Artigo escrito por Jean Marc Sasson – Advogado com especialização em gestão ambiental pela COPPE/UFRJ (Ambiente e Energia, 12/09/2011)
Na coluna sobre biomassa, publicada em 28 de junho, mencionei que hoje uma pessoa produz semanalmente 5 quilos de resíduos ou 40,5 toneladas de lixo produzidos ao longo de 75 anos.
Publiquei ainda que em 2010, o Brasil produziu 61 milhões de toneladas de resíduos, 6,9% a mais do que em 2009. Deste montante, apenas 57,6% teve destinação adequada e os 42,4% restantes foram diretamente para o lixão.
Assim, com o advento da Política Nacional de Resíduos Sólidos, Lei 12.305/2010, determinou-se que até 2014 os municípios exterminem os seus lixões. Contudo, após ler os dados do DCI (dci.com.br), percebi que esta meta é quase inalcançável. Segundo o site informativo, 63% dos municípios brasileiros enviam seus resíduos sólidos para lixões, o que contribui para a contaminação do solo e da águas subterrâneas, enquanto apenas 27,68% dão a destinação correta, enviando para aterros sanitários.
Além disso, quando se fala em reaproveitamento dos resíduos, os índices são ainda piores: 59,3% dos municípios não têm sistema de coleta seletiva. Apenas 3,79% dos municípios têm unidade de compostagem de resíduos orgânicos, 11,56% possuem sistema de triagem de resíduos recicláveis, e 0,61% têm unidade de tratamento por incineração; 70% dos municípios possuem catadores de lixo e materiais recicláveis, mas em 79% das cidades a categoria não tem organização oficial.
Destes índices todos o que me chama mais atenção é o percentual de municípios com catadores. Se pensarmos que o Brasil tem 5.561 municípios, teríamos 3.893 municípios com catadores de lixo. Apesar de o Brasil serv considerado um país emergente, tem ainda 8,5% da sua população abaixo da linha da pobreza. De fato, isso contribui para a existência dos catadores. Mas acredito que a educação e conscientização ambiental é o principal fator.
A verdade é que diante de números insólitos, os catadores adquirem fundamental importância no sistema de reciclagem atual. São eles que se lançam no ambiente urbano em busca de materiais recicláveis. São eles que separam, em meio a montanhas de resíduos nos lixões e em condições desumanas, o que pode ou não ser reciclado.
Embora eu me preocupe e busque informações a respeito de ações socioambientais, só fui perceber a verdadeira realidade destes indivíduos após ver o excelente documentário Lixo Extraordinário, postulante ao Oscar. Nele o artista plástico Vik Muniz conseguiu demonstrar veementemente a vida e as situações cotidianas vividas por estes catadores, além da importância destas pessoas no processo de reciclagem no lixão de Gramacho, no Rio de Janeiro, o maior lixão da América Latina e um dos maiores do mundo.
Infelizmente elas não estão ali pela consciência ambiental, e sim por ser a única fonte de renda. Os cerca de 5 mil catadores de Jardim Gramacho, segundo a prefeitura de Caxias (RJ), possuem uma renda mensal de R$ 680, podendo os mais experientes superar R$ 1 mil por mês. Por esta razão, eles temem não ter como sobreviver após 2014. O lixo é a sua única fonte de renda. Mas do que nunca, a associação será fundamental neste processo.
Hoje o resíduo sólido é um dos piores problemas urbanos. Mas ele é também uma solução. Não por ser uma fonte energética. Mas continuando a ser a fonte de renda destes catadores.
Neste processo de mudança de implantação de aterros sanitários, não haverá prejuízo à reciclagem. Pelo contrário. A reciclagem e o trabalho dos catadores adquirirão um papel ainda mais forte. O resíduo antes de ser depositado no aterro sanitário passará por um processo de triagem. Continuarão a separar os materiais recicláveis. O rejeito, aquilo que não puder ser reciclado, irá para o aterro sanitário ou poderá ser incinerado.
Para isso, os catadores deverão ser treinados e capacitados, como, por exemplo, a manusear corretamente os resíduos, conscientizá-los da importância ambiental do trabalho, e porque não, educá-los. Ensiná-los a ler e escrever. Aproveitar este processo de transformação social que incluirá um ambiente de trabalho substancialmente mais salubre do que os atuais. Fornecimento de equipamentos e vestimentas adequadas à função exercida. Formalização desta força trabalhista, obtendo carteira de trabalho assinada e demais direitos trabalhistas.
Infelizmente, nem todos os catadores deverão ser absorvidos. Em razão disso, não há duvidas que problemas sociais surgirão. Ausência de renda e educação é um passo para a marginalidade. É por isso que quando falamos em sustentabilidade os tripés devem sempre estar juntos. O ambiental está estritamente ligado aos fatores econômico e social. Políticas sociais deverão estar presentes nestes próximos anos para evitar problemas colaterais e o aumento da pobreza. Acredito que o bolsa família resolveria parte destes problemas.
Com certeza, você, diante do seu computador, e eu não sabemos a verdadeiramente a dificuldade que estes catadores enfrentam. É uma realidade muito distante da nossa. É certo, porém, que este nicho foi criado diante do acúmulo de resíduos urbanos despejados por nós e a ausência de políticas socioambientais públicas. Apesar disso tudo, acredito que estamos no caminho certo. A lei foi criada, lixões serão extintos, os resíduos ganharão a destinação correta e nós um meio Aabiente melhor.
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