As demolições do bar da Praia Brava, no Norte da Ilha, com a derrubada do famoso Kioske do Pirata, trazem à tona uma discussão sobre a legalidade e o uso da costa de Florianópolis para levantar construções.
Como a prefeitura de Florianópolis deveria aproveitar o espaço do kiosque da Praia Brava na próxima temporada de Verão?
Atualmente, está em discussão o empreendimento do Parque Hotel Marina Ponta do Coral, na área central da cidade. Outros estabelecimentos conhecidos, como o Bar do Chico, no Campeche, também tiveram o mesmo fim do Kioske do Pirata, seja por falta de concessão, estar em área de preservação permanente ou por não ter autorização da União para uso de terras de marinha. Só no ano passado, a Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis (Floram) demoliu 25 construções.
Ainda há 60 processos em tramitação no órgão, e na Justiça Federal, há 50 casos envolvendo pedido de derrubada de obras. O caso da Praia Brava, mostra a morosidade da própria prefeitura em realizar licitações. Em 2008, venceu o prazo concedido para o uso da estrutura no balneário.
De acordo com a administração municipal, foi feito um acordo nos anos 1980 que concedeu aos bares o direito de utilizar o espaço por 20 anos. O convênio foi feito na época em que a exigência da concorrência pública não existia.
Área verde poderá ser ampliada para 52%
Outro diferencial da Capital, que impacta no grande número de obras irregulares e procedimentos de demolições, é o perfil ambiental da cidade. Por Florianópolis ser uma cidade cercada por mar e ser rica em belezas naturais, exige o cumprimento de regras para erguer e fiscalizar obras e limita as possibilidades da construção civil.
A Capital tem 43% de área de proteção permanente (APP), onde o Código Florestal brasileiro proíbe edificações. Conforme a Floram, o novo Plano Diretor, ainda em discussão, prevê a ampliação das áreas verdes para 52%. Polêmica em Florianópolis e no país é a área de marinha, os 33 metros entre território e a preamar — médias das marés altas, com base no ano de 1831.
Esta faixa pertence à União, mas com a falta de fiscalização, a área foi ocupada. Atualmente, ações do Ministério Público Federal questionam a regularização de uso destas estas terras.
Entrevistas
Walmor Alves Moreira Procurador da República
O procurador Walmor Alves Moreira, defende a demolição de todos os imóveis construídos depois de 1996 em área de marinha e de preservação permanente.
Diário Catarinense – O senhor é a favor das demolições de qualquer empreendimento se estiver sobre Área de Preservação Permanente (APP). O que pode vir abaixo na Ilha?
Walmor Alves Moreira — Todos os imóveis particulares construídos em terra de Marinha dentro de uma Área de Presevação Permanente (APP) depois de 1996, quando passaram a ser aprovadas as leis de crimes ambientais. Para quem construiu antes não teria o imóvel demolido, mas o proprietário teria que pagar um foro, como se fosse um IPTU da União, pelo uso da área.
DC — O que consta no mapeamento das terras de Marinha e quantos imóveis podem ser demolidos na Capital?
Moreira — O mapeamento foi feito por profissionais qualificados. O trabalho demandou sete anos. Existem áreas que estão dentro, mas não são de preservação permanente. Quando não há dano ambiental, o imóvel, mesmo construído há pouco tempo, não precisa ser demolido. Pelo levantamento, são mais de 300 imóveis em terras de marinha e APP.
DC — O que o senhor diria para as pessoas que têm imóveis em terra de Marinha ou APP?
Moreira — Todas serão notificadas pelo Patrimônio da União. Elas terão um prazo para apresentar defesa, mostrar seus documentos e terão que provar o ano em que o imóvel foi construído. Podem contratar um profissional para contestar a demarcação da área, caso discordem do mapeamento.
DC — Situações como a da Joaquina são polêmicas, a praia ficaria sem restaurantes e sem estacionamentos. Como o senhor vê esta situação?
