Documento vai nortear decisões sobre uso do solo, ambiente e mobilidade
O Plano Diretor traça o futuro da cidade e traz propostas que norteiam estratégias para uma nova política de desenvolvimento urbano. “É como uma Constituição”, explica o arquiteto e urbanista Rodolfo Matte, que trabalhou na elaboração do documento. O anteprojeto apresentado pela Prefeitura da Capital é composto por 373 artigos. As quatro principais questões são ocupação do solo, mobilidade urbana, meio ambiente e instrumentos urbanísticos.
Matte esclarece que essa é “uma obra aberta”. A decisão de seguir as diretrizes cabe à comunidade, que discute as questões desde 2006 e definirá pelo veto ou aprovação até o fim do semestre. Uma das novidades é o modelo de gestão. “A ideia é uma administração participativa”, destaca o arquiteto. Para que a meta se concretize será instituído o Conselho da Cidade – núcleo da comunidade civil que participa e vota todas as grandes obras envolvendo o município.
Outra medida para garantir que o plano tenha sequência será a Agência de Desenvolvimento. “Ela servirá para impulsionar os projetos aprovados fora da esfera legislativa”, diz Matte. E, ainda, o Fórum das Secretarias, para que os representantes municipais pensem juntos as soluções propostas para cidade.
Matte ressalta que o Plano Diretor serve como “um norte”. Outros planos setoriais aprofundam as propostas, a partir de análises de viabilidade, estrutura e recursos humanos e financeiros.
Novo eixo viário, túneis e ciclovias
As rodovias SC-401 (que liga o Centro ao Norte da Ilha) e SC-405 (que conduz à região Sul) serão interligadas. Esse será o principal eixo viário da Capital. A pista será alargada e ganhará dois corredores para o fluxo do transporte coletivo – que pode ser trem ou ônibus. Ao lado haverá uma ciclovia e áreas verdes.
As ciclovias têm destaque no mapa de mobilidade – serão implantadas em todos os bairros da Ilha.
Na ponte Colombo Salles haverá um trajeto para as pedaladas, ligado ao Continente, que terá a estrutura, principalmente, na parte central.
São previstos quatro novos túneis em diferentes pontos de Florianópolis: um que liga o Centro ao Itacorubi (na avenida Madre Benvenuta), cortando a Trindade; outro na Lagoa da Conceição, da entrada do morro até a avenida Afonso Delambert; o terceiro ligando a praia dos Ingleses à Brava; e um nas dunas do Santinho.
Uma ligação entre Ilha e Continente pode virar um túnel marítimo – ou outra ponte, ainda para definição de acordo com um estudo aprofundado.
O transporte marítimo será instalado em três pontos: Norte, Sul e Centro – na região próxima ao Mercado Público. A intenção é que balsas conduzam pessoas, cargas e automóveis.
Algumas avenidas serão duplicadas, como a das Rendeiras, na Lagoa da Conceição, que é muito movimentada. As calçadas serão padronizadas, incluindo acesso fácil às pessoas com deficiência. Rotas paisagísticas, com informações turísticas, circundarão todas as vias da cidade.
Áreas de preservação vão ser ampliadas
“Teremos mais verde”, expôs o prefeito Dario Berger na apresentação oficial do Plano Diretor, na noite de terça-feira. O motivo da constatação é que as zonas de preservação, incluindo lagoas, serão ampliadas com a aprovação do projeto.
Hoje elas equivalem a 47% da cidade. A proposta do Plano Diretor é que essa área cresça para 52,32%. A região de amortecimento natural, ou seja, as planícies e encostas, que compõem 14,55% do território, também ganhará mais espaço, passando para 22%.
E uma nova zona, misto de rural e urbano, será criada, ocupando 3% do mapa ilhéu. O plano será possível com a diminuição do meio urbano, de 38.48% para 22%.
Outro artigo contempla a discussão sobre a orla. Serão organizados espaços distintos para pesca, maricultura, trânsito de barcos e lazer. O razão é adequar cada região às melhores práticas.
As construções existentes em terrenos de marinha (até 33 metros depois da areia) serão regulamentadas. “É para controle de crescimento e poluição”, explica o arquiteto Rodolfo Matte.
A coleta de lixo será modificada. O aterro vai ser desmembrado em núcleos menores, nos 13 bairros, para melhorar a manutenção, incentivar a reciclagem e diminuir o trajeto percorrido pelos garis.
O Plano, também, propõe a criação de uma “câmara para resolução de conflitos”, envolvendo construções ilegais em APPS (Áreas de Preservação Permanente) – morros, dunas e encostas. O grupo discutirá soluções para desocupar as instalações, realocar as famílias e demolir as edificações.
