Com ainda mais disposição de dois dias atrás, às 17h estavam todos lá no Terminal Central. Logo eram mais de 30 mil. Estudantes, trabalhadores, jovens, aposentados, que se misturavam numa cumplicidade coletiva para dividirem indignações. O vento que soprava do sul, trazendo uma fina garoa, nem de longe esfriou os ânimos, apesar dos 15°C. Menos de duas horas depois do início, o ápice: pontes fechadas, Beira-mar interditada e uma multidão pelas ruas de Florianópolis. Entrada e saída da Ilha de Santa Catarina ficaram mais cinco horas interrompidas, no maior dia de manifestações pelo país desde o início dos protestos, e só foram liberadas com força policial. Três manifestantes foram presos.
Logo no início da manifestação, uma divisão. “Sem partido, sem partido”, bradava a maioria, rechaçando a presença de militantes partidários. Enquanto um grupo ficou pelas imediações do Ticen, tentando chegar à prefeitura; outra parte cruzou a avenida Mauro Ramos, acessou a Beira-mar Norte e seguiu para as pontes. “Vinha gente de todos os lados. Quando cheguei à cabeceira da Colombo Salles, as duas pontes estavam tomadas de gente”, relatou Jackson Silva, 30. Durante sete horas de manifestação, a ocupação das pontes se tornou símbolo do grande ato.
Com mais força, o transporte público precedia tantas outras reivindicações, quase as mesmas defendidas nas mais de 100 cidades onde ocorreram manifestações ontem. A Copa do Mundo, PEC 37, estatuto do nascituro, Feliciano e a corrupção decoravam os diversificados e criativos cartazes. E quando as palavras de ordem paravam, o coro entoava: “Não para não, ainda falta educação”.
Diferente de 2004, quando a Ponte Colombo Salles ficou fechada por 20 minutos e houve prisões e confrontos, nesta quinta-feira, a polícia levou mais de cinco horas para reagir contra o protesto. E o que parecia se encaminhar para um ato pacífico terminou em briga.
Depois de mais de cinco horas, quem esperava para chegar ou sair da Ilha perdeu a paciência com os cerca de 600 manifestantes que ainda estavam sobre as pontes. Ao passo que a pressão da Polícia Militar tentava liberar o tráfego, o grupo foi diminuindo. Quando restavam pouco mais de 200 pessoas, às 00h08, garrafas voaram e uma bomba de efeito moral, a primeira durante toda manifestação, explodiu sobre a ponte Colombo Salles. Dois policiais ficaram feridos e três manifestantes presos por desacato.
(ND, 21/06/2013)
O Brasil sacode
O Brasil viveu um dia histórico e tenso numa das manifestações populares mais intensas da história do país. Houve quem protestasse em paz, como em Santa Catarina, e registros de violência em Brasília, Salvador e Rio de Janeiro, entre outras cidades. O que ficou claro é que depois de 21 anos a população mostrou poder de mobilização outra vez e que o Brasil não é o mesmo desde ontem
O Brasil foi sacudido na noite de ontem, de Sul a Norte, pelo som das ruas. Na maior manifestação popular em 20 anos, ativistas que lutam por um rol de 50 causas diferentes marcharam pelas ruas de mais de cem cidades. E foi com confronto. Nas principais capitais brasileiras, o que era para ser uma passeata virou batalha campal. Em alguns casos, entre os próprios manifestantes. Na maioria das vezes, entre eles e integrantes da Polícia Militar.
Em Florianópolis, onde cerca de 30 mil pessoas foram às ruas, e nas cidades do interior de Santa Catarina imperou a paz, mas houve o registro de um incidente – um dos manifestantes caiu da ponte Colombo Salles, foi encaminhado ao hospital, mas passa bem.
Em Brasília, ativistas tentaram mais uma vez invadir o Congresso – já tinham feito isso no início da semana – e entraram em confronto com 50 policiais dispostos em frente ao parlamento. Os manifestantes também protestaram em frente ao Ministério da Justiça, bloqueado pela PM, o Supremo Tribunal Federal e o Palácio do Itamaraty, que chegou a pegar fogo por causa de uma bomba incendiária lançada pelos manifestantes.
O Rio de Janeiro, que teve a maior passeata – estimada em 300 mil pessoas pela PM –, também viveu uma guerra urbana. Primeiro, entre os próprios manifestantes: Um pequeno grupo de 20 militantes da Central Única dos Trabalhadores (CUT) foi expulso da concentração para o protesto contra o preço e a qualidade do transporte público. Os militantes foram encurralados na esquina da Avenida Presidente Vargas com a Praça Pio X, onde levaram socos e empurrões. Os antipartidários destruíram as bandeiras e todo o material do grupo vinculado à CUT e levaram os mastros como prêmio. Pressionados pela multidão que gritava “sem partido”, os militantes deixaram o local pela Rua da Quitanda. Já ao anoitecer, aconteceu um confronto entre os manifestantes e PMs próximo ao Estádio do Maracanã e à prefeitura do Rio. Os ativistas atearam fogo em carros.
Em São Paulo, num repeteco do Rio, militantes do PT e da CUT foram agredidos e vaiados por manifestantes que estavam na Avenida Paulista, próximo à Rua Haddock Lobo. Os petistas respondiam às agressões gritando: “Democracia”. Já os outros manifestantes, que não querem a presença de partidos políticos no local, gritavam: “oportunistas”. Na noite anterior, em São Bernardo do Campo, no ABC Paulista, já tinha ocorrido o mesmo. Manifestantes fizeram um ato em frente ao prédio onde o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem um apartamento.
Confusão em frente a estádio na Bahia
Em Campinas ocorreram confrontos entre manifestantes e a PM. Em Ribeirão Preto (SP), um rapaz de 18 anos morreu depois de ser atropelado por um carro que foi contra a multidão.
Em Salvador, o confronto foi à tarde, entre manifestantes anti-Copa e PMs, nas proximidades da Arena Fonte Nova, onde se realizava o jogo Nigéria X Uruguai. Houve pancadaria e lançamento de bombas de efeito moral. A estimativa é que 20 mil ativistas tenham participado. Os manifestantes queimaram lixeiras e pelo menos um ônibus. O corre-corre foi intenso. Em Belo Horizonte o movimento está dividido. Ocorreu uma briga entre militantes partidários e ativistas apartidários. Em Porto Alegre também houve registro de protestos.
(DC, 21/06/2013)
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