No dia em que a Ponte Hercílio Luz completa 85 anos e quase 20 sem poder ser usada nem mesmo por pedestre, o governo avança alguns peões neste jogo de xadrez que é a complexa obra de restauração da estrutura, orçada em R$ 170 milhões. A peça de maior impacto é a postura em tom mais incisivo do governo Raimundo Colombo, que promete terminar a reforma neste mandato. A data em discussão atualmente entre o Consórcio Monumento, responsável pela obra, Secretaria de Infraestrutura é julho de 2014, um atraso de dois anos no prazo de conclusão do atual contrato.
Soma-se ao complicado jogo, ainda, o projeto para uma difícil captação de recursos por meio da Lei Rouanet, que deve ser entregue hoje, às 15h, ao governador Raimundo Colombo. A partir da assinatura do governador, o documento segue para ser aprovado pelo Ministério da Cultura. Se aprovado , o Estado pode sair atrás do investimento junto a empresas. Uma jogada difícil diante do alto valor que deverá ser apresentado ao MinC.
Também hoje, o governador anunciará um projeto de lei que será encaminhado à Assembleia Legislativa, criando um fundo específico à Ponte Hercílio Luz para receber o dinheiro captado à ponte. Com isso, os investimentos não se embolam a outros do orçamento estadual. Ficam reservados neste novo fundo, que precisará ser aprovado pelos deputados.
VÃO CENTRAL SUSPENSO EM 2012
No seminário realizado onte, na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), um dos destaques da discussão foi a criação da comissão de acompanhamento da obra com representantes do Ministério Público, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Tribunal de Contas do Estado e Assembleia Legislativa. A ponte deverá ter, ainda, um museu e um site só para ela, com câmeras transmitindo simultaneamente o trabalho de restauração e com atualizações sobre receita e despesa da obra.
As iniciativas foram anunciadas pelo secretário Valdir Cobalchini durante o seminário sobre a restauração, que aconteceu na UFSC, ontem, e foi organizado pela Associação Amigos da Cidade. Um dos momentos mais aguardados do encontro foi a palestra do engenheiro Khaled Mahmoud, consultor internacional do projeto de restauração. Khaled mostrou imagens sobre a base de sustentação das torres principais:
– Apesar de boa parte das fissuras não estar visível porque a ponte está pintada, a corrosão existe por toda a superfície das bases de apoio. Infelizmente, colapso de pontes não é coisa do passado – afirmou, enquanto mostrava imagens de 2007 da queda de uma ponte sobre o Rio Mississipi, nos Estados Unidos.
Por conta do alto grau de deterioração das bases, a Hercílio Luz não pode ser restaurada a partir da sustentação por cabos de aço presos na parte superior das torres, que essas ficariam sobrecarregados. Este era o projeto inicial, mas foi alterado em 2008 para a construção de estrutura de sustentação provisória. O engenheiro reafirmou que a ponte só estará segura quando for apoiada na estrutura provisória, o que deve acontecer em junho do ano que vem, de acordo com o novo cronograma da obra.
Dois professores do departamento de engenharia da UFSC, Ivo Padaratz e Moacir Carqueja, defenderam a desmontagem da estrutura e o direcionamento dos recursos a outros setores como a manutenção da Colombo Salles e Pedro Ivo. Mas a proposta não teve repercussão.
PAPEL DA PONTE NA MOBILIDADE URBANA
Outro debate aprofundado no encontro foi sobre a funcionalidade da Hercílio Luz. Paulo Meller, presidente do Deinfra, afirmou que a ponte integra as soluções estudadas para a mobilidade da Grande Florianópolis, que compreende quatro cidades e 800 mil habitantes. O assunto girou em torno do uso para transporte de massa, pedestres e ciclistas.
O Estado assinou, esta semana, com a Prosul, o contrato para execução do estudo de viabilidade do transporte de massa que integraria Biguaçu, São José, Palhoça e Florianópolis. Para tanto, será preciso saber como seria a quarta ligação entre Ilha e Continente e o papel que a Hercílio Luz teria nesse processo.
