Representantes do trade turístico e economistas do Corecon debatem os desafios do setor e as alternativas para garantir o crescimento
Um dos principais condutores do desenvolvimento local, o turismo tem grande peso na economia de Santa Catarina. Porém, encerrada mais uma temporada de verão, os números apurados revelam queda na movimentação no período. Restaurantes e bares sofreram mais do que hotéis, que foram beneficiados com um fluxo de visitantes argentinos acima da expectativa este ano.
Sem investimentos relevantes em infraestrutura ou em novos equipamentos de lazer, o Estado depende do apelo das belezas naturais para conquistar o turista, cujo perfil muda a cada ano.
Apesar do atual cenário, de um ano de recessão econômica e de perspectivas pessimistas para quase todos os setores da economia, o trade turístico tem um alento: a realização do Fórum Mundial do Turismo – o WTTC Summit – em Florianópolis, pode atrair investimentos internacionais e dar um novo fôlego para o turismo catarinense.
Estas e outras considerações foram levantadas no Conselho Regional de Economia (Corecon/SC), numa mesa-redonda coordenada pelo vice-presidente da entidade, Pedro Vitali, e mediada pelo editor de Economia do Diário Catarinense, Euclides Lisbôa.
Participaram do debate o presidente da Santur, Valdir Walendowsky; o consultor de Relações com o Mercado da Secretaria do Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Joceli de Souza; o gerente de Projetos da Secretaria Municipal de Turismo de Florianópolis, Rubens José Martins de Abreu Filho; o presidente do Sindicato dos Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Florianópolis, Tarcísio Schmitt; e os economistas Hamilton Peluso, Paulo de Tarso Guilhon, Nelson Pamplona da Rosa e Nelson Castello Branco Nappi, conselheiros do Corecon/Santa Catarina, e Humberto Dalsasso, vice-presidente da Ordem dos Economistas do Estado de Santa Catarina.
Diário Catarinense – Estamos passando por uma crise mundial e Santa Catarina teve uma catástrofe da natureza que abalou o turismo. Neste cenário, como resultou a temporada?
Hamilton Peluso – A temporada teve queda de 10%. O que nos ajudou foi a presença dos argentinos. Eles não sentiram tanto a crise mundial no período da nossa temporada. A Argentina começou a sentir agora. Então, considerando as enchentes e a crise, que foram duas variáveis fortíssimas, a temporada foi boa, apesar da redução. Houve queda no movimento do aeroporto. A hotelaria deve ter sentido a retração, porque o turista de hotel vem de avião.
Tarcísio Schmitt – O setor mais prejudicado foi o dos bares e restaurantes. A queda não foi tão representativa nos hotéis porque tivemos um aumento considerável de argentinos. Isso salvou a temporada. E minimizou o que poderia ter sido muito pior para os restaurantes. Nós temos picos em SC, que são o Réveillon e o Carnaval, mas os turistas que tinham reserva desistiram devido à enchente. Também deve-se considerar a crise mundial. Especialmente o turista de alto poder aquisitivo que aplicava dinheiro na bolsa, que veio em número bastante inferior.
DC – Este problema dos restaurantes não estaria relacionado com os preços altos?
Peluso – Nos números de março, que foram desastrosos, um pouco da queda dos restaurantes também é reflexo da redução na movimentação do público local. Isso tem sido constatado. Reflexo da crise e dos preços.
Schmitt – Eu não concordo com isso. Realmente, os preços em janeiro e fevereiro são mais altos aqui. Somos um destino sazonal. Não se pode baixar preços quando a casa está cheia. O que aconteceu foi a enchente. Se falava dela como se fosse em todo o Estado. Refletiu lá fora. As estradas interrompidas intimidaram os turistas a fazerem reservas aqui.
Joceli de Souza – Já havia previsões bastante pessimistas…
Valdir Walendowsky – Não. Eram previsões otimistas, principalmente no mercado da América do Sul. Até mesmo no mercado interno. As notícias das chuvas não chegaram no ambiente internacional, lá fora o alarde foi pequeno. Mas, no Brasil, as notícias afetaram muito. O turismo de um modo geral mudou muito. Primeiro com relação ao tempo de permanência. Encurtou. Independente da crise. Com a crise, reduziu ainda mais.
Paulo de Tarso Guilhon – SC tem peculiaridades. Eu fiquei bem impressionado com o evento Fórum Mundial do WTTC e a habilidade do governo de trazer este fórum para cá. O que fazer para colocar SC nessa rota? Além do belo visual, o que SC tem para oferecer? Será que temos infraestrutura para receber este crescimento do turismo? Temos que ter rodovias, aeroportos, hidrovias para atrair este pessoal que, num primeiro momento, escolheria a Europa como destino turístico. Saneamento, questão urbana, será que estas questões estão bem resolvidas aqui? E ainda tem a questão da capacitação do pessoal. Mas não essa que se faz às vésperas da temporada. Tem que ser uma coisa permanente.