Moreira — Os estabelecimentos comerciais foram notificados e têm um prazo para provar a data da construção. Os estacionamentos são diferentes, eles têm características de área pública. Não queremos ser injustos e demolir tudo. Mas de qualquer maneira, se a pessoa entrar com uma ação na Justiça, quem irá definir a situação é o Judiciário, e as sentenças, a favor ou contra, ficarão a cargo do juiz e como ele vê o caso.
Helio Bairros Presidente do Sinduscon da Grande Florianópolis
O presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil Florianópolis da Grande Florianópolis Helio Bairros é favorável a novos empreendimentos para atrair turismo e gerar renda para a região.
Diário Catarinense — É possível aliar preservação ambiental com o desenvolvimento e o crescimento da cidade como uma capital turística?
Helio Bairros — Esse conflito existe porque a questão ambiental passou a ser pauta de legislação entre as décadas de 1980 e 1990. O construtor não possui um amparo legal que demonstre quais são os limites de atuação. No Brasil, a gestão da inconsistência das legislação beira a insegurança jurídica. Uma solução para esse impasse são leis mais claras e que atuem dentro da realidade do município.
DC — O Ministério Público Federal encerrou um levantamento das áreas de Marinha e APP. Que critérios para demolição deveriam ser seguidos?
Bairros — É um caso complicado, pois a data imposta figura antes de muitas leis ambientais brasileiras. Com toda certeza, a omissão do poder público de fiscalizar as construções nessas áreas gerou essa insegurança.
DC — Muitos bares localizados nas praias do Sul, Leste e Norte da Ilha foram demolidos. Independente do motivo, na sua opinião a medida foi muito rígida?
Bairros — Essas questões envolvem muitas variáveis, mas a falta de fiscalização e a dubiedade da legislação ambiental sãos os principais fatores desse caos.
DC — Além das construções existentes, tem os projetos que esperam aprovação. Um exemplo é o Parque Marina e Hotel Ponta do Coral. Segundo a construtora, 65% da área será pública. O projeto está em análise há quatro anos e as licenças ambientais não foram emitidas. Como o senhor vê esta questão?
Bairros — Florianópolis necessita de um empreendimento como o da Ponta do Coral. Ele ajudaria a alavancar a imagem da cidade para o mundo, atraindo turistas com elevado poder de compra e investidores que ajudariam a trazer dinheiro novo para a região, gerando emprego e renda para as pessoas e impostos. A questão ambiental deve ser bem estudada e tratada para que o empreendimento tenha sustentabilidade.
Complexo turístico na Ponta do Coral
A proposta que prevê um hotel de luxo, marina e parque público com investimentos da ordem de R$ 275 milhões, em área nobre no Centro de Florianópolis, conhecido como Parque Hotel Marina Ponta do Coral, também é outra construção polêmica na Ilha mesmo antes de sair do papel.
O projeto vem sendo trabalhado há quatro anos e ainda aguarda as licenças ambientais, que estão em análise na Fatma. Se a obra for autorizada, o empreendimento pode ser concluído entre três e quatro anos. Desde 2010, o Ministério Público Federal (MPF) acompanha a análise das documentações. O procurador Eduardo Barragan pediu análises de diferentes órgãos e explica que existem pendências nos estudos de impacto ambiental e de vizinhança e que a alteração do zoneamento da área não teria seguido os trâmites legais:
— Em 2005, a Câmara de Vereadores de Florianópolis aprovou a mudança de área verde de lazer para área turística exclusiva, possibilitando construções como a da Hantei, e não seguiu todos os trâmites legais na época, como, por exemplo, passar pela Comissão de Justiça antes da votação.
Em nota, a Hantei afirma que o licenciamento ambiental do Parque Hotel Marina Ponta do Coral está seguindo seu trâmite regular e que desde 1989 o zoneamento da área permite a construção de hotéis como o proposto.
(DC, 08/07/2012)