FUNDO ESPECÍFICO E A LEI ROUANET
Dos R$ 170 milhões necessários para recuperação da ponte, R$ 18 milhões devem ser gastos esse ano com recursos do Estado. Segundo o presidente do Deinfra, Paulo Meller, o montante do ano está assegurado. E mesmo buscando recursos em outras frentes, o governo pretende captar boa parte do restante (R$ 152 milhões) com empresários via Lei Rouanet, o que, se concretizado, garantirá dinheiro novo nas obras até o início do ano que vem.
Não há precedentes no Brasil de se conseguir um valor tão elevado pela Lei de Incentivo à Cultura na recuperação de um patrimônio histórico. Para se ter uma ideia, entre os maiores valores aprovados estão R$ 50 milhões para a restauração do Theatro Municipal do Rio, e R$ 25 milhões para a Catedral de Brasília.
Outra fonte para se conseguir recursos é o governo federal, além de mais contrapartida do próprio governo do Estado. Como essa conta será fechada ainda não se sabe:
– Que empresário não vai querer ter sua empresa associada à restauração da ponte, que é o símbolo mais lembrado pelos catarinenses? Vamos tentar captar tudo o que der – disse Valdir Cobalchini, secretário de Infraestrutura.
Em paralelo, o governo deve buscar, recursos do Ministério dos Transportes, das Cidades, Fundo Nacional da Cultura, além de bancos como BID e BNDES. Todo recurso para a ponte ficará armazenado num fundo específico. O projeto de lei da criação do fundo será apresentado, hoje, ao governador. O fundo não tem relação apenas com a lei Rouanet. Qualquer pessoa que quiser fazer doações poderá depositar nesse fundo.
BARRAS DE OLHAL OU CABOS DE AÇO?
Na semana seguinte à Páscoa, Paulo Meller, presidente do Deinfra, recebeu um relatório com a proposta de troca das barras de olhal por cabos de aço, feita por técnicos das empresas que integram o Consórcio Monumento. Hoje, a ponte é suspensa por quatro sequências de barras de olhal. São 360 barras no total.
Entre os argumentos, a maior segurança dos cabos em relação às barras de olhal. Uma barra quebrada significa perda de 25% da força de sustentação da ponte. Uma fissura num cabo, composto por milhões de fios de aço, representa menos de 1%. Os cabos têm vida útil de 100 anos, contra 25 das barras de olhal. São mais baratos e de mais fácil manutenção.
A substituição está sendo amadurecida pelo Deinfra, mas já se anuncia como uma futura polêmica. A ponte é tombada como patrimônio nacional. O Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional determina que ela seja restaurada da mesma maneira como foi concebida:
– A troca das barras por cabos faria a ponte voltar ao conselho consultivo do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional para se discutir se ela permaneceria tombada – afirmou Mario Alves, técnico do Iphan.
(Por Cris Vieira, DC, 13/05/2011)
Um passeio sobre a ponte
Depois de tanto ver a ponte no meu dia a dia, passei a me acostumar com a presença da Hercílio Luz e, muitas vezes, passo por baixo dela e nem faço caso. Mesmo assim, em algumas conversas entre amigos, a ideia de atravessá-la surgia. Como será que é? É alto mesmo? Mas como vamos fazer?
A oportunidade de cruzar os 821 metros do cartão-postal veio quando eu nem mais pensava em fazer isso. A pauta caiu no meu colo por volta das 16h, há dois dias. Fui e, meia hora depois, lá estava eu na cabeceira da Ponte Hercílio Luz.
Não sei se a preocupação de trazer um bom material para a Redação tirou a adrenalina que eu esperava ter. Mas, à medida que caminhava sobre a passarela, me ocupei mais em observar e filmar os detalhes: as lâmpadas que me encantaram quando vi a ponte pela primeira vez, as tábuas rachadas, as frestas por onde se vê a água 31 metros abaixo, a estrutura de ferro oxidada pelos 85 anos.
