As entidades empresarias e representatividades da Capital catarinense se manifestaram contrárias ao pedido de suspensão da tramitação do projeto de revisão do Plano Diretor de Florianópolis recomendada pelo MPF (Ministério Público Federal). A medida foi considerada pelo setor como “descabida”, “indevida” e uma “desrespeitosa interferência” no processo democrático.
O documento foi encaminhado à Câmara de Vereadores de Florianópolis pela procuradora da República Analúcia Hartmann, baseado em inquérito civil aberto para tratar das mudanças propostas e da “interferência em bens da União (ambientes de restinga e manguezal) e em unidades de conservação federais” no Plano Diretor.
Para o coordenador do movimento Floripa Sustentável – que reúne 45 entidades, Gérson Schmitt, o Poder Judiciário catarinense e o Ministério Público do Estado, que acompanham o processo de revisão, têm respeitado a autonomia da Capital, impedindo a judicialização tática e ideológica da revisão. Por outro lado, não poupou críticas à medida adotada pelo MPF.
“Não podemos deixar de registrar a nossa desaprovação à sistemática utilização por raros membros do MPF, que não se dignam ao diálogo com a cidade, mas que reincidem em indevidas e desrespeitosas interferências judiciais federais na vida democrática da Capital”, protestou.
O presidente da Acif (Associação Empresarial de Florianópolis), Rodrigo Rossoni, considerou o pedido como fora de propósito. Ele diz entender que Câmara dos Vereadores não precisa acolher a recomendação do MPF, até porque já tem uma decisão liminar que homologa o trâmite da revisão do Plano Diretor.
“Acredito que a Câmara de Vereadores vai continuar o processo de maneira legítima, sem nenhuma interferência do Ministério Público. Muito estranho o MPF, nesse momento, querer se manifestar. Teve cinco anos para fazer isso”, reclamou.
Rossoni sustentou ainda que a cidade precisa muito da revisão do Plano Diretor que está desatualizado – o último é de 2014, e criou uma série de inseguranças jurídicas.
“Temos essa oportunidade e a Câmara de Vereadores pode ser protagonista e entregar esse legado. E não é a interferência do Ministério Público, descabida nesse momento, que deve atrapalhar”, destacou.
“Na verdade, é uma recomendação que surpreende pelo momento em que foi apresentada. Depois de toda a discussão com a sociedade, sem qualquer interesse de nenhum órgão federal ambiental, vem essa recomendação querendo se sobrepor ao direito constitucional da autonomia de gestão que o município tem sobre seu território. Para nós essa forma de agir é, no mínimo, estranha”, afirmou Jaime de Souza, presidente da entidade civil FloripAmanhã.
Não há como suspender discussão, defende prefeitura
Procurada, a Prefeitura de Florianópolis informou que a recomendação é para Câmara de Vereadores, e não envolve a administração municipal. Porém, avisa que o município tem um conceito claro sobre o assunto, até porque o STJ (Superior Tribunal de Justiça) já entendeu que o MPF não tem competência jurídica para discutir Plano Diretor da cidade.
Diante disso, a prefeitura diz entender que não há como suspender a tramitação do Plano Diretor, que já tem mais de um ano.
Na recomendação, a procuradora cita “alterações no zoneamento que podem acarretar riscos e impactos ambientais” para a Estação Ecológica de Carijós, na região do bairro de Santo Antônio de Lisboa, Norte da Ilha, e para a Reserva Extrativista Marinha do Pirajubaé, área de manguezal no Sul da Capital.
A procuradora defende também que a suspensão da tramitação é necessária para melhor análise técnica do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade). Ela fixou prazo de cinco dias para o Legislativo acatar as recomendações.
Órgãos já haviam se manifestado
A vereadora Manu Vieira (Novo) reforçou que é uma recomendação, portanto cabe a Câmara entender se acata ou não. Inclusive, segundo ela, o Legislativo já acatou sugestões, parcialmente, dentro do trâmite do processo na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) quando foram solicitadas manifestações de órgãos ambientais como a Floram (Fundação Municipal do Meio Ambiente) e ICMBio.
“Ao MPF cabe se manifestar sobre as partes da União Federal. Aliás, a alegação do Ministério Público de Santa Catarina foi que estava tudo bem com o trâmite. Nós entendemos que é possível continuar com a tramitação da revisão”, afirmou a vereadora.
A parlamentar disse que sua equipe jurídica buscou acesso à integralidade da recomendação, na tentativa de se manifestar sobre o assunto, porém foi informada que o processo está em sigilo.
“A gente não sabe, na verdade, totalmente do teor do inquérito que existe. Só a recomendação com a justificativa. Ficamos preocupados porque o inquérito circula em esfera civil, criminal, administrativa, então nós temos que construir uma defesa robusta. Acho que a Câmara precisa estar amparada”, declarou.
O presidente da Câmara de Vereadores de Florianópolis, João Cobalchini (União), afirmou que seja qual for a decisão, ela deve ser tomada com responsabilidade.
“Em que pese ainda não termos sido intimados pessoalmente ou via Câmara, já solicitei pareceres técnicos e convocarei a mesa diretora para deliberação do caminho a ser tomado. O mérito indiscutivelmente é importante, mas não podemos deixar de observar a forma expressa nos diplomas legislativos municipais”, pontuou.
Revisão do Plano Diretor
O texto do projeto de lei foi construído após 14 audiências públicas que ouviram moradores de todos os distritos da Capital ao longo dos meses de junho, julho e agosto do ano passado.
Durante dois meses, a prefeitura também colheu considerações da população por meio de consulta pública, que recebeu 1.480 manifestações de moradores e representantes das comunidades, representando outra ferramenta essencial para a estruturação do texto.
No último dia 13, a Câmara de Vereadores realizou a última audiência pública da revisão do Plano Diretor, das cinco previstas pelo Legislativo. A reunião foi encerrada antes do esperado, por conta de manifestações contrárias ao projeto enviado pelo Executivo.
Agora o Plano Diretor segue à CCJ, ao Ipuf (Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis) e também ao Conselho da Cidade, para análise das emendas apresentadas pelas comissões.
(ND, 21/03/2023)
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