Duas reportagens divulgadas pela RBS TV relataram, com impacto na opinião pública, uma prática antiga para desenvolver o setor de serviços de Florianópolis durante o verão: o turismo estudantil, intermediado por parlamentares, com o uso oficial de escolas públicas.
A primeira denúncia surgiu no fim de semana, com dados sobre uma situação abusiva, envolvendo até prática de corrupção pública. O uso de escola municipal como hospedagem para visitantes de baixa renda e até para turistas estrangeiros. Abuso, porque a escola deveria estar sendo recuperada, limpa, ajardinada, preparada para o início do ano letivo. E os diretores, professores e servidores que não estivessem em férias, dedicados à organização do calendário ou preparando atividades culturais e extraclasse para aprimoramento de seus alunos. Imoral e ilegal, porque os responsáveis pela cessão indevida de um bem público estavam cobrando – e muito bem – de seus amigos-hóspedes. A receita foi depositada nos cofres da prefeitura?
Agora, a denúncia de outra prática comum, executada há muitos anos: a transformação das escolas públicas estaduais em pousadas estudantis para alunos, seus familiares e até seus amigos. A maioria dos hóspedes vem de municípios do Oeste, e, coincidentemente, da base de apoio do deputado Herneus de Nadal, do PMDB e líder do governo na Assembleia Legislativa.
Principal responsável por este singular intercâmbio, o deputado assumiu total responsabilidade. Durante visita, ontem, à sede da Secretaria Regional de São Miguel do Oeste, explicou que o uso das escolas públicas acontece há pelo menos 15 anos, e com mais intensidade durante a temporada de verão. Não vê ilícito no procedimento, dizendo que são estudantes de famílias pobres que não conhecem a Capital. E garante que todos eles cumprem roteiro cultural.
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Escola-hotel
A existência de hotel-escola revelou-se experiência vitoriosa do Senac em cidades turísticas, como Vitória, Salvador, Recife e, ultimamente, até Lages, em Santa Catarina. Os alunos dos cursos de Hotelaria cumprem estágios e viram competentes profissionais. Escola pública virando hotel de verão é criação catarinense. De acordo com Nadal, o sistema funciona de forma oficial. Os diretores enviam pedidos de reserva a seu gabinete, cuja assessoria define tudo com os diretores. Este ano, nove escolas recebem turistas na Ilha.
O secretário da Educação, Paulo Bauer, reassumiu o cargo surpreendido pelas denúncias. Logo emitiu nota sobre o improvisado alojamento. Aliado do líder governista, procurou justificar o uso das escolas, alegando tratar-se de “intercâmbio cultural”. Mas admitiu, depois, que ignorava a existência das autorizações. Anunciou, então, que na reunião com diretores, na próxima segunda-feira, vai querer saber tudo. Exigirá a definição de critérios de utilização.
A questão que se coloca é muito simples. A chamada Escola Aberta pode, perfeitamente, acolher as comunidades nos fins de semana ou nas férias. Mas não apenas da base eleitoral dos governistas. Com critérios definidos previamente, divulgados em todas as escolas estaduais. Sobretudo, que o projeto represente um prêmio aos melhores alunos das unidades escolares espalhadas pelo Estado.
Na sistemática atual, além de beneficiar os privilegiados, escolhidos pelos padrinhos partidários, acaba virando mais um instrumento de poder para capitalização político-eleitoral.
(DC, 13/01/2009)