A Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (Casan) foi multada em R$ 660 mil pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) por conta de um vazamento de esgoto in natura ocorrido durante o último verão em Florianópolis. Um relatório elaborado pelo ICMBio, com base em dados fornecidos pela própria Casan, concluiu que a estação de tratamento de Canasvieiras (ETE) foi incapaz de tratar todo o esgoto que recebeu em pelo menos quatro oportunidades entre janeiro e março de 2017. O resultado foi um volume de mais de 33 milhões de litros de efluentes sem tratamento despejados no rio Papaquara, afluente da bacia hidrográfica da Estação Ecológica Carijós, no Norte da Ilha. A área foi criada para proteger o ecossistema (manguezal e restinga) da bacia do rio Ratones.
À multa se soma uma determinação, em caráter liminar, do juiz Marcelo Krás Borges, da 6ª Vara de Florianópolis, para que a companhia implemente um sistema de tratamento adequado na região em até seis meses e que ofereça, em até um ano e meio, um plano de tratamento de esgoto que não contenha o despejo de efluentes no rio. Na decisão, o magistrado aponta que a poluição está afetando o meio ambiente e que há risco para a população.
“Existem provas veementes e inequívocas de que o mau funcionamento da Estação de Canasvieiras está a causar poluição e mortandade de peixes no Rio Papaquara, o que constitui perigo de dano irreparável. Não há como se esperar pela conclusão da prova pericial, sob pena de continuar a mortandade de peixes, trazendo sérios danos para o meio ambiente e, inclusive, para a população de Florianópolis, eis que existe risco de que pessoas desavisadas possam pescar no Rio Papaquara e serem contaminadas”, escreve o juiz, citando uma nova perícia a ser feita na região, que esbarra em uma oposição da Casan ao valor para a contratação do perito.
A quantidade de esgoto que extravasou para o rio Papaquara, de acordo com o documento do ICMBio, seria suficiente para preencher 13 piscinas olímpicas ou 3,3 mil caminhões-pipa. O relatório leva em conta a quantidade de esgoto somada ao volume de chuva e conclui que, em quatro momentos do verão, esse número foi superior à capacidade de tratamento da ETE Canasvieiras, que é de 285 litros por segundo.
“De acordo com as informações prestadas pela Casan, o volume lançado (…) foi de trinta e três milhões noventa e seis mil e seiscentos litros de esgoto bruto (33.096.600 litros)”, diz o laudo, somando os quatro vazamentos.
Morte de peixes foi registrada em fotos
O ICMBio também cobra a Casan sobre uma omissão de informação dos extravasamentos. Segundo os engenheiros do órgão federal, eles encaminharam um pedido de dados em 15 de março sobre problemas nos dias anteriores. A resposta da Casan foi que “a ETE Canasvieiras operou normalmente, sem nenhuma ocorrência que prejudicasse sua eficiência nas datas”.
Mas, ao analisar os boletins diários de operação, os técnicos concluíram que o Plano Emergencial de Operação (PEO), usado para casos em que há anormalidade na estação, foi acionado em duas oportunidades – sendo que em uma delas houve vazamento de esgoto. No mesmo período, foi identificada mortandade de peixes na região registrada em fotos.
“Fica evidente que nos dias que antecederam os fatos apresentados no relatório fotográfico, houve, sim, problemas na operação da ETE, que podem ter influenciado a condição de mortalidade de peixes e a presença de iridescência na água registrada”, diz o estudo.
Anormalidades na água foram constatadas pelo ICMBio dias depois de registro de vazamento
A decisão da 6ª Vara de Florianópolis alcança também a Fatma, que deve concluir ¿o licenciamento ambiental pertinente no prazo assinalado, assegurando a regularidade da atividade¿. Pela assessoria de imprensa, a Fatma informou que vai recorrer da decisão.
A fundação respondeu que “o monitoramento deve ser feito pelo empreendedor, dentro do Plano Básico Ambiental (PBA). A Fatma exige que a Casan envie relatórios semestrais sobre o monitoramento”.
Até a última segunda-feira, a fundação ainda não havia cobrando a Casan sobre os vazamentos no Papaquara. Questionados sobre a denúncia, a assessoria de imprensa da fundação comunicou que a Fatma pedirá uma resposta da Casan, mas não precisou data. Afirmou ainda que o prazo para tomar conhecimento da decisão começou a contar no último dia 7.
Do rio do Braz para o Papaquara
Em janeiro, o ICMBio já havia ampliado uma multa de R$ 1 milhão para R$ 3 milhões contra a Casan por causa do despejo de efluentes no rio Papaquara. A coleção de multas e discussões sobre a omissão de informações são novos episódios da disputa ambiental sobre saneamento no Norte da Ilha, que incluiu a poluição da praia de Canasvieiras no verão de 2016. O caso teve repercussão nacional após imagens mostrarem as águas do rio do Braz poluídas.
Meses depois, a solução encontrada pela Casan foi transferir o despejo de efluente no rio do Braz para o rio Papaquara. A Advocacia-Geral da União e o Ministério Público Federal criticam a decisão. Todas as etapas desse imbróglio estão incluídas na ação civil pública que tramita desde 2014 na Justiça Federal, proposta pelo ICMBio e pelo MPF. A Casan está recorrendo das decisões e não pagou nenhuma das multas.
O que diz a Casan
A Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (Casan) nega que tenha havido vazamento no Rio Paraquara, afirma que já faz o tratamento dos efluentes da ETE Canasvieiras “há 20 anos” e que desde dezembro do ano passado, quando a estação teve sua capacidade de tratamento ampliada, não houve “a necessidade de acionamento de PEO”.
A empresa irá recorrer da decisão no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em Porto Alegre.
(DC, 21/08/2017)
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