A Florianópolis que se quer e a que se pode ter. Esta é a discussão central do Plano Diretor Participativo (PDP), que vem sendo elaborado desde agosto de 2006 para definir a melhor forma de ocupar o território de acordo com a função social da Capital e respeitando suas especificidades. O PDP é definido pelo Estatuto da Cidade como um instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana. Depois da fase inicial de composição do Núcleo Gestor, formado por 39 representantes dos diversos segmentos da sociedade, agora entra em nova etapa, com a realização de oficinas para que as comunidades reflitam e elenquem as principais demandas de cada localidade. A expectativa do Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis (Ipuf), órgão que está conduzindo o processo, é finalizar o projeto de lei até o início de 2008.
O presidente do Ipuf, Ildo Rosa, diz que a elaboração do PDP é fundamental, uma vez que os planos em vigor mostram uma cidade bastante diferente da que se tem de fato. O Plano Diretor do Interior da Ilha foi elaborado há 22 anos, sendo que o do Distrito Sede é de 1997. “Os planos têm perspectiva de chegar a 1,5 milhão de habitantes. Isso é preocupante, pois temos cerca de 420 mil habitantes e já estamos no limite das áreas de preservação permanente, da viabilidade e mobilidade humana”, aponta. Por isso, o PDP é enxergado como uma oportunidade de repensar a cidade no sentido inverso ao que vinha sendo feito. Antes, o Plano Diretor era aprovado pela Câmara e depois chegava às comunidades, que, se não concordassem, tinham que lutar para fazer modificações. “Agora, estamos começando na outra ponta, debatendo com as comunidades, num processo muito mais demorado. Mas, pela primeira vez vamos tratar os conflitos na origem e as comunidades têm a chance de dizer o que querem”, diz Rosa.
A construção do projeto será feita ao longo de oficinas realizadas nos 13 distritos da Capital (na realidade são 12 distritos, mas o Distrito Sede foi subdividido em Centro e Continente). Neste mês o Ipuf pretende iniciar os primeiros encontros, onde serão levantados os grandes problemas, as demandas e prioridades. Posteriormente, este levantamento será cruzado com a leitura técnica elaborada pelo Ipuf. Na segunda oficina será apresentado o resultado do cruzamento das informações levantadas nos distritos com a avaliação técnica inseridas dentro do contexto da cidade. Na última oficina será referendada a proposta final. Depois que este processo ocorrer em todos os distritos, o Ipuf reunirá o material para redigir o projeto de lei que será encaminhado à Câmara de Vereadores. “O Distrito Sede foi desmembrado em Centro e Continente, sendo que o Centro foi subdividido em cinco e o Continente em quatro. Ou seja, teremos 60 oficinas de trabalho. A idéia é realizar todo este processo até setembro, o conograma é apertado”, assinala Ildo Rosa.
Depois da aprovação do projeto na Câmara, a proposta é que o Núcleo Gestor se transforme no Conselho da Cidade com poderes deliberativos quanto as modificações no Plano Diretor. “A cidade está em constante mudança, e futuramente o PDP terá que se adequar a novas realidades. Nada mais justo que as alterações sejam feitas de forma participativa, conforme o interesse coletivo”, defende Ildo.
Câmara de Vereadores não participa do debate
Dentro do processo de elaboração do Plano Diretor Participativo um aspecto que vem gerando críticas por parte dos integrantes do Núcleo Gestor é a ausência dos vereadores nas discussões. Recentemente, o núcleo chegou a divulgar uma nota falando em omissão do Poder Legislativo. Para o presidente da Ufeco, Modesto Azevedo, o grupo continua insistindo na participação dos vereadores. “Se a Câmara como instituição entender que este não é o momento, os vereadores como cidadãos deveriam estar envolvidos na discussão do futuro da cidade”, afirma. Segundo o presidente da Câmara, Ptolomeu Bittencourt Junior (DEM), os vereadores foram convidados individualmente e não foi tomada qualquer decisão conjunta quanto a participação ou não dos debates.
Azevedo diz que o Núcleo Gestor também vem insistindo para que a Câmara decrete moratória das alterações de zoneamento e aprovação de grandes empreendimentos durante o período de elaboração do PDP. “Não se pode planejar enquanto a cidade está em constante modificação”. Querem ainda firmar um pacto com o Legislativo para que o Plano Diretor seja aprovado da forma como foi concebido, sem emendas.
Interesses antagônicos na mesa
Um aspecto considerado importante do Plano Diretor Participativo é colocar lado a lado grupos que muitas vezes ficaram em posições opostas, como poder público e movimentos sociais, empresários e ambientalistas. Os representantes dos movimentos sociais e das entidades empresariais avaliam positivamente a experiência até agora. Segundo o presidente da União Florianopolitana de Entidades Comunitárias (Ufeco), Modesto Azevedo, o processo começou atrasado, mas está avançando. Para ele, a prioridade no momento é garantir infra-estrutura para os núcleos distritais. O presidente do Ipuf afirma que já foram comprados os computadores para os núcleos.
A idéia é instalar uma estrutura em cada distrito (com computador, telefone, documentos e mapas) para que a comunidade tenha condições de trabalho. “Os núcleos distritais serão mantidos após a elaboração do plano para funcionarem como uma referência para aquela população”, completa Ildo Rosa. Já o representante do Sinduscon, Hélio Bairros, considera que, por ser um processo novo, está seguindo bem, mas poderia avançar em alguns pontos como o macrozoneamento. “Acreditamos que este diálogo que não existia precisa de um tempo para se consolidar”, assinala.
Um ponto que Azevedo considera fundamental é a preservação do meio ambiente, uma vez que a dimensão geográfica da Capital, que concentra grande parte na Ilha, apresenta uma grande sensibilidade do ponto de vista sustentável. Outra questão é a regulamentação fundiária. “Não dá para planejar uma cidade, quando se tem duas realidades, a cidade legal no mapa e outra clandestina”. O presidente da Ufeco aponta as Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS) como ferramenta importante, mas destaca a necessidade de se planejar quais áreas serão reservadas com este fim de forma a percorrer toda a cidade, evitando a criação de guetos. Azevedo aponta o planejamento da mobilidade urbana como outra prioridade. “Vivemos hoje um momento em que se discute aumento de tarifa, o direito de ir e vir, mas é preciso debater um projeto mais amplo, que garanta a inclusão do cidadão no contexto da cidade”, completa.
O representante do Sinduscon cita como um as-pecto fundamental estabelecer aonde es-tão as áreas de preservação do município, para que seja devidamente delimitado o que são dunas, mangue e restinga. Ainda neste aspecto, Hélio Bairros defende a necessidade de se definir o órgão competente para o licenciamento ambiental e fiscalização. “Este é um gargalo, a sobreposição de competências. Precisamos de um poder público despolitizado e desburocratizado, que se torne eficiente, oferecendo serviço rápido e de qualidade. Para que a pessoa que tenha um projeto aprovado, não só empreendimento turístico ou da construção civil, possa fazer com segurança, sem que inicie a obra e esta seja embargada”, destaca. Bairros considera que esta é a oportunidade de Florianópolis se reencontrar com suas vocações turísticas, gastronômicas e náuticas.
(Natália Viana, A Notícia, 04/06/2007)
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