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Cidades mais humanas

Os prefeitos que assumiram a gestão das cidades brasileiras este mês têm um desafio não mais restrito às metrópoles. É a humanização dos espaços urbanos, que também desafia o planejamento de médias e pequenas comunidades, que por sinal constituem a maioria das cidades catarinenses. Entre tantas questões amplas, como as ambientais, o trânsito apresenta-se como um dos pontos cruciais para que as relações em áreas de uso comum não se tornem insuportáveis. Quase inviabilizado em megacidades em consequência de deficiências em obras viárias, da supremacia do automóvel, da precariedade do transporte coletivo e de outros fatores, o tráfego é bem mais do que a movimentação de veículos. É a expressão de como uma cidade se comporta e constrói suas formas de convivência.

O desafio de enfrentar a humanização do trânsito é tarefa do setor público, ao qual cabe, ouvindo as comunidades, definir projetos que, na maioria dos casos, irão corrigir equívocos por décadas considerados verdades inquestionáveis. O maior desses é certamente o que relegou pedestres e ciclistas quase à condição de estorvo. Bons exemplos de iniciativas que corrigem esses erros não vêm apenas da Europa e da Ásia, onde a cultura da urbanização passa necessariamente pelo reconhecimento de que parte da população tem o direito de dispor de meios não-motorizados para se locomover.

Bogotá, a capital colombiana, quase sempre lembrada, erroneamente, pelo que teve por longo tempo como estigma – a ação de traficantes de drogas –, está bem próxima de nós para oferecer a inspiração de projetos exitosos de valorização das ciclovias. Lá, essas áreas são utilizadas não só por esportistas ou para passeios recreativos de fins de semana, mas como forma de viabilizar o transporte cotidiano de trabalhadores. Bogotá tem mais de 400 quilômetros de ciclovias. Não são trechos abertos para a circulação de bicicletas que levam do nada a lugar algum, como tantos implantados em cidades brasileiras. São áreas destinadas exclusivamente a ciclistas e interligadas racionalmente com o sistema de transporte coletivo da cidade. As ciclovias não são, tampouco, uma descoberta recente dos moradores da capital colombiana, pois começaram a ser projetadas nos anos 80.

O Brasil é um retardatário nesse tipo de solução – incluindo-se aqui alternativas como metrô e transporte por água – porque manteve uma percepção errada dos meios de transporte considerados não-convencionais. Andar de bicicleta, nos ensinam outros povos há muito tempo, não é uma alternativa romântica e tampouco desafiadora dos avanços tecnológicos. É uma forma de ir e vir, como demonstram os europeus, vista sob os mais variados aspectos, do econômico ao ecológico, e que expressa principalmente um modo de vida compatível, sim, com a complexidade dos grandes conglomerados urbanos.

Administrações que desprezam projetos, muitos dos quais singelos e de baixo custo, de valorização dos direitos de pedestres e ciclistas brutalizam suas relações. Investir em soluções que tornem esse meio de transporte possível, eliminando os riscos representados hoje para quem se atreve a circular no caos das ruas brasileiras, deve ser decisão de política de governos com coragem para fixar os marcos fundadores do futuro de suas cidades.

(DC, 19/01/2009)

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