O prefeito de Florianópolis, Topázio Neto (PSD), assina às 13h30 desta segunda-feira (4) o projeto de internação involuntária para pessoas em situação de rua com dependência química. A sanção ocorre após aval do legislativo.
Além das pessoas em situação de rua, poderão ser internadas portadores de transtornos mentais que estejam colocando em risco a própria vida ou a de terceiros.
As pessoas internadas precisão ter orientação médica para a internação e serão acolhidas pela Secretaria de Saúde de Florianópolis, desintoxicadas e encaminhadas para um serviço de saúde mental.
De acordo com a prefeitura, Florianópolis possui em média 900 pessoas vivendo em situação de vulnerabilidade social, sendo que apenas metade aceitam o acolhimento em equipamentos da prefeitura.
O que diz a lei de internação involuntária
A lei prevê oferecer cuidados médicos e apoio multidisciplinar às pessoas em situação de rua, especialmente aquelas afetadas pela dependência química ou transtornos mentais. O objetivo é ajudá-las a se recuperarem completamente e se reintegrarem à sociedade e à família.
O texto declara que o sucesso da iniciativa depende do compromisso da saúde pública do Município e, em particular, da Secretaria de Assistência Social. A colaboração é essencial para uma implementação eficaz, em linha com os princípios do SUAS (Sistema Único de Assistência Social) e do SUS (Sistema Único de Saúde).
Para onde as pessoas serão encaminhadas?
A Prefeitura de Florianópolis justificou que não faria a divulgação para garantir a segurança dos pacientes.
A quem se destina a lei?
O projeto de lei se aplica a todos os cidadãos em situação de rua em Florianópolis que se enquadrem em algumas condições específicas, como dependência química, vulnerabilidade social ou incapacidade de tomar decisões devido a transtornos mentais.
Questionada, a prefeitura respondeu que quem vai definir os critérios anteriores serão os próprios médicos do município.
“A internação deve ser autorizada por um médico registrado no Conselho Regional de Medicina. Nos casos de internação involuntária, deve-se comunicar ao Ministério Público e a Defensoria Pública dentro de 72 horas”, descreve o projeto de lei.
Qual a definição de internação para a prefeitura?
Para a prefeitura, a internação humanizada é aquela realizada com humanidade e respeito, visando beneficiar a saúde do paciente e promover sua recuperação e reintegração social, podendo ser realizada com ou sem o consentimento da pessoa.
Durante a internação, os pacientes serão atendidos por uma equipe multiprofissional, respeitando suas particularidades e necessidades individuais. O tratamento inclui aspectos psicossociais, físicos, nutricionais, integrativos e intelectuais.
A Prefeitura de Florianópolis deve oferecer atendimento intersetorial durante o período de internação, mediado pelas Secretarias Municipais de Saúde, Assistência Social e Educação, visando preparar o paciente para a reintegração na sociedade, mercado de trabalho e convívio familiar.
Para os pacientes que se recuperarem e voltarem ao convívio social, a municipalidade poderá oferecer o benefício de desacolhimento por tempo determinado, vinculado exclusivamente ao paciente.
O Município também será responsável por desenvolver programas profissionalizantes para inserir os indivíduos reabilitados no mercado de trabalho.
As despesas da internação involuntária em Florianópolis
As despesas resultantes da execução serão cobertas pelo orçamento do Município, com autorização para remanejamento ou suplementação pelo Poder Executivo Municipal, que também é responsável por regulamentar a Lei conforme necessário.
Quanto ao transporte, os pacientes serão acolhidos, identificados e recolhidos por uma equipe multiprofissional, conforme informado pela Prefeitura.
Em relação ao custo final para a implantação do projeto, a Prefeitura de Florianópolis afirmou não ter essa resposta, pois depende da aprovação do projeto.
Lei Antimanicomial
Pressionado pelo Movimento da Luta Antimanicomial e inspirado na experiência italiana, o Brasil editou a Lei nº 10.216, de 6 de abril de 2001, mais conhecida como Lei Antimanicomial ou Lei da Reforma Psiquiátrica.
Uma das diretrizes é a reformulação das políticas de atenção à saúde mental mediante a transferência do foco do tratamento, que antes se concentrava na instituição hospitalar, para uma rede de atenção psicossocial estruturada em unidades de serviços comunitários e abertos.
Desde 2001, todo e qualquer atendimento em saúde mental deve necessariamente obedecer à Lei Antimanicomial, estatuto que traz profunda mudança paradigmática e que resgata a pessoa com transtorno mental como sujeito de direitos.
A Lei 10.216 também fez do lema do Movimento Antimanicomial um princípio normativo orientador de toda a política de atenção à saúde mental no Brasil.
No entanto, a internação psiquiátrica é também um dispositivo previsto nesta mesma Lei como um recurso terapêutico lícito, embora seja de caráter excepcional. Ainda de acordo com a legislação, a internação deve acontecer preferencialmente de forma voluntária.
Segundo o Ministério Público do Rio de Janeiro, a utilização da internação para tratamento da dependência química ou do uso abusivo de drogas sofreu alterações significativas com a modificação na Lei de Drogas em 2019, por meio da Lei nº 13.840, de 5 de junho daquele ano.
Algumas das principais alterações contempladas com essas mudanças na lei incluem a necessidade de ordenar o tratamento em uma rede de atenção à saúde, com preferência para modalidades ambulatoriais, e a definição de dois tipos de internação: voluntária e involuntária.
A internação compulsória foi deliberadamente excluída como opção legal para o tratamento de usuários ou dependentes químicos.
É importante destacar que a internação involuntária só pode ser realizada em unidades de saúde ou hospitais gerais, com equipes multidisciplinares, e deve ser autorizada por médico registrado no Conselho Regional de Medicina.
Além disso, foi estabelecido um prazo máximo de 90 dias para essa modalidade de internação, sem possibilidade de prorrogação.
Defensorias são contra projeto da prefeitura
As defensorias públicas da União (DPU) e a de Santa Catarina recomendaram em 9 de fevereiro a suspensão do projeto de lei, com base na reforma psiquiátrica existente desde 2001, que adota a internação involuntária como medida excepcional. Na ocasião, a prefeitura disse que analisava a recomendação.
Segundo as defensorias, as medidas propostas pela Prefeitura de Florianópolis violam a legislação federal por instituir internações sem esgotar os recursos extra-hospitalares e sem oferecer tratamento integral ambulatorial em meio aberto.
As defensorias ainda explicam que é necessário capacitar os profissionais de saúde para lidar com as especificidades dessa população e promover a integração entre os serviços de saúde e assistência social. A ausência de diálogo e cooperação entre esses sistemas prejudica o atendimento integral à população de rua.
(ND, 04/03/2024)
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