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Pesquisa analisa riscos da contaminação de mexilhões na Praia do Matadeiro

Um projeto de pesquisa de mestrado irá verificar possíveis riscos de contaminação de um tipo de cianobactéria tóxica em mexilhões da Praia do Matadeiro. Densas populações desta espécie, Cylindrospermopsis raciborskii, foram registradas na Lagoa do Peri desde a década de 1990 e, nos últimos 20 anos, são monitoradas pela Casan. As concentrações de saxitoxina, produzida pela cianobactéria, ainda são baixas e o sistema de tratamento de água da Casan consegue remover a contaminação, principalmente pelos filtros e cloro. Porém, o Canal do Sangradouro leva água da Lagoa do Peri ao Atlântico, entre Armação e Matadeiro, onde há costões rochosos, habitat de mexilhões, além de organismos comestíveis enterrados na areia.

Cianobactérias tóxicas são analisadas em laboratório. Foto: Henrique Almeida/Diretor de Fotografia da Agecom/UFSC
“Se a carga tóxica de lagoa do Peri está constantemente sendo lançada na praia do Matadeiro, o que se pode esperar da contaminação de mexilhões que por ali vivem ou que por ventura sejam ali cultivados?”, questiona Leonardo Rörig, líder do Grupo de Pesquisa do CNPq Biologia, Cultivo e Biotecnologia de Microalgas e orientador da mestranda Tanise Klein Ramos. Séries de amostragens e análises serão realizadas a fim de testar estas hipóteses, explica Rörig. “Dependendo dos resultados, medidas de gestão deverão ser tomadas para impedir o consumo de frutos do mar oriundos de alguns setores da Praia do Matadeiro. Consequentemente, o cultivo de mexilhões na área deveria ser impedido, haja vista o risco de contaminação com consequências a saúde pública”.

Para recreação na Lagoa do Peri, maior corpo de água doce da Ilha de Santa Catarina, não há complicações atualmente, confirma Rörig. “Dificilmente a pessoa que engolir a água vai ter problemas. Hoje, a água da lagoa é limpa, as algas só vão crescer mais se houver água mais suja”.

Concentração de toxinas

Mexilhões e ostras acumulam toxinas, mas não são afetados por elas, diferente do que acontece com o ser humano. “Normalmente, as chamadas ficotoxinas (toxinas produzidas por algas) e cianotoxinas (produzidas por cianobactérias) geram intoxicação ao ser humano somente quando são acumuladas por organismos marinhos filtradores como os mexilhões e ostras”, diz o pesquisador, acrescentando que mexilhões e moluscos de grande porte têm capacidade de filtrar três litros de água por minuto e concentrar as toxinas.

Rörig comenta que existe o interesse do cultivo de mexilhões na área do Matadeiro e que como a questão é relativamente nova, pessoas e entidades “não têm ideia do tamanho do problema. Os órgãos técnicos são específicos e os de pesquisa – no caso, a UFSC – são os primeiros a detectar. No caso da Lagoa do Peri, a Casan só foi alertada quando a UFSC avisou”.

Saxitoxina

Mais potente toxina natural conhecida, a saxitoxina provoca problemas neurológicos; se ingerida em quantidade, pode levar à paralisia respiratória e morte em poucas horas. “Às vezes ela pode se concentrar em filtros, as pessoas podem tomar água e levar a um efeito crônico, com problemas neurológicos. Em pequenas doses, dificilmente haveria intoxicação”, diz o pesquisador.

Outro ponto a ser levado em conta, explica Rörig, é a bioacumulação. “A toxina da alga vai para o mexilhão, onde se concentra; o peixe come o mexilhão e acumula. Eles têm sensibilidades diferentes e o os vulneráveis são os mamíferos e aves”.

Pesquisas

UFSC, Casan e instituições parceiras conduzem, rotineiramente, pesquisas para compreender a ecologia da Lagoa do Peri e as cianobactérias. “Já sabemos que essas cianobactérias conseguem tolerar amplas variações ambientais e que alguns parâmetros físicos e químicos da água estimulam a produção de toxinas nas mesmas”, fala o pesquisador. A concentração de fósforo é uma delas – provocada se houver agitação no fundo da lagoa e, mais preocupante, pelo aumento do esgoto no local. “Do jeito como as coisas são, vão aparecer novas áreas de urbanização nas proximidades da Lagoa e aí o risco está estabelecido. A ausência histórica de um efetivo planejamento urbano em Florianópolis nos faz antever essa provável situação perigosa. Todos os órgãos técnicos deveriam estar alerta.”

Provocar interferências na ecologia da lagoa é uma alternativa polêmica, avalia o pesquisador. “Poderia haver problemas colaterais e a Lagoa do Peri é uma unidade de conservação. Sua água abastece 100 mil pessoas, a prefeitura deveria controlar melhor este ambiente”, opina.

O trabalho também pretende analisar a capacidade de sobrevivência destes organismos na água salgada, neste local. A água do mar evita, em tese, a proliferação da toxina, afirma Rörig: “Em contato com o sal, que seca a célula, a cianobactéria se defende e usa a saxitoxina para fechar os poros e evitar a perda d’água, mas não sabemos se a toxina fica ativa nas células mortas”. Na Lagoa do Peri, a salinidade é zero; no Sangradouro, próximo ao mar, vai de 0 a 25 partes por mil; na praia do Matadeiro, varia de 20 a 30; mais longe da costa, chega a 35.

A primeira parte da pesquisa é laboratorial, com o teste e cultivo da alga isolada. A segunda irá avaliar a presença dela na saída do Canal do Sangradouro, especialmente com a coleta dos mexilhões.

Proliferação

Os pesquisadores não conseguem rastrear a origem da cianobactéria, uma espécie invasora. “Não sabemos a origem, mas há o perigo dela se espalhar. Se um pescador usa a tarrafa na Lagoa do Peri e leva para outra lagoa, há o risco de invadir outros ambientes”, conta Rörig, que frequentemente faz análises em amostras de água da Lagoa Pequena do Campeche – e nunca encontrou nada.

Pesquisadores

Além de Rörig e a oceanógrafa Tanise, o projeto de mestrado conta com o apoio do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia Mar – Centro de Oceanografia Integrada (INCT Mar-COI) e a participação de João Sarkis Yunes (FURG), colaborador de pesquisas da UFSC e Casan.

(USFC, 29/05/2017)

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