O vento soprava fraco naquele fim de tarde e pude aproveitar, de um local mais do que privilegiado, o pôr do sol laranja e intenso. Poucos puderam ver tal cena desde 1991, quando a ponte foi fechada, e, depois de cruzar pela primeira vez a baía sobre a Hercílio Luz, fica difícil acreditar que isso será possível tão cedo. Percebe-se que há muito por fazer, muito ferro a ser rebitado. Mas a verdade é que o pôr do sol fica mais bonito com a ponte do que sem ela.
(DC, 13/05/2011)
Um protesto e uma proposta para a ponte
Da coluna de Carlos Damião (ND, 13/05/2011)
Por que não transformar a Hercílio Luz, depois de recuperada, num corredor cultural para beneficiar a população?
No dia do aniversário (85 anos) da Ponte Hercílio Luz, publico o desabafo de uma colaboradora florianopolitana, que prefere não se identificar: “Ultimamente Florianópolis tem sido vítima de uma série incrível de ações equivocadas por parte do poder público. A dimensão dos desacertos tem sido de tal monta que parece que uma epidemia do mal assola nossa terra através da praga maior que infesta os poderes. O trânsito caótico carece de uma atenção moderna e especializada, que pense soluções amplas e macro regionais. Entretanto, de todos estes desatinos, o maior nos parece a caso da nossa querida ponte Hercílio Luz. Existe crime maior do que colocar sobre o nosso mais importante patrimônio cultural um metrô de superfície?! É claro que o metrô é importante, por isso mesmo devem ser buscadas alternativas para a sua passagem. Mas na ponte, não”.
Corredor
Prossegue a leitora: “Nossa bela ponte deveria tornar-se um grande corredor cultural abrangendo as suas cabeceiras, otimizando e integrando o parque da Luz e recuperando a cabeceira continental, hoje degradada, incluindo o belo viaduto da década de 50”.
Visão e vontade
E finaliza: “Arborização e jardinagem, ciclovias, pistas para caminhadas, apresentações, enfim toda uma gama de atividades e equipamentos voltados para o lazer da comunidade. Tenho certeza que Florianópolis agradeceria. Difícil? Impossível? Não, é perfeitamente exequível. Basta visão e vontade política”.
Providências
No dia do aniversário da ponte, o governador Raimundo Colombo vai conhecer o projeto que será encaminhado ao Ministério da Cultura para captação de recursos via Lei Rouanet. Ao mesmo tempo encaminhará à Assembleia Legislativa uma lei criando um fundo para os recursos que serão destinados às obras da ponte. Colombo também anunciará nesta sexta-feira (13) a comissão de acompanhamento das obras.
Coordenação
Todas as ações para concluir a reforma da ponte são capitaneadas pelo secretário Valdir Cobalchini, da Infraestrutura, que defende as obras de recuperação do patrimônio, independentemente das discussões sobre mobilidade urbana. Ele entende que a ponte é um monumento histórico do país.
Obra de arte
No seminário sobre a Ponte Hercílio Luz, realizado nesta quinta-feira (12), na Universidade Federal de Santa Catarina, o presidente do Deinfra (Departamento de Infraestrutura de Santa Catarina), engenheiro Paulo Meller, observou: “Além de patrimônio, a ponte se compara a uma obra de arte, de valor incalculável”. Pretendeu, com isso, rebater as críticas ao custo da recuperação.
Memória
“Ponte Hercílio Luz – A Tragédia Anunciada”, do jornalista Maurício Oliveira, terá nova edição lançada nesta sexta-feira (13), na Feira do Livro, às 18h. Maurício recuperou a história da ponte em linguagem jornalística, com seu texto de reconhecida qualidade. Selo da Insular.
Restauração da ponte Hercílio Luz poderá ficar pronta em 2014
No aniversário de 85 anos do cartão postal de Florianópolis, governo do Estado anuncia novas datas e medidas em busca de recursos
No aniversário de 85 anos de inauguração da ponte Hercílio Luz, patrimônio histórico e artístico reconhecido nacionalmente, a Secretaria de Estado da Infraestrutura anuncia uma boa notícia aos catarinenses: a restauração do cartão postal de Florianópolis estará pronta no primeiro semestre de 2014. Este é apenas um dos anúncios informados pelo secretário da pasta, Valdir Cobalchini, na manhã de quinta-feira (12) durante o 3° Seminário sobre a Recuperação da Ponte Hercílio Luz e que devem ser formalizados nessa sexta-feira (13) em reunião com governador do Estado, Raimundo Colombo.
