Licenças ambientais irregulares, tratamento de esgoto ineficiente e, principalmente, a transferência da poluição do rio do Braz para o Papaquara em vez da solução do problema. As duras críticas são da Advocacia-Geral da União (AGU) para o serviço de tratamento de esgoto realizado pela Casan no bairro Canasvieiras, em Florianópolis. A manifestação tomou como base um documento técnico produzido pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade ( ICMBio) e foi anexada este mês na ação civil pública do Ministério Público Federal (MPF) sobre poluição no Norte da Ilha de Santa Catarina, que tramita desde 2014 na Justiça Federal. A Casan afirma que possui todas as licenças para operar e trabalha para solucionar problemas no tratamento de esgoto em Canasvieiras. Uma audiência de conciliação entre as partes está marcada para o dia 30 de setembro.
Entre outros apontamentos, o documento técnico ICMBio questiona a falta de solução para os extravasamentos que ocorrem na Estação Elevatório de Esgoto (EEE) do rio do Braz. No relatório, os técnicos do órgão federal concluem que a medida adotada pela Casan, um desvio no efluente (by pass), apenas transferiu a poluição:
— Se anteriormente ao lacre extravasador da EEE o canal do rio do Braz é quem sofria os impactos dessa carga poluidora, agora esses impactos foram transferidos para o canal pertencente à bacia hidrográfica do Papaquara que recebe os efluentes via by pass – diz o laudo.
Pela bacia do rio Papaquara estar inserida da Estação Ecológica (Esec) Carijós, uma área de preservação permanente sob a tutela federal, a AGU defende que a Casan precisaria de licenças ambientais do Ibama ou do ICMBio para construir a ETE Canasvieiras no final década de 1980. Por isso, o documento relata que “traz profundo assombro” a notícia de ampliação da estação de tratamento e afirma que as licenças obtidas pela concessionária para a estação de tratamento no Norte da Ilha de Santa Catarina “padecem de vício de ilegalidade”. Como solução, o ICMBio e a AGU propõem um “licenciamento corretivo”, que deve ser submetido ao órgão ambiental para que o uso da área seja regularizado.
— A ETE deve ser ampliada, com vista a atender de forma adequada a demanda da população residente e flutuante (atual e futura). Também entendemos como necessária a modificação do local de disposição final dos efluentes tratados, já que o atual não tem capacidade para receber tamanho aporte de efluente, ainda que tratados – afirma o ICMBio, em nota encaminhada pela assessoria de imprensa do órgão em Brasília.
A nota do ICMBio informa que a Casan já foi alvo de cinco multas, entre 2011 e 2015, por despejo de material poluidor do meio ambiente através da ETE Casnasveiras. As punições somam mais de R$ 1,6 milhão. A concessionária recorre de todas as multas.
Na análise técnica que integra a ação, o ICMBio também indica erros na capacidade de atendimento da Casan à região para a projeção populacional até 2027. O instituto ainda atribui a poluição no rio Papaquara ao efluente mal tratado na ETE Canasvieiras, citando dados de um laudo pericial realizado a pedido da Justiça em fevereiro deste ano. O juiz da 6ª Vara Federal de Florianópolis, Marcelo Krás Borges, determina que a Casan tome conhecimento das manifestações da AGU e do ICMBio para a audiência de conciliação agendada para o dia 30 de setembro. Caso não haja acordo entre as partes na audiência, o processo deve aguardar por uma decisão do juiz, cabendo recurso em instâncias superiores.
A reportagem tentou contato com o MPF, mas a procuradora da República Analúcia Hartmann, responsável pela ação civil pública, está de férias.
O que a AGU diz sobre a atuação da Casan no Norte da Ilha
1 – A Casan não interrompeu o extravasamento da Estação Elevatória de Esgoto (EEE) do Rio do Braz, apenas transferiu o problema para o rio Papaquara;
2 – A EEE do Rio do Braz foi ampliada sem o devido licenciamento e sem a anuência do ICMBio. A mesma ampliação desconsiderou a demanda da população atual e futura, além de não ter avaliado a capacidade do meio hídrico receptor e os impactos para a Unidade de Conservação;
3 – As licenças obtidas pela Casan para o sistema de esgoto de Canasvieiras são nulas, por não terem permissão do Ibama ou do ICMBio;
4 – Falta um estudo aprofundado sobre a dinâmica da qualidade da água dos rios do Braz e Papaquara e da balneabilidade da praia de Canasvieiras.
Casan defende licenças e trabalho de saneamento em Canasvieiras
A Casan contesta os apontamentos feitos pela AGU na ação. Segundo a concessionária, as licenças ambientais da Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) Canasvieiras são legais, e o efluente desviado para o rio Papaquara recebe tratamento completo e está dentro das normas previstas na legislação ambiental.
A empresa entende que o licenciamento ambiental segue o determinado pelo Conselho Nacional de Meio Ambiente, na resolução n° 428/2010. A exigência do conselho é para que em estações do porte da ETE Canasvieiras, o órgão licenciador alerte a administração da unidade de conservação em questão sobre um possível risco à área. A Casan afirma que o ICMBio, gestor da Esec Carijós, foi alertado pela Fatma sobre a situação, para que fizesse as fiscalizações necessárias e que, portanto, não há irregularidades.
A Casan também diz que tem “pleno conhecimento das vazões atuais e futuras (de esgoto), e, atualmente, está revisando, junto ao movimento do Plano Diretor de Florianópolis, as projeções de ocupação do solo para o ano de 2027”. A empresa comunica que “está fazendo significativos investimentos na estrutura do Sistema de Esgotamento Sanitário Costa Norte”.
A concessionária promete informar na audiência conciliatória, no dia 30 de setembro, as medidas tomadas para melhorar o sistema na região. Entre as já concluídas estão a ampliação da capacidade da EEE com a implantação de um novo emissário do rio do Braz para a estação de tratamento.
A gerência de fiscalização da Fundação Municipal do Meio Ambiente de Florianópolis (Floram) informou que faz o acompanhamento das ações da Casan.
Irregularidades na ETE Canasvieiras geraram seis autos de infração para Casan
Em nota, a Fatma afirma que o licenciamento ambiental da ETE Canasvieiras segue a resolução nº 13/2012 do Conselho Estadual do Meio Ambiente, que dispõe sobre as atividades que podem causar danos ambientais. A norma indica que sistemas de coleta e tratamento de esgoto sanitários devem ser licenciados pelo órgão ambiental do Estado.
Segundo a fundação, a Casan já foi punida com seis multas pelos problemas registrados na última temporada, mas “Nenhuma foi paga, porque os processos ainda tramitam e os valores só são divulgados após julgados “.Sobre a qualidade do efluente despejado nos rios do Braz e Papaquara, a Fatma afirmou que não monitora a questão.
(DC, 29/08/2016)
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