Artigo de Richard Eilers Smith – Graduando em Engenharia Sanitária e Ambiental (Portal do Meio Ambiente, 04/03/08)
O ano de 2008 é crucial na história da humanidade. Estamos diante de impasses e paradoxos globais que precisam ser solucionados pelas pessoas, por meio de mudanças comportamentais que reflitam um compromisso com o futuro. A desigualdade social segue crescendo a custos irreparáveis tais como a degradação da biosfera, a escassez de água doce e a violência nos centros urbanos.
O desenvolvimento sustentável já é um conceito conhecido e disseminado internacionalmente, mas não está presente nos processos produtivos nem tão pouco nos valores da sociedade do consumo e da informação.
Mais de 50% da população total do mundo vive hoje em áreas urbanas. Este fenômeno que provavelmente continuará a crescer nos próximos anos pode resultar em uma sociedade ainda mais consumista, competitiva, individualista, corrupta e conseqüentemente insustentável. “Esqueça os países, o poder está com as cidades.
Uma nova Geografia impera no planeta. Agora são as principais metrópoles que se firmam como os grandes centros de decisão e articulação do sistema capitalista e estas estão se tornando cada vez mais cosmopolitas, poderosas e desiguais.” (PIMENTA, Revista Exame Dez/2007). Este comentário reforça a tendência global da emergência do poder das cidades, mas principalmente aponta um cenário de desigualdade.
As favelas, cortiços e as condições sub-humanas de algumas regiões do meio rural, como o Vale do Jequitinhonha no norte de Minas Gerais onde a fome ainda insiste em fazer vítimas, assustam, persistem sem soluções imediatas e tem tendências a piorar.
Na Bahia crianças pedem alimento nas rodovias federais com placas pintadas a mão e esta estendida em sinal de miséria. Em capitais como São Paulo, vemos na imprensa um noticiário que só presa pela audiência e mostra a violência e a pobreza como se fossem parte aceitável da vida cotidiana nas periferias.
No Rio de Janeiro a lei da violência impera nos morros e convive com uma elite que não sabe mais de que forma manter a situação em níveis aceitáveis de assaltos, roubos, seqüestros, tráficos de todas as espécies e alienação da população. A ocupação de áreas de preservação permanate (APP´s) devido à falta de perspectivas saudáveis e animadoras ameaça a biodiversidade e põe em risco o crescimento ordenado dos centros urbanos, incitando a exclusão e a violência.
O processo de globalização neoliberal apresenta de um lado a ameaça da homogeneização cultural e da concentração de renda crescentes, mas por outro lado aumenta a viabilidade da captação de recursos internacionais para projetos de desenvolvimento sustentável e de valorização da cultura e das possibilidades em potencial na noosfera de cada comunidade.
Na dimensão local os mecanismos de construção das políticas públicas e de destinação dos recursos públicos urgem uma participação social mais ampla, qualificada e organizada. Assim as decisões importantes podem ser tomadas com o conhecimento e influência dos cidadãos envolvidos e diretamente impactados.
Em meio a tantas incertezas a humanidade começa a se dar conta de que com seus atuais padrões civilizatórios não está habitando o planeta de maneira sábia, equilibrada e harmônica. Entretanto, cabe a esta mesma espécie que degrada e explora propor as mudanças dos paradigmas sociais e científicos de forma que estes contemplem a formação de um mundo mais justo, pacífico, feliz e que incorpore os princípios básicos da sustentabilidade em suas ações cotidianas. Neste sentido, uma visão participativa, inclusiva e sistêmica da vida tem muito a contribuir na quebra dos paradigmas.
“Não faz muito tempo, era reconhecida como grande atributo do homem a sua capacidade de reconstruir a trajetória da espécie. Ou seja, ao contrário dos outros animais sua potencialidade de fazer história. Recentemente, porém, foi descoberta sua responsabilidade cultural e sua possibilidade exclusiva de visualizar conjunturas e cenários do futuro em diferentes níveis de tempo. O simples ato de pensar as conseqüências de ato de iniciativas do presente em relação ao futuro ocasionou o advento de um novo tipo de investigação, altamente interdisciplinar e holístico, destinado a prever impactos e propor mudanças”. (Ab´Saber, 1994).
As ações da sociedade civil organizada apresentam uma formalidade jurídica que oficializa a representação de um grupo de pessoas. As reivindicações que são feitas de forma mais qualificada são mais efetivas. Para isso, o empoderamento das comunidades através da articulação de diversas instituições pode colaborar com a resolução de necessidades e demandas prioritárias a nível municipal.
Uma grande questão limitante a ser colocada é a impunidade de grandes autoridades que desviam dinheiro público das cidades, destinado ao bem estar da população local, para satisfazer interesses individuais.
Esse círculo vicioso de roubalheira e impunidade corrói os brasileiros, mas começa a dar sinais de mudança a exemplo dos tantos casos de “caixa dois” que vem sendo investigados pela Polícia Federal e pelo Ministério Público. Em Santa Catarina o Sr. Governador Luis Henrique Silveira que está a um passo de ser caçado de seu mandato e ver seu poder descendo por ralo abaixo junto com a sujeira de sua campanha e sua administração.
