Cidade do Vale do Itajaí é a primeira do país a fazer a concessão após a edição da lei do saneamento, em janeiro de 2007
Com apenas 6% do esgoto tratado, Blumenau testará uma alternativa rara no Brasil para tentar resolver o problema. A cidade desistiu de gerir o sistema de saneamento e o entregou à iniciativa privada.
A medida rendeu a Blumenau o título de primeiro município do Brasil a conceder o serviço depois da edição da lei do saneamento, em janeiro de 2007.
Nos últimos sete anos, nenhuma cidade do porte de Blumenau, com cerca de 300 mil habitantes, fez a concessão à iniciativa privada. A última foi Mauá, em São Paulo. O sistema é operado pela empresa Foz do Brasil, líder do consórcio Saneblu, vencedor da licitação na cidade catarinense.
Por ser novidade, a medida causa polêmica no Vale do Itajaí. No mês passado, uma liminar suspendeu a execução do contrato de concessão. A ação foi proposta pelo Ministério Público, que investiga supostas irregularidades no contrato. Os argumentos do promotor Gustavo Mereles Ruiz Diaz baseiam-se em divergências entre a lei, o edital e o contrato.
No início do mês, a liminar foi derrubada pelo Tribunal de Justiça e as atividades para a implementação do novo sistema começaram.
– A concessão à iniciativa privada não é solução para todas as cidades, mas uma alternativa para situações específicas. A capacidade de endividamento das cidades, do Estado e da Casan é muito pequena. Quem tem esta capacidade hoje é a iniciativa privada – diz o diretor da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (Abes), Paulo José Aragão.
As ruas do Bairro Vorstadt são as primeiras a receber as tubulações. No segundo dia de obras, em 20 de julho, a moradora Clarice Spengler tirava dúvidas. Ela foi informada de que receberá um aviso e terá um prazo para ligar o esgoto de casa à nova rede.
– E quem vai pagar por isso? Sou eu? – questiona.
A taxa de esgoto corresponderá a 98% do valor da fatura da água. Se a conta de água der R$ 10, a de esgoto vai custar R$ 9,80.
O prefeito de Blumenau, João Paulo Kleinübing, diz que, nem prefeitura, nem companhia de saneamento municipal têm capacidade financeira para atingir a meta de ter 100% de tratamento de esgoto em 10 anos. Por isso a concessão do serviço.
Tempo de exploração chega a 35 anos
O contrato prevê 35 anos de exploração. A empresa se compromete a investir R$ 185 milhões nos próximos cinco anos e elevar a proporção de esgoto tratado na cidade de 6% para 60% em menos de três anos. O total do investimento previsto é de R$ 300 milhões. O diretor da Foz do Brasil, Francisco Jucá, ressalta que, por se tratar de uma concessão pública, os serviços serão supervisionados por uma agência reguladora. Ao final do contrato, os ativos construídos e melhorados serão revertidos ao patrimônio público municipal.
(Por NANDA GOBBI, DC, 30/07/2010)
“O privado aparece como alternativa”
O vice-presidente da Foz do Brasil, Newton Lima Azevedo, está à frente da empresa que atua em 16 cidades do país, entre elas Blumenau, e seis estados. Segundo ele, 75% do setor de saneamento é operado pelas companhias estaduais, 18% contam com serviços municipais e 7% são operados pela iniciativa privada.
Diário Catarinense – É possível afirmar que a concessão do sistema de esgoto e água ainda está na fase inicial no Brasil?
Newton Lima Azevedo – Sim, ainda estamos engatinhando. A Odebrecht é pioneira neste movimento. Começamos em Limeira (SP) em 1995. Foi a primeira concessão e hoje é modelo no país. O assunto água e esgoto no Brasil começou a ser discutido na época do regime militar, quando foi criado o Plano Nacional de Saneamento. Nesta época foram criadas 27 companhias estaduais e não havia no Brasil nenhum operador privado. O problema foi que este sistema faliu na década de 1980 por ineficiência na gestão.
DC – Com a lei do saneamento, das leis das parcerias público-privadas, dos consórcios públicos e a modernização da lei de concessão, o setor saiu da inércia?
Azevedo – A lei do saneamento estava parada no Congresso havia 19 anos. Depois que ela foi editada, há três anos, o mercado foi reaquecido. Antes não existia segurança, nem garantias. O país está caminhando para a solução de parceria público-privada. Hoje, quase dois terços das atuais 26 companhias têm despesas maiores do que a receita, não conseguem pagar seus custos de operação e são sustentadas pelos governos estaduais.
DC – A concessão é uma tendência internacional?
Azevedo – Na França, há mais de cem anos se trabalha em parceria público-privada. O privado aparece como uma alternativa.
DC – No caso de Limeira, a Foz do Brasil renovou o contrato feito em 1995, estendendo os serviços até 2039. Não houve tempo suficiente para fazer os trabalhos durante o primeiro contrato?
Azevedo – Foi uma extensão do contrato. A cidade cresceu e exigiu novos investimentos. A prefeitura e a população ficaram satisfeitos e pediram mais serviços.
(DC, 30/07/2010)
Pior desempenho do Sul do Brasil
Das 293 cidades do Estado, só 30 têm rede coletora de esgoto. O desempenho coloca Santa Catarina abaixo da média nacional (56%) e em último lugar na região Sul do país.
A demora para a implantação do sistema levou 14 cidades a desistir dos contratos com a Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (Casan) e municipalizar os serviços (detalhes no quadro).
De acordo com o diretor da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (Abes), Paulo José Aragão, atualmente a Casan atende metade da população do Estado. Situação bem diferente do início da concessão, em 1971, quando cerca de 90% dos catarinenses eram atendidos pela estatal.
Rede coletora faz imóvel valorizar, indica pesquisa
O diretor-presidente da Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon), Yves Besse, fez as contas e afirmou que o Estado precisa de R$ 20 bilhões de investimento para resolver o saneamento até 2020. Ele compara a situação dos catarinenses com os estados vizinhos.
– Somente 560 mil catarinenses têm esgoto em suas casas, sendo que no Paraná e no Rio Grande do Sul este número chega a mais de 4 milhões e 2,5 milhões de habitantes, respectivamente – diz.
A pesquisa Benefícios econômicos da expansão do saneamento básico, lançada pelo Instituto Trata Brasil e a Fundação Getúlio Vargas (FGV), revela que a implantação da rede de esgoto reflete positivamente na qualidade de vida do trabalhador, gerando aumento de produtividade e renda, além de contribuir para a valorização dos imóveis.
De acordo com a pesquisa, apesar dos investimentos feitos no setor, apenas 43,5% dos brasileiros são atendidos pela rede de esgoto.
– A evolução do setor é inquestionável, mas o déficit continua. Os investimentos precisam ser crescentes para reduzir o número de brasileiros que ainda não tem acesso ao saneamento básico – esclarece o presidente do Trata Brasil, André Castro.
A falta de coleta e tratamento de esgoto é a principal causa da mortalidade de crianças de zero a cinco anos por diarreia e doenças parasitárias, enfermidades que proliferam em áreas sem saneamento básico.
Segundo a Fundação Nacional de Saúde (Funasa), 2.528 crianças nesta faixa etária morrem a cada ano no Brasil em decorrência de diarréia. O que significa a assustadora cifra de sete mortes por dia.
A Casan diz que 17% da população do Estado têm acesso à rede de esgoto. A estatal afirma que está trabalhando para melhorar a situação.
(DC, 30/07/2010)
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