Depois de obter o maior avanço em 24 anos em 2010, desafio é reduzir ritmo para manter crescimento contínuo do país
Um dia depois de ter elevado o juro básico em meio ponto percentual para frear a economia, o governo anunciou ontem que o país registrou no ano passado o maior crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), indicador que mede as riquezas do país, desde 1986, o melhor desde o Plano Cruzado.
A aparência do aumento expressivo de 7,5%, no entanto, é de uma fotografia velha: a economia terminou o ano em desaceleração e, em 2011, o desafio de crescer entre 4,5% e 5% esbarra num cenário externo adverso e numa ameaça cada vez mais real de inflação acima do centro da meta, que é de 4,5%.
O próprio ministro da Fazenda, Guido Mantega, reconheceu ontem que o “crescimento chinês” registrado pelo IBGE é insustentável e indesejável.
– Mostra a capacidade produtiva da economia brasileira. Vamos continuar crescendo, mas com equilíbrio para afastar problemas de abastecimento e de inflação – disse o ministro.
O avanço de 2010 foi motivado principalmente pela indústria e pelo consumo das famílias. A economia, porém, já está esfriando, diz o economista-chefe do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial, Rogério Cézar de Souza:
– O que não quer dizer que 2011 será ruim. Mas para crescer de modo sustentável, sem inflação, é preciso melhorar questões ligadas à infraestrutura.
A desaceleração provocada pelo governo já é visível: a produção industrial, segundo o IBGE, registrou apenas 0,2% de ganho em janeiro, após cair 0,8% em dezembro. A inflação, atacada com um corte de gastos de R$ 50,1 bilhões detalhado na terça-feira pelo governo e com o segundo aumento dos juros na era Dilma, também não dá sinais de trégua.
Em nota, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) alertou que causa preocupação o recuo da atividade industrial no segundo semestre do ano passado. Para a entidade, o risco de uma nova retração econômica deve ser levado em conta pelo governo na condução da política de combate à inflação. Entre as centrais sindicais, CUT e Força Sindical também criticaram os juros “estratosféricos” que travam o crescimento.
Expectativa de resfriamento
Ainda assim, espera-se mais esfriamento. Ontem, em encontro em Brasília, a presidente Dilma Rousseff e o diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Dominique Strauss-Kahn, conversaram sobre os riscos do superaquecimento da economia e a necessidade de crescimento “lento e estável” dos países emergentes:
A própria presidente, cedo da manhã, chegou a comentar, alegre:
– O pibão foi bom – disse, quando se deslocava para a rampa do Palácio do Planalto a fim de recepcionar o primeiro-ministro do Timor Leste, ao responder a pergunta de um jornalista.
Mais tarde, em entrevista coletiva à imprensa, elogiou o crescimento de 7,5% da economia, mas reforçou que para este e os próximos anos espera taxas em torno de 4,5% a 5%. Dilma reforçou, ainda, a preocupação do governo com a estabilidade dos preços:
– Não vamos de maneira alguma deixar a inflação ficar fora de controle.
O cenário externo também é um complicador nas pretensões do governo de crescer em ritmo estável de 5% ao ano. Para o economista Antonio Carlos Fraquelli, da Fundação de Economia e Estatística (FEE), os cortes no orçamento americano e uma segunda onda da bolha imobiliária, que já está sendo cogitada, ameaçam atrasar a recuperação global que se previa para 2011. Além disso, a crise nos países árabes coloca o preço do petróleo como uma incógnita importante.
– Aquele 2011 de recuperação da economia mundial já começa a ficar distante – avaliou.
(DC, 04/03/2011)
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