Pensar o crescimento ordenado das cidades, onde serão construídas escolas, unidades de saúde, viadutos e elevados, parece uma tarefa ainda muito distante da realidade de quase metade das administrações municipais catarinenses. Mesmo que os governos continuem executando esse tipo de obra, na grande maioria dos casos, não há nenhum tipo de planejamento urbano que pense impactos, demandas e real necessidade desses equipamentos públicos. O assunto foi um dos temas do 9º Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico, realizado entre 4 e 6 de outubro em Florianópolis. O evento reuniu palestrantes de diversas partes do país com olhar voltado para a efetivação do direito à cidade, tratando de questões técnicas como plano diretor, política fundiária, planejamento urbano entre outros.
Para se ter uma ideia, dos 295 municípios catarinense, 139 não possuem planos diretores, ou não possuem planos a atualizados. Em abril deste ano, o MPTC (Ministério Público do Tribunal de Contas) notificou as prefeituras alertando sobre as exigências do Estatuto das Cidades. “Neste primeiro momento fizemos a notificação. Em um segundo momento, quando começarem a vir as respostas, vamos analisar também a qualidade desses planos. Não queremos que os municípios façam planos diretores para cumprirem somente a legislação, mas que esses planos realmente sirvam ao planejamento urbano das cidades”, afirmou a procuradora de contas Cibelly Farias Caleffi.
Segundo Cibelly, a cobrança aos municípios não têm como objetivo penalizar prefeituras e seus gestores, no entanto, após análise das respostas e vencidas todas as tentativas junto aos municípios, o Tribunal deverá passar a considerar a não apresentação dos planejamentos nas prestações de contas das prefeituras, podendo os gestores que não cumprirem as recomendações terem suas contas rejeitadas. “O plano diretor parte do planejamento da cidade e precisa estar previsto nos orçamentos municipais. A ausência do plano poderá sim servir como fator para rejeição de contas”, emendou a procuradora.
A falta de planejamento urbano como fator de corrupção
Atos aparentemente de menor relevância nas administrações públicas e casas legislativas, como alterações de zoneamento ou aprovações de ruas sem consultas técnicas, em alguns casos podem facilmente servirem de instrumentos para o que a procuradora do Município de Porto Alegre, Vanêsca Buzelato Prestes, definiu como Corrupção Urbanística. Uma das principais convidadas do 9ª Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico, Vanêsca apresentou as linhas gerais de sua tese de doutorado, defendida na Università Del Salento, na Itália, onde investigou os mecanismos e as formas que caracterizam as formas de corrupção no urbanismo das cidades, sob o título “Corrupção Urbanística: da ausência de diferenciação entre direito e política no Brasil”, analisa casos concretos no Brasil.
“É uma forma de corrupção que não se vê, pois ela é feita por meios de financiamentos específicos, de alterações de índices construtivos sem consultas ou laudos técnicos, abrindo uma grande margem para corrupção”, destaca.
Vanêsca apresentou casos concretos no Brasil, como o da construção do túnel Ayrton Senna, em 2014, durante o governo de Paulo Maluf (PP) na cidade de São Paulo. Na época, segundo investigação do Ministério Público, verbas para a construção do túnel foram desviadas para o banco, que devolveu a verba após acordo para não ser processado. “O dinheiro que o banco recebeu era de propina. A partir de tratados internacionais se rastreou o valor e foi devolvido para evitar processos”, disse.
Para a procuradora, a corrupção urbanística tem efeitos sérios no dia a dia das cidades e de toda sua população, mas em muitos casos é vista como normal, pois ocorre de através de descaminhos conhecidos por poucos, inclusive passando por alterações de leis que dá legalidade a situações orquestradas.
(Leia Matéria na íntegra em ND, 13/10/2017)
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