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Oceano de plástico

Os oceanos ocupam 70% da superfície da Terra, mas até hoje se sabe muito pouco sobre a vida em suas regiões mais recônditas. Segundo estimativas de oceanógrafos, há ainda 2 milhões de espécies desconhecidas nas profundezas dos mares. Por ironia, as notícias mais freqüentes produzidas pelas pesquisas científicas relatam não a descoberta de novos seres ou fronteiras marinhas, mas a alarmante escalada das agressões impingidas aos oceanos pela ação humana.
Um estudo atualmente em curso pela entidade ambientalista Greenpeace, cujas conclusões serão apresentadas em maio num congresso na Inglaterra, mostra que a concentração de material plástico nas águas atingiu níveis inéditos na história.
Nos últimos meses, embarcações do Greenpeace esquadrinharam dezenas de regiões dos oceanos pesquisando amostras da vida marinha. Os cientistas descobriram que a poluição por plásticos, antes restrita a alguns pontos conhecidos, hoje é onipresente nas águas dos mares do mundo inteiro.
“É absolutamente chocante quando se navega no meio do nada, a milhares de quilômetros da costa, e se descobre a alta concentração de plástico na água”, diz o inglês Adam Walters, um dos pesquisadores que viajam a bordo dos barcos do Greenpeace. Segundo o Programa Ambiental das Nações Unidas, existem 46.000 fragmentos de plástico em cada 2,5 quilômetros quadrados da superfície dos oceanos. Isso significa que a substância já responde por 70% da poluição marinha por resíduos sólidos.
A primeira vítima dos plásticos que se depositam nos oceanos é a vida animal. Calcula-se que 267 espécies, principalmente pássaros e mamíferos marinhos, engulam resíduos plásticos ou os levem para seus filhotes julgando tratar-se de alimento. Há seis anos, uma baleia minke foi encontrada morta na Normandia, no norte da França, com 800 quilos de sacolas plásticas no estômago.
Em regiões como a Califórnia, é comum achar tartarugas, leões-marinhos e focas mortos por asfixia ou lesões internas provocadas pela ingestão de plástico. O Atol de Midway, próximo ao Havaí, é o símbolo máximo da tragédia que o plástico impinge aos mares. Por capricho das correntes marinhas, o atol recebe diariamente o entulho plástico proveniente do Japão e da costa oeste dos Estados Unidos.
O lixo de Midway provoca a morte de metade dos 500.000 albatrozes que nascem anualmente no atol, os quais confundem plástico com comida. O plástico do tipo PVC, empregado em canos, brinquedos e numa infinidade de utilidades domésticas, pode conter compostos de estanho altamente tóxicos para moluscos e peixes.
Essas substâncias, que chegam ao mar principalmente pela ação das chuvas que varrem os aterros sanitários, causam alterações hormonais que modificam o sistema reprodutivo e diminuem a taxa de fertilidade desses animais.
Os mesmos compostos de estanho estão presentes em alguns tipos de tinta utilizados para proteger o casco de barcos e navios. “Essas tintas já foram banidas em alguns países, mas continuam a ser usadas em muitos outros”, informa o biólogo Alexander Turra, da Universidade de São Paulo.
O plástico encontrado nos oceanos não é apenas aquele que se vê enfeando as praias, como sacolas e garrafas. Uma das principais ameaças vem de peças quase invisíveis, os chamados pellets, bolinhas com meio centímetro de diâmetro utilizadas como matéria-prima pelas indústrias.
O mundo produz atualmente 230 milhões de toneladas de produtos plásticos por ano – contra 5 milhões na década de 50. Os pellets chegam aos oceanos como lixo industrial e por meio do descarte de navios que os usam para limpar seus tanques e porões. Essas bolinhas têm enorme capacidade de absorção de poluentes.
Apenas uma delas apresenta concentração de poluentes até 1 milhão de vezes maior que a da água onde se encontra, envenenando os cardumes que a ingerem. Um estudo feito neste ano por pesquisadores da Universidade de São Paulo mostrou que em Santos, no litoral paulista, cada meio metro cúbico de areia da praia contém até 20.000 pellets.
