Nesta segunda-feira, a Hora mostrou que na opinião de autoridades de trânsito, a rodovia SC-401 é uma “combinação explosiva”. Entre as soluções para o trecho, está a discussão sobre a redução da velocidade. Em 2011, a Organização das Nações Unidas (ONU) deu início à campanha “Década de Ação pela Segurança no Trânsito 2011-2020”, na qual governos de todo o mundo se comprometem a tomar medidas para prevenir os acidentes, que matam cerca de 1,3 milhão e ferem de 20 a 50 milhões de pessoas por ano.
Entre as principais diretrizes está a redução dos limites de velocidade nas cidades para 50 km/h em qualquer via urbana, sem distinção de tamanho ou capacidade. Em áreas com grande movimentação de pedestres e ciclistas, a recomendação é de 30 km/h.
Segundo a ONU, a redução do limite de velocidade é uma tendência no mundo e diversas cidades já aderiram. Nova York, por exemplo, desde 2014 limitou a 40 km/h a velocidade máxima na área urbana, ao passo que em Londres as importantes avenidas têm limite de 32 km/h. Nas duas capitais, as mortes relacionadas ao trânsito diminuíram.
Redução da velocidade é polêmica
São Paulo foi uma das poucas cidades brasileiras a testar a diminuição da velocidade máxima. Em 2015, o ex-prefeito Fernando Haddad reduziu o limite nas marginais Tietê e Pinheiros, principais vias de tráfego da maior cidade do país, e o número de acidentes com vítimas (mortas ou feridas) caiu 37,5% em um ano, de acordo com a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET). De quebra, ainda houve redução de 10% na lentidão do trânsito. Apesar dos números, a medida foi duramente criticada por boa parte dos paulistanos.
— O ponto é que a redução vai contra a cultura da velocidade e desempenho tão pregada pela indústria e pela publicidade. Precisamos de um projeto que humanize o trânsito, onde a via deixe de ser uma pista de corrida para carro e seja uma via para todos — comenta Fábio Almeida, ciclista que atua na criação da Associação de Mobilidade por Bicicleta e Meios Sustentáveis (Amobici).
Em Florianópolis, o “racha” não é diferente e mesmo os órgãos envolvidos na gestão do trânsito não acreditam na eficácia da medida.
— Acredito que a mudança pouco interviria na segurança diária e poderia piorar ainda mais o trânsito. Se reduzir para 60 km/h, por exemplo, a rodovia não teria fluidez, porque é muito longa e dá acesso a muitos bairros. É preciso um limite mais alto para que a retomada de velocidade dos veículos permita a fluidez do trânsito — analisa o tenente-coronel Fábio Martins, comandante da Polícia Militar Rodoviária de Santa Catarina (PMRv).
Radar fotográfico divide opiniões
A questão do limite de velocidade na rodovia SC-401 é polêmica, mas não chega a ser a maior preocupação das diferentes partes que constituem o trânsito. Alguns setores consideram elevado o limite de 80 km/h, mas o grande lamento é com relação ao desrespeito à lei.
— Quanto menor a velocidade, menos chance de acidentes. A redução da velocidade ajudaria na segurança e não interferiria muito na fluidez, mas o problema não é nem o limite de 80 km/h. É o excesso dos 80 km/h — avalia Lenise Grando, porta-voz do Observatório de Mobilidade Urbana da UFSC.
Se o sentimento de impunidade é o primeiro incentivo para a quebra da lei, a fiscalização e a aplicação de penas e multas são o remédio. Por ser uma rodovia estadual, esse trabalho é feito pela PMRv. Para o tenente-coronel Fábio Martins, seria fundamental a instalação de radares fotográficos fixos.
— A fiscalização tem um fator educativo e de coibir esse tipo de ação. Quando você coloca equipamentos de controle de velocidade ao longo da rodovia, você potencializa essa fiscalização — avalia.
O Deinfra, por sua vez, prefere se abster do debate e postergar uma eventual instalação de radares.
— É claro que [a instalação de radares] poderia ajudar, porque a parte mais sensível é o bolso do motorista, mas não vejo essa necessidade. Para os bons, não precisa de leis. Para os maus, não adianta — afirma o presidente Wanderley Agostini.
Ações podem ser tomadas em curto e médio prazo para aumentar a segurança e a fluidez do tráfego na rodovia SC-401. O Plano de Mobilidade Urbana Sustentável (Plamus), por exemplo, propõe a remodelação da via com a implantação do sistema de transporte coletivo BRT (Bus Rapid Traffic) e a construção de calçadas largas e ciclovias que possam garantir o acesso às edificações em ambos os lados.
O projeto do sistema BRT prevê corredores exclusivos dispostos junto ao canteiro central, estações em plataformas elevadas e faixas de segurança com ilhas de proteção aos pedestres para travessia em nível da via, que passará a ter caráter de avenida urbana. Caso implementado, os ônibus diminuiriam consideravelmente o tempo dos trajetos, fato que incentivaria mais pessoas a usar o transporte coletivo como meio principal de locomoção.
