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O empresário Eike Batista descobriu que é (bem) mais difícil convencer ambientalistas a aprovar a construção de seu estaleiro do que atrair investidores para o projeto.

Atrair investidores para negócios grandiosos nunca foi problema para o empresário Eike Batista, o homem mais rico do Brasil, com uma fortuna de quase 27 bilhões de dólares. Nos últimos quatro anos, Eike levantou 10 bilhões de dólares na bolsa de valores para capitalizar as cinco companhias que formam o grupo EBX, com atuação nas áreas de mineração, energia e logística. Sua mais recente investida aconteceu em março, com a abertura de capital da OSX, empresa de construção e prestação de serviços navais para a indústria do petróleo. Assim como nos outros projetos engendrados por Eike, a OSX nasceu com números superlativos: captou 1,7 bilhão de dólares no IPO e prevê um faturamento de 30 bilhões de reais nos primeiros dez anos de operação (as atividades começam em 2012). Parecia o plano perfeito (pelo menos para Eike) – até que um grupo de ambientalistas começou a jogar areia na história. Preocupado com o destino dos 60 golfinhos que vivem na região de Biguaçu, em Santa Catarina, onde seria construído o estaleiro da OSX, o Instituto Chico Mendes (ICMBio) divulgou um dia depois do IPO que não daria anuência para que o licenciamento ambiental do projeto fosse em frente.

Como a Fundação do Meio Ambiente de Santa Catarina precisa da aprovação do ICMBio para conceder a licença, o negócio enroscou. A queda de braço se acentuou nas últimas semanas, durante três audiências públicas realizadas no estado. Enquanto representantes da OSX tentavam defender o projeto, manifestantes empunhavam cartazes contra a construção do estaleiro e tocavam cornetas em sinal de protesto. Por essa razão, no início de julho a empresa pediu revisão do parecer na presidência do ICMBio, em Brasília, e deu entrada num licenciamento paralelo no Rio de Janeiro, na área onde o grupo já constrói o Complexo do Porto do Açu, que terá um porto, uma siderúrgica e uma termelétrica. “Num negócio como esse não tenho de ter apenas plano B, como também plano C”, disse Eike a EXAME. “O estaleiro será construído onde entenderem primeiro o quanto nosso projeto é bom.”

A possibilidade de Santa Catarina perder o investimento – a construção do estaleiro exigirá mais de 2 bilhões de reais e deve gerar 3 500 empregos diretos durante a obra (depois que o projeto começar a operar, outros 4 000 funcionários serão contratados) – colocou políticos do estado em polvorosa. Durante uma reunião ocorrida na Assembleia Legislativa catarinense no mês de julho para discutir o assunto, a senadora petista Ideli Salvatti criticou publicamente o diretor regional do ICMBio, Ricardo Castelli – que não compareceu ao encontro. “Todo mundo sabe que empreendimentos dessa dimensão provocam impactos negativos e positivos para toda a sociedade”, diz a senadora. “Se o ICMBio estiver certo, vamos apoiá-lo. Mas não dá para admitir que o órgão simplesmente se recuse a explicar o porquê da negativa.” O imbróglio ganhou tal dimensão que dias depois foi parar em Brasília, no gabinete da ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira. Uma comitiva formada por cerca de 20 pessoas, entre deputados e senadores de Santa Catarina, além de representantes do Ibama e da Secretaria de Meio Ambiente do estado, reuniu-se com a ministra para discutir o tema. Ao final do encontro ficou decidido que seria criado um grupo de trabalho para administrar o licenciamento. Caberá ao ICMBio de Brasília apresentar em 30 dias a revisão do parecer dado pelo escritório de Santa Catarina.

Para lidar com a confusão protagonizada pelos golfinhos, a OSX destacou uma equipe de quase 30 pessoas – entre advogados, técnicos e profissionais da área de sustentabilidade. A principal peça de defesa da companhia em favor do projeto é um estudo realizado pela Fundação Certi, ligada à Universidade Federal de Santa Catarina e considerada referência entre especialistas em sustentabilidade. Um dos autores da pesquisa, apresentada num seminário organizado pela OSX em 12 e 13 de julho, é o biólogo americano Thomas Jefferson, uma das maiores autoridades em golfinhos do mundo. Há 15 anos ele estuda o comportamento desses animais na baía de Hong Kong, região com enorme fluxo de embarcações e de aeronaves. “Esse tipo de empreendimento obviamente causa impactos, mas hoje há várias tecnologias disponíveis para que os golfinhos continuem habitando essas áreas mesmo depois das obras, como ocorre em Hong Kong”, diz Jefferson.

Uma das recomendações do relatório é a criação de um fundo capitaneado pela OSX para ampliar o saneamento básico da região onde o estaleiro seria construído. Atualmente, apenas 48% do esgoto de Florianópolis é tratado. O estudo sugere também que depois da construção sejam colocados sensores na baía para monitorar a qualidade da água. “O motivo que nos fez aceitar esse trabalho é que essa obra pode, na verdade, melhorar as condições de preservação daquela área caso sejam tomadas as providências que apontamos”, diz José Eduardo Fiates, presidente da Fundação Certi.

Embora o processo de licenciamento ainda não esteja atrasado – a previsão inicial da OSX era obter a licença prévia em outubro e a licença de instalação (que autoriza a construção, de fato) em janeiro de 2011 -, a indefinição vem afetando fortemente o preço das ações da empresa. Desde o IPO, os papéis perderam 32% de seu valor, na maior desvalorização entre todas as empresas do grupo EBX nesse período (a segunda maior redução foi a da MMX, que perdeu 13% do valor nesse período). “Essa queda está diretamente ligada às dificuldades com o licenciamento”, afirma Subho Daripa, analista do banco Morgan Stanley, que participou de uma das audiências públicas realizadas em Santa Catarina. Eike diz que o preço dos papéis é o que menos importa nesse momento. “Quem vendeu nossas ações pensa no curto prazo. Nem eu nem os grandes investidores que nos apoiam trabalhamos mirando o curto prazo”, afirma. “Vamos construir a ‘Embraer’ dos mares, e muita gente terá orgulho de ver nossos ‘embraerzinhos’ navegando no mundo inteiro.” Só falta combinar com os golfinhos e seus defensores em terra.

(Por Roberta Paduan, de EXAME, 09/08/2010)

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