Surgidas justamente com o objetivo de executar políticas sociais com mais eficiência, as chamadas organizações não-governamentais (ONGs) que operam com verbas oficiais, em muitos casos, se desviaram de suas atribuições originais.
A particularidade de poderem ser contratadas sem licitação pelo poder público faz com que, no Brasil, as escolhas sejam feitas na maioria das vezes por critérios de afinidade política e de apadrinhamento, o que em algumas áreas provoca situações aberrantes.
Uma pequena parte dos excessos tem vindo a público por meio de investigações da Controladoria-Geral da União (CGU) e de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) específica sobre o tema no Senado, que ainda não deslanchou. Mas, independentemente dos resultados das apurações, torna-se urgente uma legislação que regule as relações entre essas instituições e o poder público.
Antes de mais nada, é importante distinguir que, de cerca de 275 mil ONGs em atividade nas mais diferentes áreas no país, a maioria se dedica a causas nobres. Nesse grupo majoritário, prevalece a preocupação com pressupostos como o do trabalho sem fins lucrativos, garantido basicamente pela atuação com o mínimo de pessoas e de burocracia.
Do total, estimado no ano passado, menos de 8 mil entidades atuariam na dependência de repasses oficiais. Nesse universo, ocorrem os desvios mais absurdos, tanto pelos montantes envolvidos de dinheiro público quanto por excentricidades típicas de quem gasta sabendo que a conta da exorbitância será paga pelo governo com dinheiro dos contribuintes.
Apenas no período entre 1999 e 2006, a estimativa é de que tenham sido movimentados mais de R$ 48 bilhões por meio dessas instituições. O problema começa pelo fato de que as contratações nessa área dispensam licitação.
A brecha legal que faz com que, no critério de escolha, possa valer até mesmo simpatia acabou levando fundações universitárias, criadas como alternativa de fuga ao engessamento burocrático, a se envolverem – assim como as instituições às quais pertencem – no cipoal de denúncias relacionadas a excessos de gastos e mesmo malversação de dinheiro público.
Incluem-se neste caso desde o uso de dinheiro para pesquisa universitária da Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos (Finatec) em decoração do apartamento do reitor da Universidade de Brasília (UnB) até volumes consideráveis destinados para instituições sindicais, sem que os caminhos percorridos pelo dinheiro do contribuinte sejam minimamente acompanhados.
A relação de governantes com organizações não-governamentais não pode se constituir numa espécie de ação entre amigos com dinheiro público. A escolha da instituição precisa ser feita de forma impessoal e o destino dos repasses tem que ser acompanhado com rigor. Não há outra forma de assegurar o bom uso de dinheiro público e de preservar a atuação de quem atua de forma ética nessa área.
(Editorial, DC, 27/02/08)
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