— O BRT pode ajudar a melhorar a mobilidade de todos, porque é preciso reduzir o número de automóveis circulando na cidade. Do jeito que está, a rodovia não comporta mais o crescente número de veículos — afirma Lenise Grando.
Medidas paliativas
Enquanto não há um redesenho do tráfego na rodovia SC-401, medidas paliativas podem contribuir para melhor fluidez. Entre elas está a criação de terceiras faixas no trechos de subida, mas talvez a medida mais importante seja a construção de vias marginais para aceleração e desaceleração dos veículos.
— Recentemente, foi feita uma ação aparentemente simples, mas que deu resultado. A construção da faixa de aceleração para os ônibus que param no ponto próximo ao cemitério Jardim da Paz melhorou muito o trânsito, porque os coletivos conseguem entrar na rodovia com uma velocidade maior, sem trancar quem vem atrás — comenta Wanderley Agostini.
O presidente do Deinfra reconhece que a rodovia precisa de cuidados e afirma que uma das medidas que o governo do Estado pretende tomar em breve é a recuperação do asfalto, além de otimizar o sistema de drenagem da água nas margens da rodovia.
— Temos uma licitação para recuperação da rodovia. Estamos aguardando a liberação do financiamento junto ao Banco do Brasil e a ordem de serviço para darmos início às obras. Ela vai ser executada no período noturno, mas ainda assim vai causar certo transtorno. O importante é que o transtorno passa e a rodovia fica — disse Agostini.
Para a execução desta e de outras obras, o governo estadual conta com a aprovação do projeto de lei que possibilitará a segunda etapa do Fundo Estadual de Apoio aos Municípios (Fundam 2), que tramita em regime de urgência na Assembleia Legislativa de Santa Catarina. A previsão é que sejam destinados R$ 700 milhões para o fundo, a serem divididos entre as 295 cidades do estado e usados nas áreas da saúde, educação e infraestrutura, mas o projeto não especifica quais rodovias serão beneficiadas.
“A mudança tem que começar em cada um”. Esse é o discurso que impera entre todos os envolvidos na mobilidade urbana. A avaliação é de que pedestres, ciclistas e motoristas nem sempre têm conhecimento da lei, tampouco têm empatia pelo próximo.
— Se todo mundo se colocasse no lugar do outro, a coisa ia fluir melhor. Parece que todo mundo está sempre atrasado, quer andar mais que o outro, não respeita ninguém — lamenta o frentista Jean Oliveira, de 25 anos, que trabalha às margens da SC-401.
Há um velho ditado que diz que o primeiro exemplo vem de casa. Na avaliação da PMRv, esse é um dos principais problemas no trânsito brasileiro.
— O que a nossa geração está passando para as crianças? Por que um cidadão coloca a família no carro e sai dirigindo depois de encher a cara, colocando todos em risco? A impressão que dá é que as crianças estão aprendendo mais o errado do que o certo — avalia o tenente-coronel Martins.
Para a Abramet, o poder público precisa intervir na formação das pessoas e criar campanhas permanentes de educação de trânsito, ensinando o respeito às leis.
— Temos que ter educação de trânsito nas escolas para que haja mudança do comportamento da sociedade com relação à mobilidade. Educando é que vamos transformar essa anarquia no trânsito — afirma Dirceu Rodrigues.
Municipalização em pauta
Não é de hoje que o poder público discute a possibilidade de municipalizar a SC-401. Tirando a jurisdição do estado e colocando na mão da prefeitura, a gestão da via poderia ter acompanhamento mais detalhado, já que o Deinfra é responsável pelo monitoramento e planejamento de obras e melhorias em todo o Estado. Este é um dos argumentos a favor da municipalização da rodovia, mas que exigiria a criação de um órgão voltado exclusivamente para a gestão do trânsito na cidade. Na visão da Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana, a questão é complexa e envolve três fatores: engenharia de tráfego, fiscalização e educação para o trânsito.
— A engenharia de tráfego é fundamental e exige estudo de capacidade, circulação e demanda. Em segundo lugar, teríamos que repensar a fiscalização, porque hoje ela é feita pela PMRv e também teria que ser municipalizada. Por fim, teríamos que trabalhar mais a educação para o trânsito — afirma o secretário Marcelo Silva.
Para o comandante da PMRv, tenente-coronel Fábio Martins, a municipalização poderia gerar ainda mais problemas de fiscalização e não necessariamente traria melhoras na segurança e mobilidade. O Deinfra, por sua vez, é favorável à municipalização. Segundo Wanderley Agostini, atualmente há uma sobreposição de poderes que prejudica o trabalho nas rodovias estaduais em perímetros urbanos. O município é regido por um plano diretor que determina o zoneamento de construção civil, comércio e indústria. O alvará é solicitado junto à prefeitura e concedido por ela, mas uma eventual obra no entorno de rodovias estaduais pode ser embargada pelo Deinfra por invasão da faixa de domínio.
— Sou favorável à municipalização das rodovias estaduais em todos os perímetros urbanos, por essa sobreposição de poderes. A municipalização resolveria muitos problemas, porque daria “livre arbítrio” às prefeituras, mas também passaria adiante a responsabilidade pela manutenção das vias — comenta Agostini.
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