Um dos encaminhamentos da I Oficina para Revitalização da Praça da Cidadania, realizada no dia 2 de dezembro, será o pedido de tombamento do jardim projetado por Burle Marx para a UFSC. O jardim é um dos cerca de mil projetos do arquiteto, reconhecido internacionalmente como o mais importante paisagista do século XX e que completaria 100 anos em 2009.
Solicitações semelhantes foram feitas em outras cidades brasileiras este ano. No Rio de Janeiro, por exemplo, a prefeitura publicou decreto tombando 84 projetos paisagísticos de Roberto Burle Marx. O acervo inclui jardins, painéis e esculturas em áreas públicas e privadas. O governo de Pernambuco também anunciou o início do processo de tombamento de sete jardins públicos projetados pelo arquiteto paulista no Recife.
De acordo com o professor Cezar Floriano, do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da UFSC, organizador da I Oficina para Revitalização da Praça da Cidadania, a ideia de tombamento de jardins é bastante recente e vem sendo discutida no Brasil e em outros países.
Cezar explica que o jardim da UFSC, localizado na atual Praça da Cidadania, surgiu no final dos anos 60, fazendo parte de uma fase de Burle Marx entendida como intermediária ─ nem tanto relacionada à geometria mais dura influenciada pela arte concreta no Brasil, nem às tramas mais complexas, que têm no passeio de Copacabana seu apogeu.
“Os jardins de Burle Marx são históricos. Estão entre os mais representativos da modernidade e temos o dever de preservar. São patrimônios que precisam ser restaurados e conservados não apenas para nós, mas como memória da trajetória desse importante paisagista da modernidade”, defende o professor da UFSC.
Segundo Cezar, o tombamento significaria um passo importante para a restauração do jardim da universidade, com retirada de intervenções que comprometem o projeto original – assunto que ele sabe, deve gerar polêmica na instituição. “Precisaremos ver o que deverá ser retirado ou não, e o que já tem uso consolidado, como a concha acústica, por exemplo, e que vai precisar de adaptações”, considera Cezar.
A I Oficina para Revitalização da Praça da Cidadania reuniu estudantes, professores, servidores técnico-administrativos que atuam na Prefeitura Universitária (responsável pela jardinagem do campus) e do Escritório Técnico Administrativo da UFSC (um dos setores envolvidos com o Plano Diretor do Campus). Trouxe para o Departamento de Arquitetura e Urbanismo da UFSC o professor José Tabacow, que trabalhou no projeto do jardim da universidade como arquiteto colaborador no escritório de Burle Marx. A oficina foi prestigiada também pelo vice-reitor da UFSC, professor Carlos Alberto Justo da Silva.
“Queremos estar juntos nesse processo”, disse o vice-reitor em relação à recuperação do jardim, e ressaltou a importância de que a universidade aproveite suas competências para encaminhamento de seus desafios, em ações que colaborem com o ensino, a pesquisa e a extensão. O vice-reitor lembrou a grande pressão que o campus da Trindade tem em relação a novas construções e que soluções vêm sendo buscadas no sentido de construir novos prédios em outros espaços, como a Fazenda da Ressacada e o Sapiens Parque. Ressaltou também a importância de que o campus seja qualificado com áreas verdes e de convivência.
O professor José Tabacow informou que, na época de implantação do jardim de Burle Marx na UFSC, trabalhava em cerca de 300 projetos do gênero. Ele relembrou as etapas para elaboração da proposta de um jardim e lamentou o fato de que ao serem implantadas se tornam tão vulneráveis a interferências. Estas mudanças, afirmou, podem ser resultado de uma falta de internalização da proposta pelo cliente e até do crescimento das plantas, que nem sempre se comportam como o imaginado. Há ainda as mudanças provocadas pelo vento, por pássaros e por pessoas que são responsáveis pela manutenção do espaço.
“Muitas vezes o tempo é seletivo na direção contrária ao que se imaginava. Além disso, pássaros e jardineiros são os principais agentes de interferência nos jardins”, resumiu o arquiteto. Ele lembrou também que praças e parques são ameaçados pela visão de que são terrenos disponíveis. “Muitos exemplos de importantes espaços desse tipo foram ocupados com diferentes construções. Um posto de saúde, por exemplo: as pessoas acham que é mais importante do que o espaço público”.
Em sua opinião, o jardim de Burle Marx na UFSC pode ser recuperado, já que as linhas mestras da composição foram mantidas. Além disso, toda a documentação original, que mostra traçados e espécies vegetais escolhidas, está preservada para consulta. Mas a quantidade de mudanças na Praça da Cidadania é grande e muitas delas podem ser irreversíveis. “Será preciso coragem para retirar algumas intervenções, há necessidade de uma higienização do espaço”, resumiu o arquiteto, que vivenciou o planejamento de Burle Marx para a UFSC e será convidado a orçar um projeto para sua recuperação. “Ele é co-autor, pode nos ajudar a pensar no que deixar ou retirar”, defende o professor Cezar Floriano em relação a esta colaboração.
Paticipou também da oficina a arquiteta Maria das Graças Amaral, do Escritório Técnico Administrativo da UFSC (ETUSC), que acompanha o desenvolvimento do Plano Diretor Paisagístico para o campus da universidade. Ela contou que as primeiras idéias para elaboração desse plano surgiram na década de 90. Atualmente, diante da saturação dos terrenos da Trindade e da demanda crescente por novos prédios e estacionamentos, o plano está sendo retomado.
A arquiteta mostrou que diretrizes gerais orientam a valorização das áreas verdes ainda existentes e a retomada da centralidade da Praça da Cidadania. Além disso, o plano prevê a implantação de sistema articulado de espaços públicos, novas praças, ciclovias, bicicletários e uma melhor definição das hierarquias das vias, para minimizar o conflito entre carros e pedestres. Rever as vias de circulação que cortam a Praça da Cidadania e trocar o piso de ladrilhos, característico das obras de Burle Marx, são propostas que já fazem parte do Plano Diretor do Campus.
De acordo com Cezar Floriano, a expectativa é de que a recuperação do jardim do mais importante paisagista do século XX seja um presente para a UFSC, que completa 50 anos em 2010.
(Arley Reis, Agecom, 08/12/2009)