DC – Os problemas de saneamento, mão-de-obra e infraestrutura estão aí há muitos anos. O que especificamente precisa ser feito?
Walendowsky – Existem duas formas de fazer turismo. Uma é como faz Dubai, que tem dinheiro, investe e depois trata de atrair os turistas. A outra é ter apelo, que é o caso de SC, com suas belezas naturais e equipamentos de lazer. Aqui a gente traz turistas para fazer caixa e investir para trazer mais turistas. Como não temos o dinheiro de Dubai, não temos petróleo, temos que nos virar, trazer o pessoal e, à medida que evolui o processo, reinvestir no turismo.
Souza – O turista leva em conta três aspectos. Como chegar ao local. Aí passa por aeroporto, rodovias, transporte. Onde ficar, ou seja, todo o sistema de hospedagem. E onde ocupar o tempo livre, isto é, o que fazer. A partir daí tem toda uma cadeia, mas estes são os pontos principais.
Guilhon – Trazer o WTTC para cá foi uma ideia brilhante porque nós precisamos de recursos. Há 30 anos se escuta que faltam infraestrutura e capacitação. E o Estado vai tocando dentro das limitações orçamentárias que tem. A vinda do WTTC é um momento histórico. Aqui estarão as maiores autoridades mundiais do turismo. Estaremos na vitrine do mundo. Essa vitrine vai atrair recursos para resolver os problemas de infraestrutura.
Walendowsky – O presidente Lula confirmou presença no evento. Toda a cúpula do turismo nacional também virá. O assunto é de real importância. E talvez desperte o governo federal para a necessidade de investir em infraestrutura. Nosso principal problema é como chegar aqui. Tanto de fora, quanto deslocamento interno. Precisamos de grandes aeroportos e boas rodovias, investimentos federais.
Souza – Precisamos de uma mudança de comportamento dos governantes. Os governos municipais precisam embelezar as cidades. Fazer obras necessárias para o bom atendimento do turista para, a partir daí, gerar recursos para realizar as ações que os residentes necessitam. Muitas vezes eles invertem as prioridades. O WTTC vai despertar as autoridades. Vai trazer a mídia espontânea, só isso já dá reflexo no investimento privado. Atrai investidores. Vai mostrar que estamos capacitados para receber investimentos e melhorar nossos equipamentos.
Rubens José Martins de Abreu Filho – Em relação à temporada passada, não perdemos muito. Houve queda, mas não foi grande. Nossas praias ficaram cheias. Sobre o evento WTTC, são mais de 200 jornalistas internacionais que vão mostrar nossa cidade.
Schmitt – Eu não concordo que nossas praias ficaram cheias. Não podemos esquecer, sobre a taxa de permanência, que já foi de 14 dias na década de 1980. Hoje está em torno de quatro dias. Há outro dado. Passamos de 12 mil leitos no final dos anos 1980 para 41 mil leitos na Grande Florianópolis, 31 mil apenas na Capital. Portanto, quando se fala que a ocupação caiu, não é porque tem menos gente, mas porque temos muito mais leitos. Eu só não concordo que este ano tenha sido melhor do que o ano passado. A queda na hotelaria foi de 13% em janeiro e fevereiro em relação ao ano passado.
Humberto Dalsasso – O tipo de turista também mudou. Não são mais famílias. São jovens que dão preferências para lanches, param em pousadas e ficam menos tempo em cada lugar.
Walendoswky – Dentro da política do turismo, estamos implantando o processo de regionalização, trabalhar roteiros e oferecer diversidade de produtos. Isso é segmentação de produto para ocupar o tempo livre do turista e ele gastar mais. Não pode ser só praia.
Guilhon – O turismo é uma atividade multifacetada. Existem várias estruturas do governo que vão trabalhar mais com o WTTC. A SC Parcerias é uma delas, porque são investidores privados que estarão aqui. E este evento vai tentar atrair os capitais de investimento para melhorar a infraestrutura, então as parcerias público-privadas serão necessárias.
Abreu – O presidente Lula está fazendo chamadas no exterior para o WTTC.
Guilhon – Antes, projetos de investimento e construção de hotéis iam para o Nordeste. Mas hoje, tem uma pessoa na Embratur que é catarinense, a Janine Pires. Então temos duas situações favoráveis. A Janine e o fato do WTTC vir para cá. Estes empresários vão olhar para cá e vão ver que há muito potencial. Eles preveem que o Brasil vai passar da 141ª colocação para a 90ª no turismo mundial em 10 anos. São 50 posições.
Dalsasso – SC tem potencial. Todo mundo que vem para cá se encanta. Há que se pensar uma estratégia de como mostrar isso para quem ainda não veio. A gente se preocupa com a infraestrutura pesada, mas não vê coisas pequenas. O cheiro ruim na porta de entrada da Ilha, na Beiramar, isso marca o turista. Também precisamos desenvolver a integração entre os setores com campanhas. Integração do turismo receptivo, táxis, hotéis, para fazer o turista se sentir bem e voltar.
