O mato (iangrë em kaingang) está se acabando, diz o canto, que continua: “Acabou a caça e a abelha já não dá mais o mel”. A narrativa triste rompeu um dos poucos momentos de silêncio naquela roda, quando os mais pequenos se deram conta que o índio real não é tão igual àquele da imagem genérica do caderno de desenhos. No centro da roda, Leandro Inácio, 40 anos, respondia pacientemente um a um os questionamentos das crianças “brancas”: “De onde vem a tinta que vocês usam?”, “Porque vocês são tão bons pescadores?”, perguntavam impressionados durante atividade na tarde desta quinta-feira (19) no pátio do Colégio Guarapuvu.
Até que alguém tocou na ferida. “Como vocês vivem naquele lugar, sem paredes, não parece uma casa de índio”, disse um dos pequenos se referindo ao abrigo improvisado no Tisac (Terminal de Integração do Saco dos Limões), onde atualmente vivem 20 famílias.
Em 1.500, quando os portugueses aportaram por aqui, acredita-se que a população indígena na Amazônia chegava a 8 milhões de indivíduos. Atualmente, quase 900 mil pessoas declaram-se indígenas, em um total de 305 etnias, que falam 274 línguas diferentes, de acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas).
Na Grande Florianópolis, por exemplo, índios da Aldeia Itaty, no Morro dos Cavalos, e da terra indígena Ygua Porã, em Biguaçu, ambos da etnia guarani, ainda não tiveram suas terras homologadas pelo governo federal. No Morro dos Cavalos, cujo processo de demarcação iniciado em 1993 foi concluído em 2008, o próprio governo do Estado foi ao STF (Supremo Tribunal Federal) pedir anulação da demarcação pedindo para tornar sem efeito a portaria 177 do Ministério da Justiça. O caso ainda aguarda julgamento.
Já os índios kaingang alojados no Tisac vivem a incerteza de como serão abrigados no próximo ano. Em setembro de 2017, a Justiça Federal determinou que a Prefeitura de Florianópolis, a Funai (Fundação Nacional do Índio) e o Estado construíssem uma casa de passagem para atender os indígenas durante a vinda deles ao litoral.
Em 20 de novembro, quando muitos indígenas já estavam na Capital, a liminar que obrigava a casa de passagem foi derrubada no TRF4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), revelando mais uma vez o aparente descaso com as questões indígenas. A situação acabou amenizada em 6 de dezembro, após o TRF4 atender a procuradora Analúcia Hartmann e determinar a formação de um grupo de trabalho interinstitucional e a disponibilização de um local adequado para abrigá-los até a construção da casa de passagem.
Prazo para índios deixarem o Tisac termina em maio
Após o TRF4 reformar a decisão e entender a situação de vulnerabilidade dos indígenas diante da inércia dos envolvidos para a construção da casa de passagem, pelo segundo ano consecutivo, os indígenas das tribos xokleng e kaingang acabaram alojados no Tisac, terminal que está desativado desde 2005. Na temporada de verão, cerca de 60 famílias (200 pessoas) chegaram a passar pelo local.
O prazo para os kaingangs deixarem o terminal encerra no dia 30 de maio, mas até o momento não há nenhuma sinalização para construção de uma casa de passagem ou como será a vinda deles na próxima temporada. “O que queremos é um espaço para podermos trabalhar e vender nosso artesanato. Nós só viemos para cá depois de muita luta e muito protesto. Estávamos embaixo de um viaduto, sem nenhuma condição”, conta Leandro Inácio, que representa os indígenas da Aldeia Condá, de Chapecó. Também permanecem no local índios do Rio Grande do Sul e do Paraná.
(Veja Matéria completa em ND, 19/04/2018)
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