Paredes descascadas, infiltrações, mofos, goteiras, além de grades de ferro enferrujadas que contribuem ainda mais para um cenário de abandono. Em alguns casos, lembram cadeias, mas na verdade são escolas. Esta foi a situação encontrada pela reportagem do Diário Catarinense em alguns colégios públicos de Florianópolis. Mesmo com o início do ano letivo tendo ocorrido a mais de dois meses, alunos precisam conviver com um ambiente nada acolhedor.
O DC visitou quatro escolas estaduais e uma municipal que há muito enfrentam problemas de infraestrutura. Dos 118 colégios estaduais da Grande Florianópolis, 67 tiveram que passar por algum tipo de reparo no ano passado. A informação é da Secretaria de Desenvolvimento Regional. O secretário Renato Hinnig reconhece o problema e garante que está buscando verbas para dar continuidade às reformas.
Além destas quatro unidades, ele mesmo cita outras que precisam de melhorias, como a Julio da Costa Neves, no Bairro Costeira, e a Irineu Bornhausen, no Bairro Estreito.
Levantar os desafios da educação da Capital e propor soluções é tema do próximo encontro do movimento Floripa Te Quero Bem, marcado para o dia 17. Na reunião, estarão representantes de entidades sociais, civis e políticas, além de profissionais da área e universidades. Uma pesquisa feita em 2010 com coordenadores pedagógicos da rede pública brasileira, encomendada ao Ibope Inteligência pela Fundação Victor Civita, revelou que falta de recursos e infraestrutura insatisfatória, seguidas por pouco envolvimento dos pais de alunos e da comunidade, estão no topo da lista de problemas das escolas.
Assim como ter professores motivados e material didático adequado, a infraestrutura também contribui para resultados positivos na aprendizagem. O coordenador de pesquisas do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), Antonio Augusto Batista, acredita que o aspecto físico influencia porque é muito melhor trabalhar num ambiente agradável do que em um sujo e desagradável.
— Por ser mais saudável e por um aspecto mais simbólico. Não é à toa que quando foram construídos os primeiros grupos escolares, era muito importante que eles fossem bonitos e imponentes, para serem valorizados pela população. Eles representavam a importância que a República dava para a educação brasileira — relata.
Para ele, as instalações influenciam tanto quem ensina quanto quem aprende.
— Não se pode ter escolas que se parecem mais prisões, completamente cercadas. Se a escola é um lugar feio, ninguém se sente muito bem, nem os professores nem os alunos.
Aderbal Ramos da Silva
Na sala da diretora da escola Aderbal Ramos da Silva, no Estreito, um cartaz estampa um prédio novo e moderno. Mas a realidade é diferente, como mostram as paredes descascadas. Segundo a diretora Suely Souza de Brum, o projeto de uma nova escola está pronto desde 2009, embora desde 2007 a comunidade tivesse esta reivindicação. A Secretaria da Educação já chegou a dizer que o projeto é prioridade.
— Tenho fé que esta obra comece neste ano. A gente confia — diz a diretora.
Hoje, o que mais chama a atenção, negativamente, é a pintura do prédio. O logotipo do Aderbal, bem na frente da escola, por exemplo, está descascando. Outros problemas são os desníveis das calçadas e as poças espalhadas pelo pátio. O DC flagrou um cadeirante tentando desviar delas.
Mas já foi pior. No ano passado, a Secretaria de Educação precisou fazer uma reforma emergencial no local. Salas de aula, cujo chão estava afundando, e o banheiro, passaram por reformas.
— O colégio tem condições, mas está com problemas. O aspecto é feio. Os jovens querem uma escola atraente, bonita. E, além disso, como o novo prédio poderemos ter ensino médio inovador ou escola em turno integral — diz a diretora.
Jurema Cavallazzi
Para o aluno que gosta de matar aula, a estrutura do Colégio Jurema Cavallazzi, no Bairro José Mendes, é uma aliada. Aos fundos, num terreno amplo, as grades de arame que complementam o muro baixo estão com buracos, por onde os estudantes podem entrar e sair a hora que bem quiserem.
Estranhos também podem ingressar na escola. Entre os problemas de infraestrutura do colégio, este, aparentemente simples de ser resolvido, é o que mais preocupa professores.
— Os estudantes fogem. Outro dia achamos um dos pequenos na rua. E se ele é atropelado? Falta gente para monitorar — relata Cátia Antunes Pereira, professora de educação física e integrante da Associação de Pais e Professores (APP).
Já se passaram dois verões e os sete aparelhos de ar climatizado viraram apenas um enfeite nas paredes das salas de aula. Apesar de instalados e prontos para serem usados, não podem ser ligados na tomada. Se isso fosse feito, causaria pane em todo o prédio. Isto porque o sistema elétrico da escola é de 1975, ano de fundação, e nunca passou por reforma. Outro dia, o ventilador da cozinha dos professores pegou fogo, caindo em cima do botijão de gás. Por sorte, nada aconteceu.
Em dias de chuva, os alunos têm educação física na sala de aula. A única quadra do colégio é descoberta. O ginásio é uma vontade antiga e foi solicitado há pelo menos nove anos. O terreno espaçoso seria suficiente para abrigar, além do ginásio com arquibancadas, outra quadra. O governo acenou para a escola sobre uma possível reforma.