Apesar do novo prazo para entrega da restauração não ser oficial, e pela complexidade da obra dificilmente haverá uma data com 100% de precisão, é um alento aos organizadores e participantes do seminário que foi criado para incentivar o governo do Estado a se posicionar com mais firmeza quando o assunto é a ponte Hercílio Luz. Hoje, o secretário Cobalchini entregará ao governador um plano que mostra como o Estado conseguirá os R$143 milhões que restam para concluir os custos da obra. Estas informações também foram adiantadas na quinta-feira durante o seminário.
De acordo com o secretário o primeiro passo será marcar uma reunião com a ministra da Cultura Ana de Hollanda. Com ela, o Estado precisa conseguir uma autorização para buscar os R$143 milhões para a obra via iniciativa privada por meio da Lei Rouanet (lei federal, n° 8.313, de incentivo à cultura que possibilita as empresas aplicarem uma parte do imposto de renda devido em ações culturais).
Com a autorização em mãos a Secretaria de Infraestrutura de Santa Catarina irá estabelecer uma agenda de reuniões com as cem maiores empresas privadas e estatais do país já listadas pelo governo do Estado segundo o secretário Cobalchini. “Fizemos uma lista das empresas que têm mais chance e interesse em contribuir com a restauração da Hercílio Luz e esperamos que a maioria delas nos ajude”, diz.
Solução para restaurar a ponte não deve mudar
O presidente do Deinfra (Departamento Estadual de Infraestrutura), Paulo Meller, que também participou do seminário, afirmou aos participantes – a maioria engenheiros e estudantes de engenharia – que a maneira como a ponte está sendo recuperada não irá mudar e é a melhor saída se tratando de ponte pênsil.
O sistema de recuperação do vão central é basicamente construir uma ponte embaixo da ponte. A estrutura de sustentação provisória será construída sob o vão central e ficará rente a ele para escorar a Hercílio Luz enquanto ela é recuperada. O sistema de escoramento foi idealizado por Khaled Mahmoud, consultor internacional de pontes pênsis que esteve no seminário. “Serão pelo menos dois anos para concluir esta etapa”, prevê o presidente do Deinfra.
Construir uma nova ou reforma a antiga?
No debate que encerrou o 3° Seminário sobre a Recuperação da Ponte Hercílio Luz os engenheiros e professores da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), Edson da Rosa, Ivo Padaratz, Moacir Carqueja, Mário Coelho, Carlos Abraham e Honorato Tomelim levantaram as discussões em torno das diferenças de custos entre construir uma nova ponte ou reformar a antiga. Paulo Meller, do Deinfra, afirmou que com o dinheiro da restauração da Hercílio Luz era possível construir quase duas pontes novas, mas que se optou pela reforma por se tratar de um monumento. “A Hercílio Luz é para Florianópolis como o Cristo Redentor é para o Rio de Janeiro. Não se trata apenas de uma estrutura, mas de um patrimônio”, explica.
Para Moacir Carqueja, do Departamento de Engenharia Civil da UFSC, pela complexidade da obra, seria melhor derrubar a antiga e construir uma nova igual a já existente. “Seria mais viável, pois poderia custar menos e ficar pronta mais rápido”, diz.
Programação do aniversário é cancelada
A programação de aniversário dos 85 anos da ponte Hercílio Luz que estava sendo organizada pela Associação Amigos da Cidade foi cancelada em razão da previsão de chuva para a sexta-feira (13). Segundo o secretário-geral da associação, Luis Galvão, as atividades que seriam realizadas na cabeceira da ponte a partir das 15h não irá ocorrer. Estava previsto abraço simbólico na Hercílio Luz, o corte de um bolo de 50kg e apresentações culturais.
(Por Aline Rebequi, ND, 13/05/2011)