Da Coluna de Carlos Damião (ND, 11/08/2018)
Nem todo prédio abandonado é patrimônio histórico. E nem todo patrimônio histórico está abandonado em Florianópolis. No segundo caso sobram exemplos positivos, de boa conservação por parte de proprietários privados ou do poder público. A Rua Conselheiro Mafra quase inteira e um exemplo bem destacado desde a administração da prefeita Angela Amin (1997-2005), que criou mecanismos legais para estimular os donos dos imóveis a investirem na preservação das edificações, quase todas construídas no século 19.
Também os casarões oitocentistas da Praça 15 de Novembro servem de parâmetro para a questão, assim como o casario de Santo Antônio de Lisboa e do Ribeirão da Ilha, igrejas em geral, tanto no Centro, quanto nas comunidades do interior. Há ainda o conjunto arquitetônico do Imperial Hospital de Caridade, mantido pela Irmandade do Senhor dos Passos, o Palácio Cruz e Sousa, o Mercado Público.
Nem todos os proprietários, no entanto, têm interesse (ou recursos, às vezes) para garantir a integridade e a beleza de seus imóveis tombados. Isso que o próprio poder público dá mau exemplo, como no caso da antiga Escola Antonieta de Barros, abandonada e depredada nos últimos 10 anos. E da antiga Casa de Câmara e Cadeia, construção do século 18 que, a muito custo, está com as obras de restauração em fase final. Vai abrigar o Museu da Cidade, a ser administrado pelo SESC, entidade privada que tem expertise em gestão cultural e histórica.
Sem esquecer o estado vergonhoso do Largo da Alfândega Prefeito Dakir Polidoro, incluindo o próprio prédio da Alfândega, do século 19. Neste caso, e aí está a boa notícia da semana, o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) está trazendo verba federal para viabilizar a revitalização em parceria com a prefeitura da Capital. O projeto é muito bonito e se arrastou nas engrenagens da burocracia nos últimos anos.
Descaso na Agronômica
No programa de identificação e vistoria de imóveis abandonados na Capital, o Ministério Público de Santa Catarina marcou presença no dia 7 de agosto, com o promotor Daniel Paladino e equipe, na antiga residência do governador Vidal Ramos, no bairro Agronômica, que apresenta graves sinais de deterioração e risco à segurança de quem passa pelo local. Conforme Paladino o próximo passo será recomendar à Prefeitura de Florianópolis que “adote medidas urgentes visando à limpeza e à proteção do imóvel, bem como imponha ao proprietário a obrigação de restaurar a originalidade daquele patrimônio histórico, sob a supervisão do poder público, sem prejuízo da aplicação das sanções administrativas em face do estado de abandono e degradação a que foi submetido ao longo dos anos”.
O caso é bem ilustrativo. É um abandono que tem mais de duas décadas e não pode ser creditado aos descendentes de Vidal, como insinuaram alguns críticos, porque o imóvel passou pelo controle de outros proprietários, até chegar a um empresário. O casarão foi cedido, por exemplo, para instalação do comitê de Ulysses Guimarães (PMDB), quando este disputou a eleição presidencial em 1989. No ano seguinte (1990), abrigou o comitê central de Paulo Afonso Vieira, candidato derrotado do PMDB ao governo do Estado. O processo de tombamento da edificação, que faz parte do cenário da região desde o início do século 20, quando aquele pedaço de Florianópolis era o bairro Pedra Grande, demorou demais a ser concluído pelo setor de patrimônio histórico da prefeitura: o decreto só foi assinado pelo prefeito Cesar Souza Júnior (PSD) em 2015. Na coluna Ponto Final, do ND, em 26/9/15, já apontávamos o estado de abandono e depredação, constantemente alertados pela professora e escritora Lélia Nunes, da Academia Catarinense de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina. Nem Cesar Júnior, que ocupou a prefeitura até janeiro de 2017, nem Gean Loureiro, prefeito desde janeiro de 2017, tomaram providências. Quem sabe agora, com a intercessão do MPSC, o belo casarão seja salvo da completa ruína e sua beleza arquitetônica volte a se destacar na paisagem.
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