Simão Hess
Um matagal cresce dentro da Escola Simão Hess, no Bairro Trindade. A altura ultrapassa os alunos menores. Funcionários pediram à Secretaria de Desenvolvimento Regional que o mato fosse cortado porque até mesmo esse tipo de serviço precisa ser solicitado, e nada foi feito.
As aulas de educação física em dias de chuva ficaram perigosas dentro do ginásio. Infiltração e goteira criaram uma poça na quadra. Para evitar que os alunos escorreguem, a professora Andrea de Jesus Silva colocou um colchão durante a partida de futebol. Assim, as crianças sabem que precisam desviar daquele ponto da quadra.
A colégio também está com problemas nos forros do teto, que caíram, como o da biblioteca e o da sala de informática. Parte de um dos problemas já foi resolvida. Para as salas de aulas sem ventiladores, aparelhos foram enviados ao colégio, que também ganhou bebedouros. Mas eles precisam ser instalados. Essa etapa exige outro pedido, que já foi feito.
A solicitação para a cobertura das quadras esportivas também está na lista de espera. O governo prometeu alguns reparos para este mês. Seriam trocados telhados e pisos dos corredores.
Laura Lima
Uma ala da Escola Laura Lima, no Bairro Monte Verde, foi interditada pelos próprios funcionários. O forro de algumas salas afundado, os estalos do movimento do teto durante as aulas e as goteiras em dia de chuva deixavam professores e alunos preocupados.
Uma outra ala chegou a ser interditada pela Defesa Civil. Esta foi reformada e hoje é usada por alunos dos anos iniciais do fundamental. Os banheiros também passaram por obras.
As colunas do prédio são um indício de que a estrutura da Laura Lima vai mal. O concreto foi comido e as vigas de ferro estão à vista. Os buracos nos forros dos corredores também são uma mostra do que o tempo tem feito com o prédio.
Nos fundos, há duas quadras esportivas improvisadas. Onde as crianças jogam futebol, buracos tiveram que ser tapados com cimento pelos integrantes das associação de pais e professores, para evitar acidentes.
O que diz a secretaria regional?
O secretário regional, Renato Hinnig, informa que reparos emergenciais estão sendo feitos em escolas que no começo deste ano tiveram problemas com vendavais e tempestades. Estão sendo investidos R$ 3,4 milhões.
Além disso, ele está tentando a liberação de mais R$ 5 milhões, em caráter emergencial, junto à Secretaria de Estado da Educação para novas reformas em outras 20 unidades.
De acordo com o secretário, todas as escolas citadas passarão por reparos. No caso da Aderbal Ramos, Hinning observa que talvez seja necessário construir um novo prédio.
O secretário acrescenta que, no ano passado, das 118 escolas estaduais da Grande Florianópolis, 67 passaram por algum tipo de reparo.
Mâncio Costa
Os problemas de estrutura não estão só nas escolas da rede estadual. Na municipal também há unidades precisando da atenção. É o caso da Escola Básica Municipal Mâncio Costa, no Bairro Ratones, cujo prédio está em más condições.
Chove dentro da maioria das salas de aula. Os fios elétricos não têm proteção e estão à vista por toda a escola, nas mesmas paredes onde a infiltração toma conta. No chão, o fio-terra também está à mostra. A pintura das paredes está descascada. E o refeitório não possui vigas suficientes de sustentação da laje.
— Como você vai ter prazer em estudar assim, desse jeito? — lamenta o diretor Gilberto Borges.
No ano passado, a escola chegou a ser notificada pelo Conselho Municipal de Alimentação Escolar por falta de condições no refeitório. Segundo Gilberto, a escola fica de mãos amarradas, sem ter o que fazer.
O que diz a secretaria municipal?
O diretor de Infraestrutura da Secretaria Municipal de Educação, Maurício Amorim Efe, explica que a ideia da prefeitura é construir um novo prédio para a escola. Até lá, porém, o problema das más condições da estrutura deve ser resolvido com uma reforma emergencial — a iniciar no fim do primeiro semestre deste ano. A ideia é desativar o prédio assim que o novo ficar pronto.
O terreno de 7,6 mil metros quadrados — no próprio bairro — foi comprado no fim de 2011, ao valor de R$ 350 mil, e a empresa que fará o projeto da nova escola já assinou contrato.
A perspectiva é que a obra seja concluída em até dois anos. O novo espaço terá 12 salas de aula e laboratórios de informática e de ciências, além de auditório.
Movimento Floripa Te Quero Bem
O comitê
l Formado por representantes de entidades de classe, sociais e universidades de Florianópolis.
l Foi criado pelo Grupo RBS, em parceria com o Instituto Padre Vilson Groh (IVG), o Instituto Comunitário Grande Florianópolis (ICom) e o Instituto Guga Kuerten (IGK).
As reuniões
l 17 de abril — Educação
l 2 de maio — Segurança
l 16 de maio — Mobilidade urbana
l 30 de maio — Planejamento urbano
l 13 de junho — Fechamento
A ação
l A consultoria Silva Paes será contratada para fazer o levantamento dos projetos prioritários para a cidade nas cinco áreas de atuação.
l Os projetos serão discutidos e avaliados pelos membros do comitê durante as reuniões.
l As conclusões irão compor um documento chamado de Subsídios para a Construção do Plano de Metas para Florianópolis, com propostas concretas e projetos, que será encaminhado para os candidatos à prefeitura de Florianópolis.
(DC, 14/04/2012)