“Pouco se dá se o Ministério Público Federal “recomendou” ao Ibama que procedesse embargo e interdição das obras “sob as penas da lei”, disse o ministro Cezar Peluso.
Em decisão liminar de 23 de janeiro o vice-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), no exercício da presidência, atendeu o pedido do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) para ser desobrigado de realizar licenciamento ambiental e fiscalização de obras de empreendimentos na cidade de Salvador (BA).
Peluso deferiu o pedido contra uma decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), em ação civil pública do Ministério Público Federal, demandado por um litisconsórcio entre a ONG Gambá (Grupo Ambientalista da Bahia), a Federação dos Bairros de Salvador (a Ufeco de lá), a União por Moradia Popular (que aqui em Florianópolis é representada por Modesto Azevedo, ex-presidente da Ufeco), o Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (Crea-BA) e o Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB). Eles pretenderam praticamente cassar a competência dos órgãos estaduais e municipais, alegando a existência de estipulações no Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano de Salvador aprovado em fevereiro de 2008 que, segundo eles, “abre a possibilidade de ocorrência de degradação ambiental”, que o Ibama deveria ser encarregado de fiscalizar e impedir. Para os autores da ação, “o Plano Diretor conteria ilegalidades e inconstitucionalidades” que favoreceriam “a exploração imobiliária em locais impróprios”. A ACP chegou a ser extinta pela juíza de primeira instância, porque a demanda havia sido proposta de forma inadequada pelo MPF, que recorreu da decisão. Na análise do recurso, o Tribunal Regional concordou em declarar “provisoriamente” a competência do Ibama para o licenciamento ambiental e a fiscalização das obras urbanas em Salvador.
Dever jurídico inexistente
Inconformado com a decisão do TRF de atribuir-lhe a função – ainda que provisória – de licenciador e fiscalizador de obras em Salvador, o Instituto do Meio Ambiente recorreu ao STF com pedido de suspensão da decisão. O órgão denunciou ao Supremo a “grave lesão à ordem pública, em sua acepção de ordem jurídico-administrativa” por impor-lhe “dever de licenciar obras e projetos cujos danos ambientais são meramente locais”, afastando-o “de sua competência para invadir campo de atuação reservado aos agentes estaduais e municipais do meio ambiente”. O Ibama alegou a existência do grande número de empreendimentos que, embora possuindo impactos restritos meramente à Capital, multiplicou “de forma absurda e inesperada” a competência da autarquia, “desprestigiando o critério da preponderância do interesse” e ameaçando inviabilizar sua atuação. O ministro Cezar Peluso deferiu o pedido do Ibama justificando que o órgão comprovou com a documentação apresentada que a decisão do TRF “impõe-lhe dever jurídico, em tese, inexistente, com grave dano ao planejamento e execução de suas ações institucionais”.
Enfático na decisão em que restaura a competência dos órgãos estaduais e municipais, Peluso declarou que pouco se dá que o Ministério Público Federal tenha “recomendado” ao IBAMA que procedesse embargo e interdição das obras, “sob as penas da lei”. Ele condenou a iniciativa do MPF declarando que ela “não atenua nem remedeia o aparente excesso jurisdicional”.
A decisão liminar será julgada pelos 11 ministros do STF em data ainda não definida.
“Mico” do MPF, “barriga” na imprensa
Em meio a polêmica que estabeleceu-se, o TRF e o MPF protagonizaram uma fenomenal “barriga” na imprensa baiana, quando seus sites estamparam por vários dias a nota “Justiça embarga Estádio de Pituaçu”, com a falsa informação de que as obras de reforma e ampliação do Estádio Roberto Santos – o Pituaçu -, e dos outros 34 empreendimentos privados (R$ 2 bilhões em negócios e 15 mil empregos), haviam sido embargadas pelo Ibama por recomendação de um procurador Federal e uma promotora de Justiça. Segundo a nota, o Pituaçu estaria interditado para os jogos já agendados.
Enquanto a notícia era “repercutida” pela mídia, uma verdadeira guerra se travava nos bastidores, com o Ibama recusando-se a executar os embargos e interdições já noticiados pelo TRF e MPF. Para amenizar o “mico” e pressionar o órgão foi pedida a prisão do superintendente Célio Costa Pinto, por “crime de desobediência”, o que resultou em apenas outra ação destrambelhada: o Ibama estava dentro do prazo legal para manifestar-se no processo e até já havia recorrido ao STF. Com a decisão do Supremo, só restou à assessoria de comunicação do TRF emitir nota que a imprensa reproduziu, admitindo o erro e atribuindo-o a “falhas na interpretação do conteúdo da decisão” e a problemas no sistema de informática do Tribunal. A notícia foi refeita no site, sem qualquer alusão à embargo ou interdição. No site do MPF, no entanto, a nota ainda demorou a ser corrigida.
Vicente Mattos, presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil da Bahia (Sinduscon), disse que a perda incalculável da confiança da opinião pública no segmento da construção civil é um agravante neste momento de crise. O presidente da Associação de Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário (Ademi), Walter Barretto, lamentou a participação do Crea e do IAB na confusão. Ele censurou as entidades, que “deveriam estar imbuídos na geração de empregos para engenheiros e arquitetos”, ao invés de aliar-se a um movimento que traz prejuizos para a Bahia. Ele ressaltou que até “uma obra importante da Federação das Indústrias da Bahia (Fieb), que tem como meta a oferta de qualificação profissional, estava na lista das embargadas”.
(Jornal Ilha Capital, 09/03/2009)
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