Um trabalho recente desenvolvido por um time de dezenove pesquisadores dos Estados Unidos, da Inglaterra e do Canadá mapeou, pela primeira vez, o impacto da ação humana sobre os mares. De acordo com o estudo, apenas 4% das áreas oceânicas do mundo, localizadas nos pólos, estão imunes a ela.
E nada menos de 40% das regiões registram interferências humanas de alta ou média intensidade. “O interesse pelo tema aumentou consideravelmente na última década, depois que os cientistas perceberam que a ação humana altera profundamente os oceanos”, disse a VEJA o ecologista Benjamin Halpern, da Universidade da Califórnia, coordenador do estudo.
Para chegarem a essa conclusão, os pesquisadores coletaram registros sobre uma série de variáveis, como poluição, atividade pesqueira e ocupação de zonas costeiras, em diversos pontos dos mares e oceanos e avaliaram sua intensidade.
Outro estudo, divulgado na semana passada pelo Programa de Meio Ambiente das Nações Unidas, indica que três quartos das regiões pesqueiras do mundo estão ameaçados pelo impacto da ação humana. Como as grandes regiões pesqueiras se encontram próximas à costa, sofrem os efeitos do crescimento desenfreado da ocupação dos litorais.
Calcula-se que 2.000 famílias se instalem diariamente em áreas litorâneas. Como se isso não bastasse, segundo o estudo da ONU, a pesca predatória ameaça 80% das principais espécies de peixes comercializadas. A indústria da pesca captura 2,5 vezes mais peixes do que poderia caso respeitasse a capacidade dos cardumes de se renovar.
Os estudos mais recentes sobre a saúde dos oceanos apontam que, além da praga dos plásticos, há cinco principais sintomas da deterioração causada pela interferência humana.
• Acidificação das águas – A produção desenfreada de dióxido de carbono (CO2), o gás do efeito estufa produzido pela queima de combustíveis fósseis, faz com que os oceanos hoje absorvam uma quantidade dez vezes maior da substância do que há 100 anos. O CO2 eleva a acidez das águas, o que ameaça a sobrevivência de diversas espécies de peixes e mamíferos.
• Surgimento de zonas mortas – O esgoto doméstico, os dejetos de gado e o lixo industrial despejados nos oceanos promovem a proliferação de algas. Em excesso, elas ameaçam todas as outras formas de vida porque, quando morrem, são degradadas por bactérias num processo que consome grande parte do oxigênio da água. O resultado é o surgimento das zonas mortas, inóspitas à maioria das espécies. Há cinqüenta anos, havia três zonas mortas no mundo. Hoje, são 150.
• Desaparecimento de mamíferos – A presença de mamíferos marinhos é um indicador bastante preciso da qualidade dos oceanos. Alterações no ciclo de vida desses animais alertam para desequilíbrios em seu ambiente. Na última década, milhares de golfinhos e leões-marinhos morreram por envenenamento ao comer peixes menores, que se alimentam de algas tóxicas, contaminadas por resíduos químicos.
• Marés vermelhas freqüentes – Chama-se de maré vermelha a concentração de algas tóxicas em águas litorâneas. Há uma década, no Golfo do México, ela ocorria uma vez a cada dez anos. Atualmente, acontece todos os anos. Causa a morte de cardumes e pode provocar nas pessoas reações alérgicas e dificuldade para respirar. O fenômeno se deve à destruição dos manguezais e pântanos e à poluição decorrente da ocupação humana nas regiões costeiras.
• Destruição do assoalho marinho – A poluição decorrente de vazamentos em petroleiros destrói o habitat das espécies que vivem próximo à superfície oceânica. Mas o assoalho marinho também sofre com a contaminação ao redor das plataformas de perfuração e extração de petróleo. O nível de hidrocarbonetos no solo marinho se mantém excepcionalmente alto numa área de 8 quilômetros em volta das plataformas de extração. Em algumas regiões do Mar do Norte, a área poluída cobre mais de 100 quilômetros quadrados do assoalho marinho.
Os oceanos ocupam 70% da superfície da Terra, mas até hoje se sabe muito pouco sobre a vida em suas regiões mais recônditas. Segundo estimativas de oceanógrafos, há ainda 2 milhões de espécies desconhecidas nas profundezas dos mares. Por ironia, as notícias mais freqüentes produzidas pelas pesquisas científicas relatam não a descoberta de novos seres ou fronteiras marinhas, mas a alarmante escalada das agressões impingidas aos oceanos pela ação humana.