Peluso – O poder público faz a venda institucional de SC. Mas na questão vendas, a iniciativa privada tem que crescer muito ainda. A parte comercial é fraca. O receptivo tem que evoluir para acompanhar a evolução do turismo. O esquema de pacotes, a capacitação do pessoal.
Souza – O governo está criando condições. Está indo nos emissores de turistas, fazendo a promoção de Santa Catarina. Mas a iniciativa privada precisa chegar junto.
Guilhon – O governo induz mas o empresariado não acompanha. Não temos nada a apresentar além de praias. Não temos o tango de Buenos Aires. Não temos mulatas. Precisamos de parcerias para fazer promoções, shows para atrair turistas.
Souza – Desde 2003, o governo passou a fazer política de fomento turístico. A Copa do Mundo é o maior evento turístico do mundo. SC foi quatro vezes o melhor destino do país. Como, então, SC não estar entre as cidades que sediarão os jogos da Copa do Mundo 2014? Se hoje estamos nos candidatando é porque temos excelente estrutura hoteleira, são mais de 73 mil leitos num raio de 70 quilômetros a partir de Florianópolis. E os problemas que temos são menores que os de outras cidades-candidatas, inclusive, com necessidade de investimentos menores.
DC – O que fazer para preparar SC de forma que o turismo possa compensar a queda da atividade econômica no mundo? Qual a estratégia para não perder muito?
Abreu – Temos que ser ousados e aprender com os desacertos da temporada passada. Falo em investimentos. O WTTC será parte disso. Serão quatro, cinco dias em que nossa cidade vai ser palco de um evento mundial. Temos que pensar que turismo é globalização. Será um passo de 20 anos em poucos dias.
Walendowsky – Turismo é uma realidade para nós. É o melhor potencial do Brasil pela sua diversidade da questão natural e étnica. Não podemos perder esta oportunidade. O governo está atraindo investimentos para que a gente possa evoluir. Outros eventos serão importantes. Coloco também como essencial o desenvolvimento desta política de turismo implantada desde a criação da Secretaria de Turismo, Cultura e Esportes. Mas não adianta só o governo estadual querer. O turismo se faz no município. Os municípios tem que fazer sua parte. O turismo precisa ser um nivelador para contrabalançar quando outras atividades econômicas não estiverem bem. Temos que ser o melhor do país. Estamos trabalhando deste conceito. SC será o melhor destino turístico.
Guilhon – O foco é o turismo em SC. Mas outros setores também são importantes. Hoje, em Florianópolis, o setor de Tecnologia de Informação (TI) ultrapassou, em termos de arrecadação, o turismo. Cada município tem sua vocação. A Capital era só turismo, mas agora tem este outro importante vetor para economia, que é o setor de TI. Aí vejo o papel importante da SC Parcerias, em promover ações integradas dos governos com a iniciativa privada para fazer o turismo crescer.
Souza – O governo federal está fazendo sua parte. O governo estadual também, através da Santur do Plano Integrado do Lazer, com o Funturismo. Mas os municípios têm que fazer a parte deles. O turismo não está na ordem do dia de muitos municípios. Na iniciativa privada, muitos empresários fazem sua parte, mas a maioria fica esperando as ações.
Peluso – Investidores existem, mas há projetos que não fazem girar a economia. O turismo precisa fazer girar a economia. Temos o problema de insegurança jurídica. Depois do WTTC, as aprovações para implementar os empreendimento vão demorar. Até conseguir as licenças ambientais, os investidores desistem. Isso é o principal entrave que a gente precisa superar para ter aqui uma marina, um teleférico.
Schmitt – A Santur faz bem a divulgação lá fora, mas de ordem prática pouca coisa tem acontecido, especialmente aqui em Florianópolis, que é a porta de entrada do Estado. Realmente, SC tem muito potencial. Ainda há resistência na cidade para aceitar o turista. Agora, antes de fazer rodovias com quatro pistas, como na Europa, que maravilha seria apenas ter a SC-401 terminada. São coisas de pequena monta que não são feitas. Falta vontade política. Os acessos são todos deficientes. Não há sinalização turística, sem falar em saneamento e o famoso projeto do aeroporto que não sai do papel. As coisas aqui não acontecem. O município faz só tapete preto, isso é manutenção. Manutenção é uma coisa, construção é outra. Desde quando não se constrói um metro novo de estrada? Só o que tem é maquiagem. Temos que pressionar para que estas coisas aconteçam.
Dalsasso – A duplicação da BR-101 é o que reduz o turismo aqui. Um pouco desta redução é reflexo das obras. Em Palhoça, trava tudo. A maioria dos trechos daria para ampliar a terceira pista, deixando os pontos críticos, que estão atravancando a liberação, para mais tarde. Isso já aliviaria e muito o trânsito. As pessoas deixam de vir para Florianópolis por causa das obras na BR-101. Talvez um esforço do governo estadual junto ao federal para definir prioridades ajudaria e muito o turismo da Capital.
(Simone Kafruni, DC, 19/04/2009)
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