Depois das críticas e do descontentamento manifestado publicamente pelo governador Raimundo Colombo (PSD) em relação ao andamento das obras, a empresa responsável pela restauração da ponte Hercílio Luz, Construtora Espaço Aberto, de Florianópolis, afirmou que os prazos serão cumpridos e descarta novos atrasos. “Até dezembro entregaremos a ponte apta e segura para o fluxo de veículos”, assegurou ontem o proprietário Paulo Ney Almeida.
A obra de restauração da ponte, orçada em R$ 220 milhões, foi assumida pela Construtora Espaço Aberto em 2008, depois de 26 anos de interdição e do “vai-e-vem” do projeto de reforma. A novela ganhou novos capítulos na última sexta-feira, quando o governador ameaçou a rescisão do contrato com a empresa por atraso de dois meses nas obras. Colombo estipulou até o dia 5 de março o prazo para a construtora apresentar um novo cronograma que garanta a conclusão em 2014.
Porém, apesar de garantir o trânsito no local, Almeida não assegura a finalização da obra até o final do ano. Segundo a empresa, os últimos detalhes, como pintura, acabamento e desmontagem da estrutura de sustentação só serão feitos em 2015. “É uma obra muito complexa. Para desmontar a estrutura levamos o mesmo tempo que o da construção. Depois de pronta para a passagem de veículos em dezembro, teremos mais dois a três meses para finalizar o restante, porém isso não atrapalhará em nada”, afirmou Almeida.
Em relação ao atraso de dois meses no cronograma, o proprietário da construtora alegou um fato novo: a reformulação do projeto. “Estamos estudando desde outubro do ano passado a reformulação do projeto, que ficou pronta agora em janeiro, e iremos apresentá-la ao governador no dia 5, junto com o novo cronograma solicitado”, disse Almeida ao destacar que o novo projeto tem mais de duas mil páginas.
A alteração informada pela empresa é técnica: a estrutura das torres e das treliças usadas para a sustentação provisória do vão central será construída no mar e não mais no canteiro de obras. “Essas estruturas de ferro que pesam cem toneladas seriam construídas inteiras em terra e acopladas diretamente na estrutura da ponte, o que nossos técnicos e consultores alertaram ser perigoso por indicar mais peso na ponte. Então, reformulamos esse projeto e iremos construir as torres e as treliças diretamente no mar, peça por peça, o que não vai sobrecarregar o peso”, explicou.
Estão atrasando o cronograma frequentemente, diz governador
O governador Raimundo Colombo afirmou ontem que a complexidade da obra não será argumento para prorrogar o prazo de entrega. “Nós precisamos da segurança de que a obra será entregue este ano. As pessoas estão esperando na fila nas outras pontes, na Via Expressa e na BR-101. É uma promessa da empresa que precisa ser cumprida”, ressaltou Colombo ao reforçar a possibilidade de rescisão do contrato com a Espaço Aberto. “Existe essa possibilidade sim. Estão atrasando o cronograma frequentemente e estão criando um problema. Não é por falta de recursos, estamos cumprindo a nossa parte e a empresa precisa cumprir a dela. E se ela não cumprir, nós temos que rescindir o contrato e de imediato fazer nova contratação. Eles têm até o dia 5 de março para apresentar o novo cronograma e cumprir. Se não cumprir não tem como continuar”, disse.
O presidente do Deinfra (Departamento Estadual de Infraestrutura), Paulo Meller, afirmou desconhecer qualquer reformulação no projeto e que o órgão aguarda o novo cronograma até março para se pronunciar sobre o assunto. “Tratamos sobre isso semanalmente em reuniões sobre as obras e vamos ter mais uma antes do Carnaval. Não vou externar as condicionantes solicitadas pelo governo à empresa, porque são questões técnicas que a empresa precisa resolver até o dia 5”, afirmou.
O proprietário da Espaço Aberto, Paulo Ney Almeida, assegurou que as obras ganharão novo ritmo depois do Carnaval e descartou se tratar de atrasos. “Com essa reformulação, iremos contratar mais cem operários e vamos agilizar as obras e recuperar essa defasagem no tempo provocada pelos novos estudos. O cronograma continua, iremos atender os prazos do governador e vamos entregar a obra de qualquer maneira”, declarou.
Ponte será suspensa em agosto
No cronograma que a empresa garante não ser modificado, está a parte mais complexa da restauração: a suspensão de até um metro do vão central da ponte para a troca das barras de olhais. Nesta fase, prevista para agosto, 54 macacos hidráulicos vão transferir as 4.400 toneladas da ponte para a estrutura que está sendo montada. “Com a transferência de carga, a estrutura ficará livre para troca das 360 barras de olhais e a reposição de todas as peças necessárias. É a parte mais complicada e mais trabalhosa”, informa o engenheiro da Espaço Aberto, responsável pela obra, Gleison Lemos.