Um estudo atualmente em curso pela entidade ambientalista Greenpeace, cujas conclusões serão apresentadas em maio num congresso na Inglaterra, mostra que a concentração de material plástico nas águas atingiu níveis inéditos na história.
Nos últimos meses, embarcações do Greenpeace esquadrinharam dezenas de regiões dos oceanos pesquisando amostras da vida marinha. Os cientistas descobriram que a poluição por plásticos, antes restrita a alguns pontos conhecidos, hoje é onipresente nas águas dos mares do mundo inteiro.
“É absolutamente chocante quando se navega no meio do nada, a milhares de quilômetros da costa, e se descobre a alta concentração de plástico na água”, diz o inglês Adam Walters, um dos pesquisadores que viajam a bordo dos barcos do Greenpeace. Segundo o Programa Ambiental das Nações Unidas, existem 46.000 fragmentos de plástico em cada 2,5 quilômetros quadrados da superfície dos oceanos. Isso significa que a substância já responde por 70% da poluição marinha por resíduos sólidos.
A primeira vítima dos plásticos que se depositam nos oceanos é a vida animal. Calcula-se que 267 espécies, principalmente pássaros e mamíferos marinhos, engulam resíduos plásticos ou os levem para seus filhotes julgando tratar-se de alimento. Há seis anos, uma baleia minke foi encontrada morta na Normandia, no norte da França, com 800 quilos de sacolas plásticas no estômago.
Em regiões como a Califórnia, é comum achar tartarugas, leões-marinhos e focas mortos por asfixia ou lesões internas provocadas pela ingestão de plástico. O Atol de Midway, próximo ao Havaí, é o símbolo máximo da tragédia que o plástico impinge aos mares. Por capricho das correntes marinhas, o atol recebe diariamente o entulho plástico proveniente do Japão e da costa oeste dos Estados Unidos.
O lixo de Midway provoca a morte de metade dos 500.000 albatrozes que nascem anualmente no atol, os quais confundem plástico com comida. O plástico do tipo PVC, empregado em canos, brinquedos e numa infinidade de utilidades domésticas, pode conter compostos de estanho altamente tóxicos para moluscos e peixes.
Essas substâncias, que chegam ao mar principalmente pela ação das chuvas que varrem os aterros sanitários, causam alterações hormonais que modificam o sistema reprodutivo e diminuem a taxa de fertilidade desses animais.
Os mesmos compostos de estanho estão presentes em alguns tipos de tinta utilizados para proteger o casco de barcos e navios. “Essas tintas já foram banidas em alguns países, mas continuam a ser usadas em muitos outros”, informa o biólogo Alexander Turra, da Universidade de São Paulo.
O plástico encontrado nos oceanos não é apenas aquele que se vê enfeando as praias, como sacolas e garrafas. Uma das principais ameaças vem de peças quase invisíveis, os chamados pellets, bolinhas com meio centímetro de diâmetro utilizadas como matéria-prima pelas indústrias.
O mundo produz atualmente 230 milhões de toneladas de produtos plásticos por ano – contra 5 milhões na década de 50. Os pellets chegam aos oceanos como lixo industrial e por meio do descarte de navios que os usam para limpar seus tanques e porões. Essas bolinhas têm enorme capacidade de absorção de poluentes.
Apenas uma delas apresenta concentração de poluentes até 1 milhão de vezes maior que a da água onde se encontra, envenenando os cardumes que a ingerem. Um estudo feito neste ano por pesquisadores da Universidade de São Paulo mostrou que em Santos, no litoral paulista, cada meio metro cúbico de areia da praia contém até 20.000 pellets.
Um trabalho recente desenvolvido por um time de dezenove pesquisadores dos Estados Unidos, da Inglaterra e do Canadá mapeou, pela primeira vez, o impacto da ação humana sobre os mares.
(Paula Neiva e Roberta de Abreu Lima, Revista Veja, Planeta Sustentável, 05/03/2008)

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1 Comentário

  1. Lones disse:

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