(Coluna Sergio da Costa Ramos, DC, 11/02/2014)
Cidade. Há 30 anos o Brasil ainda era um país rural. Hoje 90% vivem nas cidades. E elas se transformaram num labirinto de conflitos e disputas, armadilhas para emboscar o ser humano. Na prática do dia a dia, a cidade moderna vai perdendo o seu significado institucional. Avança sobre todos os solos e tornou-se vítima de outras atividades sinistras, como o furto, o roubo, o assassinato.
Eça de Queirós não gostava das cidades, como deixou claro no seu libelo contra essa “criação antinatural”, em A Cidade e as Serras. Na comparação entre as selvas, a verde e a de pedra, o monóculo do escritor só tinha olhos para a primeira:
“Na Natureza, nunca se descobriria um contorno feio ou repetido. Nunca duas folhas de hera se assemelharam na verdura ou no recorte. Na cidade, todos repetem servilmente o mesmo edifício, a mesma indiferença ou inquietação”.
Dizem os pragmáticos que o hábito de condenar as cidades e enaltecer a natureza é apenas “uma licença para a poesia”, uma chispa para o gênio criador do homem romântico. A cidade é a realidade que a maioria das pessoas acha um inferno, embora recuse o paraíso do meio do mato.
As pontes de Floripa foram concebidas para um fluxo de 40 mil veículos por dia. Já recebem mais de 100 mil. Trata-se do próprio inferno (ro)Dante…
É o progresso, dizem. E o homem vai atrás, cada vez mais absorvido por este mundo de gases, óleos, resinas e misturas químicas que envenenam os poros, a alma, a mente. Não por acaso os lugares de paz e meditação religiosas se assentam em jardins: o claustro dos mosteiros, os canteiros das casas muçulmanas, as fontes dos jardins hindus, símbolos do Paraíso.
Sempre que se deixou subjugar pela cidade, o homem perdeu o melhor dos seus dons – a capacidade de continuar humano, como lamentou Eça, contemplando as vinhas da Serra da Estrela:
“Os sentimentos mais genuinamente humanos se degeneram nas cidades. Nelas, os rostos humanos nunca se olham.”
A capital dos catarinenses ainda detém o privilégio de se hospedar numa ilha, onde a Mata Atlântica ainda está preservada e onde a natureza ainda se revela um colírio para os olhos humanos.
Contudo, a Ilha parece soçobrar ao peso de migrações cada vez mais concentradas: o Sudeste e o extremo sul brasileiro parecem ter combinado juntos: vamos morar naquela Ilha Formosa…
E os incomodados que se mudem.
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