Cidade ficará mais baixa e ordenada
A metrópole se desenvolverá no Norte e mais próximo à praia do Campeche. A tentativa é conter o crescimento desordenado da cidade. Com os pólos urbanos compactados será possível aproveitar melhor as estruturas, como rede de energia e asfalto.
Quanto à altura máxima permitida para edificações, que atualmente é de 21 andares, o Plano Diretor prevê que elas passem para 18 andares.
Com uma diferenciação – se não houver uma estrutura completa de mobilidade urbana, saneamento básico e adequação ao uso do solo, a recomendação é não liberar o limite de construção.
Os terrenos ociosos, obrigatoriamente, devem estar em obras ou disponíveis para aluguel. “É uma medida para evitar a especulação imobiliária”, explica Rodolfo Matte. O cuidado é para que territórios vendidos não fiquem parados para valorização, enquanto há um déficit de moradias populacional. “Mas isso só serve para o que não está construído ainda”, acrescenta o arquiteto e urbanista.
Serão criados 13 centros de cidadania – o ideal é que cada área tenha biblioteca, cinema, teatro, centros esportivos e serviços da prefeitura acessíveis. “É para evitar deslocamentos desnecessários, controlando o fluxo de mobilidade”, diz Matte.
De acordo com o Plano Diretor, Floripa terá o Parque Cultural do Campeche (Pacuca), para resgate da história da aviação, onde Antoine de Saint Exupéry pousava em suas visitas à Ilha de Santa Catarina, e para o manejo do antigo campo do Sul da Ilha.
Favelas serão objeto de regulamentação
Os instrumentos urbanísticos estão divididos em 13 questões, ligadas ao uso do território. Elas organizarão, por exemplo, cobranças referentes ao imposto predial e à desapropriação de terras.
O usucapião será analisado em casos específicos, como nas favelas, para que sejam regulamentadas.
É previsto o direito à preempção, onde o município, num caso de disputa, terá preferência na aquisição de um imóvel se for de interesse público.
E o Estudo do Impacto de Vizinhança, que existe desde 2000, entrará finalmente em vigência. Ele só vale para grandes construções. A discussão será conduzida em audiência pública, com participação aberta à comunidade.
Nesse caso pode haver um acordo. Caso exista impacto, e mesmo assim a comunidade concorde com a construção, a empresa interessada pode oferecer obras de benefício público, como uma praça.
Novos assentamentos em corredores urbanos distribuirão a população de baixa renda de forma compacta.
O projeto visa a concentrar os centros urbanos, para diminuir o impacto ambiental e evitar transtornos na mobilidade urbana.
Próximos aos corredores populacionais, as grandes vias e centros de cidadania serão instaladas paisagens culturais. A valorização cultural também é citada no projeto numa iniciativa de preservação do centro histórico, de construções de outros séculos e dos sítios líticos – importantes porque contêm registros dos povos primitivos.
(Por Aline Torres, ND, 29/03/2012)
Plano Diretor
As cidades são veículos para a mudança social, lugares em que novos valores, crenças e ideias podem gerar um paradigma de crescimento diferente, que promova direitos e oportunidades para todos os membros da sociedade, segundo o relatório O Estado das Cidades no Mundo 2011, elaborado pelo Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU Habitat). Este conceito ganhará atualidade quando o novo Plano Diretor de Florianópolis, depois de ter suas linhas gerais apresentadas à comunidade, terça-feira, em reunião realizada no Clube 12 de Agosto, começar a receber sugestões e a ser discutido a partir do começo do mês que vem e até junho, quando, após audiência final para alterações, será remetido à Câmara de Vereadores.
As projeções da ONU indicam que todo o crescimento da população mundial, que já superou 6 bilhões de pessoas, se dará em áreas urbanas. Este movimento produz e produzirá, cada vez mais, problemas econômicos, sociais e ambientais. Aliar o crescimento acelerado das cidades à inclusão social passa a ser um dos maiores desafios dos formuladores de políticas públicas e dos administradores públicos.
O projeto ainda será discutido em 13 audiências públicas, quando poderá receber novas sugestões e sofrer alterações. A participação de representantes comunitários e de quaisquer cidadãos interessados na melhora da qualidade de vida da cidade é desejada e deve ser estimulada para que o futuro Plano Diretor seja, de fato, um instrumento de mudanças positivas para todos e não acoberte interesses outros que não os coletivos. Uma cidade inclusiva é o que todos almejamos.
Colaborar para tanto é um dever de cidadania, conceito que deriva da palavra cidade.
(Editorial, DC, 29/03/2012)
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