O engenheiro ressalta que em 45 dias as estacas que sustentarão as torres sob a ponte estarão concluídas e o trabalho no fundo do mar finalizado. Até agosto, a estrutura de suspensão provisória do vão central (torres, estacas e treliças) estará pronta. Depois disso, as obras continuam na construção das novas pistas da ponte.
Empresa administra consórcio
A Construtora Espaço Aberto é a majoritária do Consórcio Florianópolis Monumento, vencedor da licitação e responsável pela obra na ponte Hercílio Luz. Além dela, que detém 85% das ações, o consórcio é formado pela empresa americana CSA, com 15%. Com 32 anos de fundação, a Espaço Aberto tem 1.000 funcionários e conta com consultoria americana e francesa em tecnologia de engenharia. Segundo o proprietário da construtora, Paulo Ney Almeida, 50% das obras da empresa são no setor público.
Entenda o caso
1982 – Após receber laudo do IPT/SP (Instituto de Pesquisas Tecnológicas de São Paulo) informando sobre o risco de colapso da ponte, o governador Jorge Bornhausen determina a interdição da estrutura no dia 22 de janeiro.
1988 – A ponte é reaberta ao tráfego de pedestres, bicicletas, motos e veículos de tração animal.
1991 – No dia 4 de julho, a passagem de pedestres e veículos leves é interrompida novamente. O piso asfáltico do vão central é retirado para diminuir 400 toneladas de peso.
1992 – Estrutura é tombada como Patrimônio Histórico, Artístico e Arquitetônico de Florianópolis. Prefeito: Antônio Henrique Bulcão Vianna.
1997 A L’Engerrot, empresa francesa, é contratada para realizar o projeto de recuperação da ponte. O custo é de US$ 5 milhões, aproximadamente R$ 8,8 milhões pela cotação atual da moeda americana. A verba veio de uma emenda dos senadores Esperidião Amin e Vilson Kleinübing. No mesmo ano, a Hercílio Luz é tombada como patrimônio de Santa Catarina e também do Brasil.
2002 – A L’Engerrot entrega o projeto de restauração da ponte Hercílio Luz, mas o documento ficaria engavetado por longos 36 meses.
2005 – Projeto para reabilitação da Hercílio Luz é apresentado e marcada data para o lançamento do edital para selecionar as empresas que trabalhariam no restauro da primeira fase da obra. Recuperação dos acessos da Ilha e do Continente custa R$ 26 milhões.
2008 – Governo do Estado lança edital para contratar a segunda etapa da restauração, que inclui a recuperação da base das torres principais e fundações e troca da barra de olhal.No mesmo ano, o Consórcio Florianópolis Monumento inicia a segunda etapa da obra.
2009 – Consórcio formado pelas empresas Roca (Curitiba) e TEC (São José) finaliza a restauração das cabeceiras. O reforço na base não pôde ser concluído, devido a problemas com indenizações.
2010 – Depois da retomada da obra, nova previsão para conclusão é 2012.
2011 – Durante evento na Fiesc, os engenheiros Honorato Tomelin, da UFSC, e Khaled Mahmoud, da Universidade de Nova York, expõem as fragilidades da ponte, que pode cair a qualquer momento, se a demora da obra persistir. Como exemplo, citam a Silver Bridge, estrutura idêntica, que desabou em 1967, matando 46 pessoas. O defeito foi a ruptura de uma barra de olhal. Começa o estaqueamento, mas obra é paralisada devido à morte de um mergulhador.
2012 – Uma das estacas cravadas para apoiar o vão central da ponte durante a reforma tomba. O Deinfra detecta que a fissura de uma rocha causou o incidente. O custo para a recolocação da estaca é pago pela seguradora. Chega ao fim o prazo para o término da restauração. Novo prazo é estabelecido para a metade de 2013.
2013 – Ponte não fica pronta no prazo estabelecido. Término agora está previsto para o fim de 2014. Para agilizar a obra, governo do Estado contrata financiamento de R$ 150 milhões junto com o BNDES. Desse montante, são liberados R$ 87 milhões. Trabalhos ganham corpo. Termina o contraventamento (cruzamento de tubos de aço nos conjuntos de estacas responsáveis por segurar toda a estrutura provisória). Começa a segunda etapa da restauração.
2014 – Ano começa com ritmo lento nas obras de restauração. O Notícias do Dia revela, na edição de 18 de fevereiro, que a restauração pode atrasar mais uma vez. No dia 21 de fevereiro, o governador Raimundo Colombo anuncia que pode romper o contrato da obra com o Consórcio Florianópolis Monumento.
(ND Online, 24/02/2014)
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