Por toda a Capital estão espalhadas esculturas para as quais pouco se voltam os olhares da população
Em toda cidade é assim: de tão incorporadas à paisagem, as obras de arte ao ar livre não são percebidas, ou contempladas como merecem, por quem passa. A pressa do cotidiano soma-se ao desinteresse e ao olhar nativo daqueles que sabem que poderão voltar ao local.
A mulher que corta caminho todo dia útil, há 15 anos, pela Praça Lauro Müller, no Centro da Capital, não esconde a dúvida, mas acerta o chute:
– Imagino que aquela estátua ali seja de Lauro Müller, porque é o nome que batiza o local. Acho que ele foi governador, não foi?
Instalados em lugares com muitas plantas e pouco movimento, bustos e estátuas de bronze, ou outros metais nobres, não são percebidos. Até se sabe que estão ali, mas quase nunca, de quem são. É previsível, por exemplo, que o busto em frente ao Laboratório Central do Estado seja de uma figura da saúde. E é, de Osvaldo Cruz, mas nenhuma das cinco pessoas que passaram pelo lugar em cerca de 10 minutos o reconheceram.
– Ninguém sabe, a gente deduz que seja de uma figura importante e vai embora. Se você para, continua sem saber, porque nem tem uma placa explicando quem foi o homenageado ou quem fez a escultura – justifica a empresária Isabela Luz.
O Monumento ao ex-governador Hercílio Luz está entre os poucos que fogem à regra. Feito na cabeceira da Ponte que leva o nome do político, não passa despercebido. Pelo menos não para os milhares de turistas que visitam o local ao longo do ano. Lá, o problema é outro: arrancaram a flor que a mulher que representa o povo entregava a Hercílio Luz.
O episódio lembra o roubo dos óculos da estátua do poeta Carlos Drummond de Andrade, na praia de Copacabana, no Rio de Janeiro. A diferença é que, depois de oito depredações sofridas desde sua inauguração, em 2002, a escultura da praia ganhou uma câmera de vigilância, para tentar inibir os vândalos.
Fora outros tipos de depredações, como pichações e adesivos colocados nos bustos, como fizeram com o de Olavo Bilac, na Praça Olívio Amorim (Avenida Hercílio Luz), há alguns monumentos que sumiram. É o caso do busto de Jorge Lacerda, na avenida de mesmo nome, no Sul da Ilha.
Ainda assim, a maioria dessas obras de arte não está depredada. E isso ocorre por sorte, porque a falta de atenção à paisagem urbana não é exclusividade do povo. A prefeitura não dispõe de uma equipe que se dedique à tarefa de manutenção. Há um grupo da Floram que cuida do paisagismo das praças e, quando percebe alguma anormalidade em um monumento, conta com pessoal de secretarias como a de Obras para executar o reparo.
Prefeitura não possui um catálogo dos monumentos
Desde que trabalha no órgão municipal, há seis anos, a arquiteta Marisa Fonseca, responsável pelas praças da Capital, não viu a flor do monumento a Hercílio Luz e revela que nem há planos para recolocação. Ela conta que a ideia é constituir grupos que se dediquem apenas a isso.
– No ano passado, deram um jeito de tirar o busto do Rubens de Arruda Ramos ali da Beira-mar. A guarda municipal viu caído e trouxe para nós. Como a maioria é de bronze, tem certo valor – conta Marisa, lamentando pelo roubo.
A gerente do Serviço do Patrimônio Histórico, Artístico e Natural do Município (Sephan), Maria Anilta Nunes, confirma que a cidade não possui catálogo desses monumentos.
Para a artista plástica Simone Alves, a escultura, desde a mais conhecida antiguidade e em qualquer parte do globo terrestre, sempre foi ligada, aliás, dependente, de homenagens ao homem, quase sempre póstumas. Ela acrescenta que é nas praças onde encontramos monumentos que representam figuras ilustres, que se destacaram na sociedade. Essas figuras estão relacionadas não só com a apreciação, mas, como diz, também registram e documentam o desenvolvimento do homem como ser produtor e a evolução histórica da cidade.
Normalmente colocadas em cenários arborizados e de pouco trânsito, em um dia em que se está à toa, pode valer a pena prestar atenção nessas obras, criadas também para conservar a memória do povo.
(DC, 28/01/2010)
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