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Para muitos turistas, o mar, as dunas e alguns morros de Florianópolis formam belas paisagens. Para milhares de pessoas, apesar de todos os riscos, são o único endereço possível.

O DC visitou três comunidades que se “equilibram” em áreas onde poucos se atreveriam a morar: a Ponta do Leal, no Continente, onde casas foram construídas sobre o mar e pedras; a Vila do Arvoredo, no Norte da Ilha, com residências em cima da areia fofa; e o Jagatá, no Maciço do Morro da Cruz, que assusta pelo risco de deslizamentos de terra. A seguir, a história de algumas pessoas que vivem nestes lugares. Mesmo com as dificuldades, elas não se entregam.

(DC, 01/08/2010)

Sobre a água, só com estacas

Enquanto os olhos avistam a Avenida Beira-Mar Norte, um dos endereços mais caros de Florianópolis, o corpo se protege em uma casa construída sobre o mar. A água da Baía Norte pode ser vista entre as frestas do assoalho.

– Eu fico muito apavorada, principalmente quando tem vento sul forte. As madeiras aqui de casa estão podres e não dão segurança nenhuma – conta Elaine Garcia, 29 anos, uma das moradoras da Ponta do Leal, no Bairro Estreito.

A comunidade tem cerca de 50 anos. Começou em uma faixa de areia fina. Por falta de espaço, casas estão sendo construídas sobre o mar e pedras. Também já se percebe um processo de verticalização – pelo menos três moradias ficam no segundo andar, de forma precária.

Segundo o presidente da Associação de Moradores, João Luiz de Oliveira, 98 famílias – aproximadamente 330 pessoas – vivem no local, sem saneamento básico. Todo o esgoto vai parar direto no mar, o que coloca em risco a saúde dos moradores.

– Nosso sonho é conseguir uma habitação adequada para a comunidade. Nossa casa é nosso útero, é onde nos sentimos protegidos. Não podemos ficar assim – diz João.

Há um mês, um temporal destelhou a casa de Elaine, que mora com o marido, Edson Lisboa, 29 anos, e dois filhos. A outra filha sente medo e foi viver com a avó.

– Pegamos uma madeira aqui, outra ali, e vamos arrumando como dá. Já teve uma vez que eu caí do teto. Ainda bem que tinha água no fundo para amortecer – conta Edson, funcionário do Hospital Universitário.

O casal chegou à Ponta do Leal há dois anos, quando comprou uma casa no segundo andar, por R$ 3,5 mil. Há um mês, conquistou outro imóvel, por R$ 5 mil.

Elaine e Edson já pagaram a primeira parcela, de R$ 200. Faltam 24.

Mudança a caminho
A prefeitura afirma que, em 2008, os moradores da Ponta do Leal não aceitaram proposta para serem levados a dois terrenos no Jardim Atlântico e no Monte Cristo. Uma nova alternativa passou a ser discutida. A Casan disponibilizou um terreno, atrás da favela, que era da União. Agora, está tramitando na Câmara de Vereadores um projeto para mudar o zoneamento do local, necessário para construir as moradias. Só depois disso será feito novo projeto. Não há prazos.

(DC, 01/08/2010)

Morro de preocupações

Quando chove, Nilsa Fernandes, 35 anos, perde a vontade de trabalhar. Teme deixar os dois filhos em casa, que está na beira de um barranco. Há dois anos, o barro na frente da moradia, na comunidade do Jagatá, na região central da cidade, foi embora com a água. Até agora nada foi feito para resolver o problema.

De acordo com o presidente da Associação dos Moradores do Jagatá, no Morro da Queimada, Sulimar Alves, das oito áreas de risco da comunidade, cinco foram corrigidas com as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) no Maciço do Morro da Cruz ou com medidas de emergência da prefeitura. Mas ainda há lugares problemáticos.

São cerca de 20 mil moradores no maciço. A ocupação começou no início do século passado por ex-escravos. Quando chove, a Defesa Civil Municipal fica em alerta.

– No Alto da Caieira, por exemplo, diminuiu em 70% o número de chamados após as obras de revitalização. Mas temos muito a fazer ainda. Cada construção no morro tem que seguir uma série de procedimentos por causa dos deslizamentos – diz o coordenador da Defesa Civil de Florianópolis, Luiz Eduardo Machado.

Nilsa tem medo. Casada e com dois filhos, viu o barranco na frente de casa sumir durante as fortes chuvas de 2008. Quando chove, leva as crianças para a sala, local mais seguro, e fica acordada a noite toda.

Ela tinha 13 anos quando trocou o Paraná por Florianópolis para trabalhar. Há quatro anos, comprou a casa no Jagatá. Está quase feliz.

Em obras desde 2008
As obras no Maciço do Morro da Cruz, como saneamento básico, estradas e muros de contenção estão sendo feitas desde 2008 e têm prazo para terminar em março de 2012, mas devem atrasar. Segundo a prefeitura, as enxurradas de 2008 e 2009 dificultaram os trabalhos. Duas empresas também desistiram dos contratos. As famílias em áreas de alto risco ainda não foram removidas.

(DC, 01/08/2010)

Areia fofa no quintal

As panelas da casa de Nelson da Rosa, 36 anos, enchem de areia em dias de vento forte. É que o barraco, comprado por R$ 1 mil, fica em cima das dunas, na Vila do Arvoredo, em Ingleses, no Norte da Ilha. E já foi pior:

– Eu morava em outro lugar do Arvoredo. Mas a duna começou a mudar e tivemos que vir pra cá.

A comunidade, que era chamada de Favela do Siri, começou a surgir na década de 1980. A área foi ocupada por pessoas atraídas com o crescimento na região. Nelson foi um deles. Morador de Palhoça, trabalhava de vigilante em um hotel, de onde saía às 4h. Sem ter como voltar para casa, mudou de endereço.

Nelson é casado com Rosemari de Lima, 36. Tem três filhos – de 14, 16 e 18 anos. O que mais atrapalha a vida é a habitação.

De acordo com a presidente da Associação de Moradores da Vila do Arvoredo, Vanusa Araújo, 164 famílias vivem no lugar.

– Já foram 230 famílias em 2004. Mas as dunas estão se aproximando e já perdemos casas e ruas. Em mais um ano teremos que remover mais 32 famílias. Onde vamos colocá-las? – questiona.

Algumas ruas e casas, conta Vanusa, foram engolidas pela areia das dunas. Foi preciso ajustar caminhos.

Nelson e a mulher já passaram por momentos difíceis. Há um mês, quando estavam no trabalho, receberam uma ligação dos vizinhos: a casa destelhou e o filho, sozinho, não parava de chorar.

– Foi um desespero muito grande para nós. Mas temos fé que as coisas vão mudar – diz Nelson, que gostaria de trocar de endereço.

Apartamentos populares, a solução
A prefeitura diz que, em 2005, cadastrou 225 famílias na Vila do Arvoredo. Algumas já saíram por conta de indenizações, restando 164. O terreno para onde serão removidos está sendo definido, assim como o projeto arquitetônico, de acordo com a administração municipal. Falta a elaboração de projetos complementares e a autorização de alguns órgãos ambientais. Serão 168 apartamentos, com recursos do programa Minha Casa Minha Vida. Não há prazo para o início das obras.

(DC, 01/08/2010)

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