Artigo de Joaquim Nóbrega Jr
Consultor em planejamento e gerenciamento de projetos, associado da FloripAmanhã
A empresa americana Culdesac está construindo o primeiro bairro sem carros dos Estados Unidos, em Tempe, no Arizona, que será inaugurado no outono de 2020. Foi planejada para mil residentes e custará US$ 140 milhões.
O bairro é para uso misto, residência e trabalho, e os residentes não terão carros particulares nem garagens. Haverá vagas no perímetro para parentes e visitantes e para veículos de emergência e serviços. Haverá uma linha de veículo leve sobre trilhos para ligação com o centro da cidade, aeroporto e a universidade estadual.
A ideia da Culdesac é mudar a concepção de cidades que foram construídas com base na cultura dos carros, onde cada pessoa precisa ter um carro e o utiliza para todo deslocamento interno. Isto cria a necessidade de até 50% do espaço urbano para estacionamentos, como no caso do centro de Houston, no Texas. São espaços pavimentados, geradores de calor no verão e impermeáveis, que ocupam espaço que poderiam ser utilizados para áreas verdes, de lazer e cultura. A maioria dos carros tem um tempo de utilização muito baixo, ficando parados a maior parte do dia e durante toda a noite.
A iniciativa foi um acordo entre a Prefeitura local e investidores. Estes investidores já foram procurados por interessados em conhecer o projeto.
A ideia partiu da constatação de que “como nos locomovemos determina como vivemos” e que a forma como nos locomovemos está mudando.
A posse de carros particulares está começando a dar lugar para carros alugados por demanda, compartilhados e ambientalmente sustentáveis. Os percursos de até uma milha estão sendo feitos por bicicletas, patinetes, motonetas, alugadas e/ou elétricas, ou a pé.
Os jovens estão começando a se desinteressar de ter um carro, mesmo nos EUA, onde esta cultura é muito forte.
A inspiração para o projeto foi o bairro de Friburgo, na Alemanha, e outras áreas em Oslo, Barcelona e Copenhagen.
Aqui em Santa Catarina temos alguns exemplos de bairros ou áreas planejadas com resultados diferentes mas todos com alguns problemas.
O bairro Pedra Branca, em Palhoça, foi construído a partir de uma universidade e se expandiu para constituir um bairro de utilização mista, para residências, trabalho e serviços. No entanto, visitantes tem dificuldades de estacionar porque muitos habitantes ainda não se desapegaram dos seus carros. Além disto, o acesso à BR-101 e ao centro de Florianópolis é muito precário e não há um sistema público rápido e eficiente.
Em Florianópolis, no norte da ilha, há o bairro planejado de Jurerê Internacional, que é praticamente exclusivo para residências unifamiliares de alto padrão. A falta de trabalho, pelo impedimento de construção de prédios de escritórios faz com que a maioria dos residentes tenha que ir ao centro, distante cerca de 25km, por uma única via, que é a SC-402/SC-401, cujo tráfego está ficando saturado e sujeito a enormes congestionamentos, principalmente na temporada de verão.
Em área próxima, o empreendimento Sapiens Park, de iniciativa pública, é para utilização somente de edificações para serviços de pesquisa e desenvolvimento, sem a opção de abrigar áreas residenciais. Isto gera tráfego para os funcionários que moram em áreas vizinhas ou bairros mais distantes. Outro problema é o Centro de Eventos, na mesma área, que finalmente deverá ser concedido à iniciativa privada, já que hoje é um elefante branco subutilizado.
Estes fatos demonstram o que já é amplamente reconhecido, que planejamento urbano está diretamente ligado a mobilidade, as soluções necessitam da parceria com a iniciativa privada, e que a priorização de transporte público de qualidade é essencial.
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