao seu ponto de vista. Mas se depender da prefeitura tudo permanecerá igual ao texto original que saiu do Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis (Ipuf).
A derrubada de propostas que modifiquem o Plano Diretor é prioridade no Executivo e a votação das cerca de 600 emendas pelos vereadores que deve ocorrer nesta semana é considerada o teste para saber quem realmente é aliado do prefeito Cesar Souza Junior (PSD). Além desta apreciação no plenário, o projeto precisa ser aprovado também num segundo turno.
A orientação aos integrantes da base é rejeitar qualquer proposta que mude áreas classificadas como de preservação afirma o líder de governo, vereador Dalmo Meneses (PP). Ele garante que tem apoio para forçar a derrubada de todas as emendas que desagradarem a prefeitura por tornar o plano mais permissivo.
— Não tenho dúvidas e serei o primeiro a pedir a rejeição — desafia.
Caso as propostas sejam aprovadas, passarão por análise de técnicos do Ipuf e aquelas consideradas como desfiguração do Plano Diretor serão vetadas pelo prefeito. Ainda assim, podem valer se a Câmara derrubar os vetos de Cesar Souza Junior. Neste cenário, o Executivo promete divulgar os nomes de todos os vereadores que, através do voto, afrouxarem as restrições do projeto permitindo aumento no tamanho de prédios ou alteração no zoneamento de regiões.
A situação não é a única a trabalhar, mas a diferença é que a oposição rema na direção contrária. O vereador Afrânio Boppré (PSOL) diz que a proposta da prefeitura é um bom ponto de partida e defende mais restrições na ocupação do solo. A estratégia é montar um grupo para barrar o avanço do projeto que exige aprovação com maioria qualificada nos dois turnos. Isso significa que é preciso que 16 dos 23 vereadores sejam favoráveis à proposta redigida pelo Ipuf.
O principal motivo da concessão da liminar dada pela Justiça Federal para a suspensão do Plano Diretor de Florianópolis foi a forma como o projeto tramitou. No Legislativo, parte dos vereadores reclama que a Casa teve um mês para analisar o resultado de sete anos de discussões com a população e que cerca de 600 emendas foram aprovadas pelas comissões para ir à votação em três dias.
O vereador Afrânio Boppré considera impossível avaliar o impacto de centenas de alterações sugeridas antes da votação que deve ocorrer nesta semana. Ele promete usar todas as possibilidades do regimento interno da Câmara para adiar a tramitação e diz que insistir em levar o assunto ao plenário cria um pretexto jurídico. Neste caso, garante que não vai hesitar em entrar com uma ação na Justiça.
Líder do governo, o vereador Dalmo Meneses (PP) diz que não houve prejuízos ao debate na tramitação. Argumenta que o assunto era discutido antes mesmo de chegar ao Legislativo. Ele garante que o sistema de exame das cerca de 600 emendas foi adequado. O esquema consistiu na avaliação das proposta pelas comissões em três dias e posterior aval da Comissão de Constituição e Justiça, da qual é presidente.
De acordo com o líder do governo, não houve atropelo na análise das emendas porque essas sugestões de mudanças atendem demandas da população em situações pontuais. Mesmo com as críticas que falam em tramitação relâmpago, ele tem confiança que o Plano Diretor será aprovado com ampla maioria.
Em 30 dias de tramitação na Câmara de Vereadores foram acrescentadas ao texto original 620 emendas – sendo 250 delas propostas somente pelo Executivo. O documento é mais volumoso que o próprio Plano Diretor, são quase 600 páginas (com assinaturas duplicadas, conflito de interesses e versões para atender pedidos exclusivos).
Assinatura duplicada
Uma emenda proposta pelo vereador Aldérico Furlan (PSC), que propõe alterações no zoneamento e gabarito de uso e ocupação do solo, teve assinatura duplicada de dois vereadores. Roberto Katumi (PSB) e Bispo Jerônimo (PRB) assinaram duas vezes o mesmo texto. O documento foi divulgado nas redes sociais e gerou polêmica. Isso porque a aprovação do Plano Diretor depende do “sim” de 16 parlamentares – exatamente o mesmo número a que se chegou com o carimbo duplo dos dois vereadores.
Procurado pela reportagem, Katumi garantiu que não houve má-fé. “Assinamos a emenda apenas para que haja tramitação, não quer dizer que concorde ou aprove o texto. Não sei dizer como aconteceu de assinar duas vezes, tínhamos um acordo de assinar as emendas de todos os vereadores (para que todas fossem levadas à discussão) e acabou passando”, argumentou.
Bispo Jerônimo foi procurado para comentar o caso, ficou de retornar as ligações, mas até o fechamento da edição não o havia feito.
Ponta do Coral
Existem pelo menos duas propostas de alteração sobre a Ponta do Coral. A área, que hoje está demarcada como de Turismo e Lazer, pode mudar para:
– Área Verde de Lazer. O vereador Pedro Silvestre (PP) propõe dar destinação pública à área para construção de parque.
– Área Turística Residencial. Quem propõe é o Executivo, para suporte ao turismo, mas também com moradias e pequenos negócios com até seis pavimentos.
Pedido Exclusivo
O vereador Edinon Manoel da Rosa (PMDB) propõe mudanças em zoneamento. Em Sambaqui e Santo Antônio de Lisboa, por exemplo, há pedidos de alteração em áreas de preservação permanente (APP). Uma das propostas atende ao pedido de uma moradora, que enviou documentação alegando que a casa dela se enquadra como área residencial. O vereador disse que as propostas feitas por ele são voltadas a pedidos individuais, porém seriam situações consolidadas.
Área de preservação
Ponto de conflito entre representantes de associações de moradores e entidades da construção civil, as áreas de preservação aparecem na maioria das emendas ao Plano Diretor. Se aprovadas, podem haver alterações em áreas de preservação permanente e áreas de preservação limitada (que permitem construção em apenas 10% do terreno). Em Campeche, por exemplo, o pedido de alterações inclui área próxima à reserva extrativista do Pirajubaé.
(DC, 24/11/2013)
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