Do contra
07/01/2022
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07/01/2022

Artigo de Antonio Marius Zuccarelli Bagnati
Coordenador do COMDES – Conselho Metropolitano para o Desenvolvimento da Grande Florianópolis e Conselheiro da FloripaManhã.

É provável que nunca teríamos ouvido falar de TUVALU, não fossem as imagens de seu Ministro das Relações Exteriores, de terno e gravata e com água na altura dos joelhos, gravando um pronunciamento para a COP26.

O aquecimento global tem sido comprovado por cientistas através da análise em amostras de gelo, sedimentos em lagos e anéis em troncos de árvores centenárias, nos dizendo que, desde a revolução industrial, houve mudanças na química da atmosfera e aumento de 1,1ºC na temperatura da terra.

O exemplo do Ministro é emblemático e inquestionável. Este pequeno estado insular, constituído por nove ilhas e localizado no Oceano Pacífico, entre a Austrália e o Havaí, sofre as consequências de um modelo de progresso e desenvolvimento baseados no uso crescente de recursos naturais não renováveis e de processos industriais altamente poluentes. O degelo das calotas polares é um resultado visível do processo de degradação ambiental provocado por esse modelo. 

1,5ºC este é o limite de acréscimo na temperatura definido pelos cientistas para que não ultrapassemos o “ponto de não retorno” ou de uma catástrofe climática. Este texto tem o objetivo de abordar uma das contribuições para minimizar este fenômeno que, embora não muito significativa neste contexto, está ao alcance de todos nós, com uma simples mudança de comportamento. Trata- se de nossa relação de consumo e de corresponsabilidade com os resíduos que produzimos. 

No Brasil, anualmente, são emitidas 96 milhões de toneladas de CO2eq. nos processos de gestão dos resíduos, aí incluídos os serviços de coleta, transporte, operação de lixões, aterros controlados e aterros sanitários.

O relatório anual da ABRELP (Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública) de 2020 registra uma pequena melhora no percentual da destinação adequada dos resíduos sólidos produzidos no país. Entretanto, em números reais, houve um acréscimo de 4 milhões de toneladas no volume descartado de forma inadequada no período de dez anos – 25,4 milhões de toneladas em 2010 contra 29,4 milhões em 2019.

Ou seja, não evoluímos e continuamos priorizando a disposição dos resíduos no solo, mesmo com a determinação da Política Nacional de Resíduos Sólidos de que somente os  materiais que não pudessem ser reaproveitados ou reintroduzidos na cadeia produtiva, teriam esse destino.

O custo desta prática é o comprometimento dos solos, dos recursos hídricos e, particularmente da saúde das pessoas. A destinação inadequada dos resíduos sólidos, no Brasil, impacta negativamente em 77,65 milhões de pessoas, que são afetadas por dengue, leishmaniose, leptospirose e esquistossomose, entre outras doenças, acarretando gastos de US $ 1 bilhão/ano para o sistema de saúde pública, segundo a ABRELP.

Das 79,6 milhões de toneladas de resíduos gerados no Brasil em 2020, somente 2,1% foram recicladas e recuperados, segundo dados do SNIS (Serviço Nacional de Informações sobre Saneamento), percentual que permanece estável há três anos.

A Logística Reversa prevista na PNRS ainda é incipiente para materiais como eletroeletrônicos, pilhas, baterias e embalagens em geral. Somente itens para os quais já haviam Resoluções do CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente) com a obrigatoriedade de coleta diferenciada, antes do Plano Nacional de Resíduos Sólidos, apresentam resultados consistentes, com destaque para pneus inservíveis e embalagens de agrotóxicos e óleos lubrificantes. Neste sentido, é elogiável o trabalho de coleta que vem sendo desenvolvido pelo IMA (Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina) com o Programa Penso, Logo Destino, evitando que estes materiais sejam enviados aos aterros sanitários ou descartados irregularmente.

O arcabouço jurídico da legislação brasileira em relação aos resíduos, estabeleceu diretrizes e critérios para uma mudança deste quadro. É preciso, portanto, que os resíduos sólidos urbanos passem a ser entendidos, pela sociedade e gestores públicos, como um recurso renovável e de grande valor econômico, social e ambiental.

Somente 14% do total dos resíduos produzidos no Brasil, em média, é   constituído por rejeitos. Este, portanto, deveria ser o percentual encaminhado aos aterros sanitários. Outros itens como os plásticos, que representam 16,8% e os orgânicos com 45% do total de resíduos, deveriam ser separados na fonte, melhorando a sua qualidade e revalorizados através de processos mecânicos e biológicos. 

Santa Catarina deveria ser destaque nacional na geração de energias renováveis. Os rejeitos da agroindústria, grandes fontes de gorduras e proteínas, associados à fração orgânica dos resíduos municipais, deveriam ser processados em biodigestores, gerando energia elétrica, calor, combustível veicular e tendo ainda, como subproduto uma massa digerida para a produção de adubos orgânicos e organominerais, que melhorariam a estrutura dos solos, a capacidade de retenção de água, o desenvolvimento de microrganismos, incorporando nutrientes e proporcionando maior produtividade no campo, dispensando componentes químicos.

O novo Marco Legal do Saneamento sancionado em julho de 2020 veio resolver um dos graves problemas das administrações municipais pois, dos 5.525 municípios brasileiros, cerca de 4.000 não possuem cobrança pelos serviços de manejo dos resíduos sólidos. E não tendo recursos, não possuem capacidade financeira de manter um aterro sanitário e, nem mesmo, arcar com os serviços de transporte para o aterro de uma cidade vizinha. A consequência, via de regra, é o depósito em áreas devolutas, barrancas de rio, queima etc. com as consequências danosas para o meio ambiente e a saúde pública, como já mencionado acima. O Marco Regulatório estabeleceu o respaldo legal para que os gestores municipais possam buscar o equilíbrio econômico-financeiros dos serviços de limpeza pública, alcançando a sua universalização. Estabeleceu ainda prazos para esta adequação: julho de 2021 para Capitais e Regiões Metropolitanas e 2024 para municípios com até 50.000 habitantes. A não aplicação de uma modalidade de cobrança por taxa ou tarifa no prazo de 12 meses, contados a partir da vigência da Lei, irá configurar renúncia de receita por parte do administrador, passível de multa e as cominações legais.

Abre-se, portanto, uma nova oportunidade para que a nossa sociedade se adeque aos clamores globais de preocupação com as mudanças climáticas. Como cidadãos, buscando um consumo consciente, a separação dos resíduos na fonte, promovendo o reaproveitamento ou reuso dos materiais e encaminhando o que precisa ser descartado para o sistema público de coleta seletiva. O poder público, por outro lado, aumentando as dotações orçamentárias da área de saneamento, de forma que possibilitem a implantação de tecnologias para a revalorização dos resíduos. 

Repensar o atual paradigma de progresso e desenvolvimento, nossos hábitos de consumo e a relação com os resíduos que produzimos é um dever de todos nós, particularmente neste período de pós pandemia, em que tivemos tempo para parar, refletir e nos reposicionar perante o mundo que nos cerca. Pautar nossa sociedade no desenvolvimento sustentável, na economia verde e na definição de novas metas ambientais e climáticas poderá evitar que tenhamos, num futuro próximo, que dar entrevistas com água na altura dos joelhos, como o fez o Ministro das Relações Exteriores de Tuvalu. 

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