No futuro próximo, a ponte Hercílio Luz, em Florianópolis, por decisão do governo de Santa Catarina, será aberta para transporte público, pedestre e ciclista. “Esse é objetivo maior desse projeto que estamos brigando para que aconteça o mais rápido possível”. O apontamento é do superintendente de Desenvolvimento da Região Metropolitana da Grande Florianópolis, Cassio Taniguchi, ex-prefeito de Curitiba e um dos participantes do planejamento e de várias transformações na capital paranaense que a inseriu no conceito de cidade mais humana, inteligente e sustentável.
Taniguchi foi o primeiro dentre os 20 stakeholders convidados a falar no workshop que durará cinco dias, de 10 a 14 de julho, em tempo integral, que tratará aprofundadamente a ponte Hercílio Luz, com a participação de cerca de 60 pessoas, entre academia, governo, iniciativa privada, sociedade civil organizada e o meio empresarial. Uma parte da programação está sendo realizada no auditório da Fecomércio, com debates e visita guiada à ponte e, em dois dias (12 e 13), as atividades dos grupos de trabalho serão no Centro de Informática e Automação de Santa Catarina (Ciasc).
Os participantes foram divididos em sete grupos de trabalho – Economia, Governança, Identidade, Meio Ambiente, Mobilidade, Segurança e Inclusão Social – para analisar e propor soluções para o monumento construído em 1926. Para o professor do Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Gestão do Conhecimento (EGC) da UFSC, e coordenador do evento, Eduardo Moreira da Costa, “a ideia é integrar os vários atores desse processo para trazermos uma proposta positiva para o futuro da ponte e seu entorno, repensarmos o modelo para que este ícone seja ainda mais valorizado, conectando às pessoas. A ponte pode servir como um ponto de encontro de caminhadas, ciclistas, turismo, esporte e entretenimento”.
Segundo o coordenador, diversas cidades mundo afora têm pontes como ícones da história local, a exemplo da ponte Vecchio, em Florença, ou a Charles Bridge, em Praga. Taniguchi reforça o amor dos catarinenses pela Hercílio Luz. Trouxe para a sua apresentação dados da última pesquisa do Instituto Mapa, no início deste ano, em que a ponte, repetidas vezes, é o primeiro símbolo que vem à mente da população, acima de 40%.
O superintendente compartilhou sua experiência com mobilidade em Curitiba no inicio da década de 70, especialmente orientada para pessoas e suas necessidades de morar, trabalhar e se divertir. E para a Grande Florianópolis, que atualmente congrega nove municípios e quase 1 milhão de habitantes, será implantado modelo semelhante, o BRT Metropolitano, com prazos de implementação que variam de 2018 a 2020. O Bus Rapid Transit (BRT) ou Ônibus de Transporte Rápido foi o escolhido dentre VLT (veículo leve sobre trilhos) e Monorail (ou monotrilho) pois mostrou, por meio de diversos estudos, ser mais vantajoso nos quesitos tempo, meio ambiente, investimento e taxa de retorno, não só pela característica operacional, mas sobretudo pela rapidez da embarcação. Atualmente, aproximadamente 140 mil pessoas se deslocam do continente para a ilha todos os dias.
“Será que Florianópolis será uma cidade mais humana, inteligente e sustentável?”, indaga Taniguchi. E para este desafio que é de todos, reforçou a necessidade de que a ponte, fechada há mais de 30 anos, “seja devolvida ao povo”, com o propósito de atender ao transporte público.
A ponte
A primeira ligação entre a ilha e o continente foi inaugurada em 1926, completando 91 anos em maio deste ano. A ponte de mais de quatro mil toneladas foi projetada e construída durante o governo de Hercílio Luz, pelo engenheiro estadunidense David Barnard Steinman. Desde então tomou tamanha notoriedade no estado que se tornou o principal cartão-postal da capital.
O governador e idealizador do projeto não viu seu sonho ser concluído, pois morreu em 1924, 12 dias depois de inaugurar uma réplica de madeira, na Praça XV, feita especialmente para o ato simbólico. O nome seria Ponte da Independência, o qual foi mudado para homenagear Hercílio Luz.
Demorou quase meio século para ser paga (até 1978) e foi interditada para o tráfego quatro anos depois (1982). Foi tombada como Patrimônio Histórico, Artístico e Arquitetônico do Brasil em 1997 e atualmente está em obra de restauração, orçada em R$ 274 milhões, com previsão de entrega no segundo semestre de 2018.
Visão da ACE
O diretor de Atividades Técnicas e Culturais da Associação Catarinense de Engenheiros (ACE), engenheiro civil e professor da UFSC, Roberto de Oliveira é envolvido com o assunto da ponte desde 2011. Em sua exposição abordou os aspectos técnicos e algumas controvérsias que assombram o tema, como uma possível queda da ponte Hercílio Luz por problemas estruturais ou mesmo pela força do vento.
Quanto à analogia com a tragédia na ponte gêmea Silver Bridge, nos Estados Unidos, que colapsou em dezembro de 1967, explicou que, por excesso de carga, a estrutura rompeu por falha de desenho. “A Silver tinha duas barras de olho e a nossa tem quatro”. O próprio Staimer, engenheiro da Hercílio Luz, alertou que este formato provocaria concentração de tensão. E quanto às especulações de a ponte cair pela ação dos fortes ventos, essas não se sustentam, pois no dia 4 de dezembro de 2016, um vendaval de 118 km por hora, conforme a prefeitura, atingiu todos os bairros do município e não abalou a antiga ponte catarinense. “Na minha opinião, o problema estrutural mais sério da Hercílio Luz é o tratamento térmico das barras de olho, por serem muito compridas”, acusa Roberto.
Apresentou as vantagens da reinserção: “infraestrutura viária praticamente pronta; melhoria do lado insular existente; utilização para transporte coletivo preferencial; subutilização das cargas de serviço e outras viabilidade da ponte”. O engenheiro também considera a ponte Hercílio Luz um marco simbólico da cidade e do estado, já que é o modelo mais moderno desse tipo no mundo. Mais avançado do que esse é uma espécie de transição dessa ponte suspensa para estaiada. Não se fazem mais pontes como a Hercílio Luz porque é uma tecnologia ultrapassada. “Mais uma razão para querermos essa história viva”. E afirma que a ponte está sendo reconstruída para passar trem, com capacidade de quase 10 toneladas por metro quadrado.
O workshop pretende, após identificar os principais desafios e propor medidas estruturantes, formalizar as propostas e encaminhar às entidades responsáveis pela implementação.
(Ufsc, 11/07/2017)
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