Material foi retirado de nau espanhola que ia para o Chile e afundou em SC
Não é caça ao tesouro, mas os pesquisadores que retiraram, ontem, mais três peças de uma embarcação espanhola do século XVI, naufragada perto da Ilha de SC em 1583, não negam a importância do resgate. – Não há registro de naufrágio tão antigo nas Américas – diz o coordenador e pesquisador do Projeto Barra Sul, responsável pela operação, Bruno Germer.
A equipe, com estudiosos e integrantes da Marinha, retirou uma pedra de cerca de 200 quilos, com inscrições em latim, citando o Rei Felipe II, e dois ornamentos em formato esférico. Registros históricos apontam que as peças de marcação de território iriam para uma fortaleza no Estreito de Magalhães, no Chile.
Não se sabe ainda quantos eram os tripulantes, mas, segundo os pesquisadores, ninguém morreu. Os ocupantes, na maioria engenheiros e construtores, foram remanejados para as 13 embarcações que conseguiram parar nas terras catarinenses. A esquadra – chamada de Expedição Estreito de Magalhães – deixou a Península Ibérica com 23 naus.
Pela localização estratégica e pelos índios da região serem pacíficos, era comum as embarcações atracarem em SC antes de seguir viagem. Mas as condições do tempo, a geografia acidentada – com bancos de areia – e as dificuldades de navegação levaram a muitos acidentes. Só no século 16, foram 10 naufrágios oficiais.
Um canhão de mais de duas toneladas é a próxima peça a ser retirada. A antropóloga Deisi Eloy de Farias explica que todo resgate exige cautela.
– Tem muito material e cada um dá uma leitura diferente do que acontece – destaca.
As peças devem ser enviadas para dessalinização e higienização no laboratório da Unisul. A expectativa é que o material coletado possa ser exposto em museu.
(Por Gabrielle Bittelbrun, DC, 09/08/2011)
Pesquisadores de SC apresentam novas peças do que seria o mais antigo naufrágio das Américas
Pedra triangular que homenageia rei Filipe II da Espanha foi localizada próximo ao canal da Baía Sul, em Florianópolis
Para marcar território, descobrir novo caminho às Índias e colonizar o Chile, região rica em ouro e prata, o rei Filipe II da Espanha (1527-1598) ordenou expedições marítimas em direção à América do Sul. Era uma época de guerra em alto mar. Corsários ingleses, “piratas” oficiais da rainha Elisabeth, navegavam pelas águas da América do Sul com autorização para atacar e roubar ouro e prata de embarcações de outros países.
Para se proteger dos ataques, segundo a pesquisadora Liliane Motta da Silveira, rei Filipe II mandou construir duas fortalezas no Estreito de Magalhães, extremo Sul chileno. Em 1582, uma expedição com 23 naus (embarcações de carga) saiu da costa espanhola rumo ao Chile transportando o material. Dez delas afundaram pelo caminho. A Ilha de Santa Catarina, na época conhecida como Porto dos Patos porque os navegadores confundiam os biguás, comuns na região, com patos, era o último ponto de abastecimento antes do destino.
Ao entrar pelo canal da baía Sul, perto da praia de Naufragados, que não tem esse nome por acaso, a nau San Esteban, comandada por Pedro Sarmiento de Gamboa, não resistiu à geografia acidentada do leito marinho e naufragou. Todos sobreviveram, entre eles o famoso engenheiro militar italiano Battista Antonelli, mas o material para a construção das fortalezas no Chile está há mais de 400 anos espalhado no fundo do mar.
A história contada nos livros começa a ganhar vida com a localização dos vestígios do naufrágio. Ontem à tarde, pesquisadores do projeto Barra Sul, que faz pesquisas arqueológicas subaquáticas no Sul da Ilha, apresentaram uma pedra triangular encontrada a dois quilômetros da praia do Sonho, em Palhoça. Nela, estava inscrito em latim “Maximvs Phillipus Catholicvs Hispaniarum Indianiarum Rex Anno 1582”, que significa “Filipe maior rei católico da Espanha e da Índia ano 1582”.
“Acreditamos que a pedra seja uma espécie de marco para homenagear o rei Filipe II”, diz Liliane. Conforme a pesquisadora, a peça reforça a tese do naufrágio da nau espanhola em águas catarinenses em 7 de janeiro de 1583, que pode ser o mais antigo naufrágio já descoberto nas Américas.
Daniel Queiroz/ND
Inscrição em latim “Maximvs Phillipus Catholicvs Hispaniarum Indianiarum Rex Anno 1582”
Canhão de duas toneladas será o próximo
A pedra triangular, de 1,25 metros de comprimento e 200 quilos, será levada para a Unisul (Universidade do Sul de Santa Catarina), em Tubarão, onde será analisada, e os dados, especialmente o ano (1852), confirmados. Em junho, a equipe do projeto Barra Sul havia apresentado outra pedra resgatada do fundo do mar. “Esses são os primeiros vestígios. Tem muito material lá embaixo que pode corroborar a hipótese ou destoar. Precisamos de mais dados para comprovar”, afirma a arqueóloga Deise Scunderlick Eloy de Farias.
Estimasse que a nau San Esteban, de 30 metros de comprimento e 30 de altura (contando até a ponta do mastro), pesava 500 toneladas. O grupo mapeou uma área de 400 quilômetros quadrados entre as praias de Naufragados, Sonho, Pinheira e Ribeirão da Ilha, onde estão espalhados os vestígios do naufrágio.
De acordo com o diretor-executivo do projeto, Gustavo Corrêa, não há como saber se o material encontrado até agora pelos mergulhadores é de apenas uma embarcação ou de naufrágios sucessivos. “O próximo objeto a ser retirado do fundo do mar é um canhão de bronze de duas toneladas. Será necessário muito empenho para dar mais segurança. Provavelmente será no verão”, diz.
Intenção é abrir material para exposição pública
O projeto Barra Sul surgiu em 2005 quando o diretor Gustavo Corrêa mergulhava pelas águas do Sul da Ilha e descobriu uma âncora que, mais tarde, comprovou-se ser de um galeão (barco militar) espanhol do século 16. Com autorização dos órgãos reguladores, foi formada uma equipe de profissionais que encontrou três possíveis sítios arqueológicos no fundo do mar.
O projeto tem apoio da Fapesc (Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina) que investiu quase R$ 985 mil e acompanhamento do Iphan (Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional). Cerca de 15 profissionais, entre mergulhadores, historiadores e arqueólogos, participam da pesquisa que pode levar até 20 anos.
Segundo o coordenador Bruno Henrique Germer, a intenção, após o recolhimento do material e os estudos necessários, é abrir as peças para exposição em um museu público. O Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina já demonstrou interesse em receber e cuidar do material que é patrimônio da União.
(Por Maiara Gonçalves, ND, 09/08/2011)
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