Tão perto e tão diferente. Esta é a realidade das crianças e dos adolescentes que vivem na Capital. Na mesma cidade que tem uma população com renda elevada, uma em cada cinco crianças vive em condições de pobreza. Na mesma população onde 28% têm entre zero e 19 anos, encontram-se 25 mil crianças e adolescentes em risco social. Muitos sequer atingem a maioridade. Morrem por causas ligadas ao tráfico de drogas. Como os 41 assassinados entre 2007 e 2009, e que, segundo a Secretaria Estadual de Segurança Pública, tinham entre 12 e 17 anos.
Florianópolis cuida bem de nossas crianças e adolescentes? Esta é a pergunta feita por pesquisadores do Instituto Comunitário da Grande Florianópolis (ICom) e que o relatório Sinais Vitais tenta responder. O documento será apresentado nesta segunda-feira e mostra um retrato da realidade da população da Capital, de zero a 19 anos.
Estes são alguns dos itens do relatório Sinais Vitais, que será apresentado às 16h desta segunda-feira no auditório da Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul), Rua Trajano, Centro da cidade. Trata-se do primeiro diagnóstico específico sobre a realidade de crianças e dos adolescentes em Florianópolis.
Durante os últimos meses, pesquisadores do Instituto Comunitário da Grande Florianópolis (ICom) colheram dados, entrevistaram especialistas e visitaram programas de atendimento. Uma comissão técnica formada por 20 organizadores analisou e interpretou dados para tentar responder aa perguntas: “Nossa cidade cuida bem de suas crianças e adolescentes? Como podemos fazer para cuidar melhor?”.
Um dos objetivos é apresentar ao gestor público um diagnóstico da situação. É também uma resposta a um argumento comum quando políticas públicas são cobradas: de que não existem subsídios para um trabalho maior. O relatório resulta do cruzamento de dados apresentados em pesquisas como do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Instituto de Pesquisas Aplicadas (Ipea), ministérios, secretarias municipais, estaduais, ONGs.
– O relatório não tem caráter de cobrança, mas o de oferecer um instrumento que possibilite ao gestor público e à comunidade um olhar sobre a realidade – explica Lúcia Vieira Dellagnelo, coordenadora do ICom.
Além de apresentar os dados, o Sinais Vitais trabalha com duas problemáticas: os pontos positivos e os pontos desafiadores. O primeiro trata do que foi diagnosticado. O segundo propõe uma reação.
Um dos exemplos é o que trata do mapa dos serviços para crianças e adolescentes. Foi diagnosticado que a maioria concentra-se na região central e na parte continental. O Norte e o Sul, onde estão localizadas algumas das comunidades mais pobres da cidade, oferecem poucas opções de atendimento.
São elencados como pontos positivos a ampla oferta de serviços (47 programas governamentais e 102 não governamentais), diversidade de organizações envolvidas e parcerias entre poder público e ONGs. Os pontos desafiadores são a concentração dos serviços nas áreas continental e central e a baixa complementariedade na abrangência e ações na área de assistência social, saúde e educação.
– Esperamos que a Câmara de Vereadores e mesmo o Executivo se sensibilizem com os dados apresentados. A gente não considera que o relatório esteja colocando o dedo na ferida, mas mostrando, também, que existem coisas boas que estão sendo feitas no âmbito municipal – afirma o secretário municipal da Assistência Social, Hélio de Abreu.
Ele cita como um dos avanços na política de proteção à infância o protocolo para atendimento das vítimas da violência sexual:
– Antes, a vítima contava a mesma situação várias vezes para diferentes pessoas. Hoje, isso ocorre uma única vez e todos os procedimentos, sejam do ponto de vista médico, psicológico, social são realizados sem a necessidade da exposição da criança.
(ÂNGELA BASTOS, DC, 05/12/2010)
CRIANÇAS DE FLORIPA: Direitos não são garantidos
Os indicadores mais utilizados para avaliar a qualidade de vida de uma criança estão relacionados aos vínculos e à condição socioeconômica de sua família. O Sinais Vitais mostra que os indicadores econômicos em Florianópolis são relativamente bons quando comparados em nível estadual e nacional. A renda per capita de Florianópolis, conforme o IBGE de 2007, é de R$ 17.907. Já SC, no mesmo período, é de R$ 13.712. A per capita do país é de R$ 14.465. Ao mesmo tempo, o índice de desenvolvimento familiar de Florianópolis (0,64) é mais alto do que o de Santa Catarina (0,59) e do Brasil (0,55).
O fato disso não se caracterizar como uma situação de plena garantia dos direitos à infância está na desigualdade social da população. Enquanto um percentual menor vive em áreas mais ricas e servidas com serviços de educação, saúde, lazer, outro grande número está em 65 áreas denominadas como de interesse social. Nestes locais, as moradias e a infraestrutura são precárias.
Em lugares como a Vila Aparecida, no Continente, e o Morro da Caixa, no Centro, respectivamente 63% e 52% dos moradores – não existem sequer dados municipais numéricos sobre a quantidade de moradores – meninos e meninas estão em condições de pobreza que geram vulnerabilidade social.
Moradores da Vila Aparecida, os amigos Vitor e Kelvi, sete anos, reclamam que falta um campo de futebol para jogar e uma pista para andar de bicicleta:
– Já veio gente aqui dizer que ia fazer um campinho, marcar a área e colocar redes. Mas nunca fazem. Nossa brincadeira é soltar pipas – conta Vitor.
Com dificuldade de transporte ou mesmo de alguém para acompanhá-las até ciclovias, pistas de skate ou quadras esportivas; as crianças e os adolescentes tendem a ficar em suas comunidades. Muitas vezes, os espaços das brincadeiras são ocupados, também, por pessoas envolvidas com crimes, o que as torna ainda mais vulneráveis.
(DC, 05/12/2010)
CRIANÇAS DE FLORIPA: Educação é ponto positivo
A educação é ponto de destaque no relatório. O aumento de matrículas na educação infantil é um bom sinal, assim como melhorias nas creches. Recentemente, a unidade do Jardim Atlântico teve um investimento de R$ 400 mil. Passou por uma obra que compreendeu a construção de mais uma sala de aula, a troca do telhado, recuperação de seis salas, banheiros, refeitório, salas da direção e de professores, estruturação da cozinha e área de serviço, colocação de pastilhas e pintura geral do prédio.
Localizada na área continental, atende a 122 crianças de zero a cinco anos. Tudo de graça. A instituição funciona das 7h às 19h, e as crianças recebem quatro refeições ao dia. Muitas vão para casa de banho tomado.
– Estamos localizados em um bairro onde as pessoas trabalham e a creche deixa os pais tranquilos com relação aos filhos – observa a diretora Márcia Maria da Silva Knoblauch.
Atualmente, estão matriculados 63 mil alunos nas redes municipal, estadual e federal. Entre eles estão 579 educandos com necessidades especiais, atendidos em escolas regulares e instituições especializadas. Entre 2004 e 2010, houve uma ampliação de 5,2% de matrículas no ensino fundamental e 34% nas matrículas em creche e educação infantil. Isso significa que foram abertas na educação infantil vagas para quase 2,4 mil crianças, sendo 66% em período integral. Segundo o relatório, a necessidade de creches permanece nas regiões de maior vulnerabilidade.
Outro dado positivo é com relação à taxa de mortalidade infantil, que vem caindo nos últimos 10 anos. Em 2009, o índice foi de nove óbitos por mil nascidos. Em Santa Catarina, a taxa média é de 11 óbitos, e no Brasil, de 16 para cada mil nascimentos.
(DC, 05/12/2010)
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