É importante colocar que quanto maior a participação qualificada e a divulgação das decisões que são tomadas, mais a corrupção recua. Isto devido ao fato de que é mais difícil roubar ou corromper trinta pessoas do que duas ou três. Logo, percebe-se que a participação social capacitada é um eixo formador de idéias e de cobranças às autoridades a respeito da transformação da realidade local.
Mas de que forma se dará este empoderamento citado? Afinal, empoderar para o que e como? Estas respostas não podem ser escritas em duas páginas, mas sem dúvida esta reflexão passa pela essência de um consenso: Trabalhamos por um mundo mais pacífico, justo, sustentável e conseqüentemente mais feliz.
A paz caminha junto com a espiritualidade e depende do respeito às diferentes identidades culturais. A justiça no exercício do poder e das tomadas de decisão conclama a participação da sociedade civil organizada e qualificada. Já a sustentabilidade, tem suas concepções e interpretações bastante desenvolvidas, porém a operacionalização deste conceito começa a despertar apenas neste início de século XXI.
Para trabalhar neste sentido do desenvolvimento de capacidades locais e pessoais que representem o melhor para todos, certos conceitos são fundamentais de serem construídos e compreendidos para não deturpar as parcerias, os projetos, as leis e as intervenções para um “des-envolvimento” (de si próprio e com a natureza) que mantenha a sociedade num padrão de repetição dos erros que estão nos levando aos impasses citados no início do texto.
Dentre estes podem ser citados a consciência biosférica que traz a consideração dos limites ecológicos, a valorização da identidade cultural, a espiritualidade, a cooperação, as tecnologias sociais, a sinergia das ações que multiplica os resultados, o afeto pelas pessoas, e o re-ligare consigo mesmo e com a natureza.
O interesse gerador do trabalho, dos projetos e das reuniões passa por uma reformulação na qual o dinheiro, serve apenas como meio para a satisfação, não é a satisfação em si próprio. Resumindo, os esforços por uma vida pessoal melhor devem estar alicerçados em mundo melhor para todos. Caso contrário, o empoderamento e os esforços em projetos de desenvolvimento sustentável, correm o risco de incentivar práticas que aumentem ainda mais o espírito de competição, a ganância e a degradação.
Nos processos de governança esta essência do interesse gerador das ações é imperativa para a construção de um mundo no qual a espécie humana garanta uma gestão local efetiva. Uma premissa para o despertar deste compromisso é o fato de trabalharmos simultaneamente para o mesmo fim. Sendo que, segundo John Forbes Nash (Vencedor do Prêmio Nobel de Economia de 1994), a soma do que é melhor para cada um não é igual a soma do que é melhor para todos, se pensarmos na dimensão global e local as ações devem direcionar-se para aquilo que é o melhor para todos.
Os desejos de consumo, as vaidades e a ambição terão que passar por este “filtro”. Podemos querer ou não nos envolver com a história e o futuro dos sistemas naturais e sociais da Terra. Mas, em ambos os sistemas a omissão será sempre uma posição que delegará aos outros decidirem da forma que lhes agrada mais gerir os recursos naturais, humanos e financeiros. A história vem indicando que para os ecossistemas isto significa degradação e para a sociedade mais desigualdade, miséria e indiferença ao próximo.
Os grandes encontros mundiais geralmente nos trazem uma visão complexa, plural e inovadora dos temas que apresentam. A “Conferência Mundial sobre o Desenvolvimento das Cidades” em Porto Alegre, trouxe uma mensagem urgente e bastante sensata. Os humanos que poluem e causam a desigualdade social prejudicam seus filhos, sua família, seus amigos e a si mesmos. Cabe a eles se sensibilizarem e se organizarem, criando espaços de convivência com a cultura e a operacionalização de um mundo sustentável, tolerante e encantador.
Deste ano atual em diante a humanidade começa a esboçar toda sua capacidade de se renovar, de quebrar os paradigmas essenciais e desenvolver um modo de vida coletivo e generoso que esteja impregnado nas relações, no trabalho, em todos os processos industriais e rurais produtivos, na política, na justiça, na diversão, no turismo, na ciência e na segurança.
Aqueles que, tanto por ignorância quanto por má vontade, insistirem em tomar decisões que são excelentes para alguns e prejudiciais para a maioria e conseqüentemente para a natureza, enfrentarão uma crise pessoal de insensatez e impopularidade que pode superar impasses.
Revelando-se que as pessoas estão no mundo para cultivar e consagrar o privilégio da vida e de suas possibilidades de viver momentos mágicos, transcendentes e conectados com a essência das energias que nos trazem a felicidade, as emoções e os sentimentos que fazem a mente e o coração terem a certeza de que existe algo maior do que nossa ciência racional, compartimentada e por isso limitada, é capaz de fornecer aos seres humanos que somos e que queremos ser.