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Doação de terreno da UFSC para comunidade da Serrinha é só o começo

Em 2012, moradores da Serrinha, na região da Trindade, em Florianópolis, foram acordados por agentes da Polícia Federal, que subiram o morro para entregar notificações de um processo de reintegração de posse movido pela vizinha Universidade Federal de Santa Catarina. Muitos nem sabiam que aquele terreno pertencia à UFSC.

— Eu moro aqui há 31 anos e isso nunca tinha acontecido antes. Nós achávamos que essa área era do Estado. Foi traumatizante — lembra a aposentada Lucelma de Lima, 57 anos, conhecida na comunidade como Celma.

Ela foi uma das principais lideranças comunitárias para que, quatro anos depois, esse trauma se transformasse numa boa notícia: após muita mobilização, choro e preocupação, a Universidade irá doar ao Município um trecho de 14 mil m², onde atualmente moram 85 famílias, junto à Servidão dos Lageanos.

No entanto, ainda há um longo rito burocrático pela frente, até que o espaço esteja de fato nas mãos da prefeitura, e enfim possam ser realizadas as regularizações fundiárias e urbanização. A doação foi aprovada pelo Conselho Universitário em maio.

— Agora o processo foi encaminhado à Secretaria de Planejamento da Universidade, que vai organizar e devolver ao conselho de curadores, que depois encaminhará à SPU (Superintendência do Patrimônio da União). Não há como estimar um prazo, mas a aprovação pelo conselho é o mais relevante — explica o chefe do gabinete da reitoria, Aureo Moraes.

Dona Celma acredita que em até dois anos essa situação esteja resolvida. Para quem esperou três décadas, é pouco. Celma veio de Joaçaba em 1985 para a Serrinha. Construiu sua casa com ajuda dos vizinhos.

— Eu pagava um aluguel e me disseram pra erguer minha casa. Uma senhora cedeu uma área dela pra mim. Mas naquela época, não havia estrutura alguma, era muito barro, uma tristeza — lembra.

Atualmente paga contas de luz, internet e telefone, mas não o IPTU. E enquanto espera a doação, ela e a associação de moradores já estão cadastrando o pessoal.

Celma guarda fotografias antigas da ocupação da Serrinha, como esta, na servidão dos Lageanos

 Sem nome de rua nem agente de saúde

O atual presidente da associação é o motorista Paulo Silva. Ele explica que a regulação fundiária é apenas o começo.

— Estamos há seis anos sem um agente de saúde. E precisamos muito de alguém que conheça nossa realidade, os moradores, até porque muita rua não tem nome, nem o carteiro consegue localizar. A desordem é grande. A comunidade cresceu muito rápido e não temos rede de esgoto, para muitos falta iluminação. Não temos sequer um espaço de lazer para as crianças — lista Paulo.

A Secretaria Municipal de Habitação explica que é legalmente impedida de realizar quaisquer serviços de infraestrutura em terrenos particulares. É o caso da Serrinha. “Portanto, até que a doação do terreno seja legal e efetivamente concretizada, não existe a possibilidade de interferência na área, quer seja no que diz respeito à urbanização – abertura de ruas e calçamento, por exemplo – ou intervenções pontuais”, explica a prefeitura em nota.

Conforme o documento, assim que o processo de doação for concluído, “a prefeitura dará início a uma série de ações para melhorar as condições de vida da comunidade, todas elas a partir da elaboração e aprovação de projetos regulares e específicos para o local, a exemplo da regularização fundiária (que viabilizará a emissão de títulos de propriedades)”.

Os moradores também buscam mais parcerias com a Universidade. Paulo Silva lembra que havia um posto de saúde gerido pela UFSC, que foi fechado. Ele sugere que estudantes trabalhem junto à comunidade para prestar auxílio jurídico, social e de saúde.

— O entorno da UFSC é formado por comunidades carentes. Se houver uma integração maior da comunidade acadêmica com a gente, vai ser bom para toda a sociedade — acredita.

O chefe de gabinete da reitoria diz que a Universidade apoia projetos nesse sentido.

— A UFSC pode ter a intenção de atividades, mas que vão depender de pessoas dispostas a desenvolver projetos lá. Se o departamento de odontologia, por exemplo, quiser abrir uma clínica popular lá, nós vamos apoiar — promete Aureo Moraes.

(Diário Catarinense, 09/06/2016)

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