Artigo de Ricardo Neves – consultor de empresas e escritor (Portal do Meio Ambiente, 14/04/08)
Levamos um século para atingir 1 bilhão de veículos rodando no planeta. Agora, até o fim da próxima década, deveremos ter um segundo bilhão. O que isso significa? Os congestionamentos endêmicos e caóticos de cidades como São Paulo vão piorar. A maior metrópole do país é hoje uma amostra do que aguarda todas as grandes cidades brasileiras. E não adianta colocar a culpa em governos e políticos. Não acredito na capacidade de qualquer prefeito de ser bem-sucedido ao atacar essa questão de cima para baixo.
O grande vilão é nosso estilo de vida. Ficamos viciados no uso do carro. Se nós não mudarmos, os governos só vão oferecer paliativos, tais como rodízios, viadutos, túneis, pontes e pedágios. No máximo, alguma boa administração municipal poderá oferecer modestos progressos no transporte público. Mas eles serão incapazes de produzir um ponto de inflexão no caminho para o próximo congestionamento. Seria mais racional e produtivo mostrar que precisamos reformar nossa mentalidade em termos de mobilidade individual. Carro na rua é o problema. Isso é o ponto de partida. E o mais difícil de fazer: mostrar às pessoas que elas são vítimas e algozes. Como começar essa mudança radical?
Para aqueles que têm sua qualidade de vida e mobilidade desarranjadas pelo permanente congestionamento nas ruas, sugiro uma dieta light, que deve seguir quatro ações:
1. comece por fazer um checkup de sua mobilidade pessoal no dia-a-dia. Faça uma planilha. As linhas descrevem cada viagem de carro que você faz de segunda a domingo e as colunas listam os seguintes aspectos de cada viagem: dia da semana, identificação da viagem (casa–trabalho, ir à faculdade, levar criança à escola), quilômetros percorridos, tempo gasto, condições de tráfego (crítica, média, boa) e uma coluna identificando o número de pessoas que vão com você. Deixe uma coluna livre que será preenchida no próximo passo. (Em meu blog você vai encontrar um modelo, pronto para baixar da internet.)
2. preencha aquela coluna que ficou livre na planilha considerando uma alternativa para realizar cada viagem, identificada em cada linha, de forma mais eficiente. Tente evitar o carro próprio usando táxi, carona ou transporte público (trem, metrô, ônibus). Também considere bicicleta ou até mesmo a pé. Você pode escolher a forma de substituir o carro levando em conta seu ponto de vista pessoal acerca de tempo, custo e conveniência. O importante é tirar seu carro da rua o maior tempo possível;
3. considere a possibilidade de remanejar cada viagem feita em condições críticas de tráfego para outros horários menos congestionados;
4. analise a possibilidade de substituir viagens e todo deslocamento físico não previsto por mobilidade digital. Explore as possibilidades de realizar serviços e compras usando a internet e o telefone.
Se sua vida é devastada pelo congestionamento, então é preciso partir para a ação mais radical: mude para um local mais central e próximo de suas atividades cotidianas. Fuja de condomínios fechados em locais distantes. Vá para os núcleos urbanos onde existem residências, comércios, escolas, escritórios e serviços em geral. Busque pólos bem servidos por transporte coletivo, principalmente estações de metrô.
Temos de envolver amigos e colegas. É como se formássemos vários grupos de auto-ajuda. Que tal criar uma comunidade no escritório ou na faculdade, por meio do Orkut? Você pode fazer um campeonato para ver quem consegue maiores ganhos de tempo, com menos horas perdidas no tráfego. Essa idéia pode ser espalhada como um vírus benigno que torna as pessoas menos dependentes do uso do carro. Afinal, todos fazemos parte do problema e da solução.